Hoje, é com vénia, que me faço eco do texto ‘Comissão de Socorro aos Presos Políticos: da militância à crítica e à rutura dos católicos’, publicado por 7Margens, no passado dia 21 de abril. O seu autor, Edgar Silva, é doutorado em História e coordenador do Partido Comunista Português na Madeira
Comissão Nacional de Socorro aos Presos Políticos (CNSPP)
Criada em 1969, “era suprapartidária, constituída por muitos elementos independentes de partidos políticos e por outros ligados às diferentes formações partidárias que constituíam a oposição ao regime. É assim que, para além daqueles elementos independentes, entre os quais nove padres católicos e um pastor protestante, faziam parte da Comissão pessoas ligadas ao PCP, ao futuro Partido Socialista e às várias correntes marxistas-leninistas que então despertavam para a ação. E isto não foi tarefa fácil, dado o antagonismo com que se defrontavam no terreno político algumas dessas formações» (Nuno Teotónio Pereira, católico, destacado obreiro e fundador da Comissão).
Atividade da Comissão
Dava “notícias das prisões, das práticas de tortura, dos julgamentos efetuados, das penas aplicadas, das condições prisionais que vigoravam nas diferentes cadeias, das ações de solidariedade, das reclamações feitas junto das autoridades, assim como das suas próprias atividades. Nestas incluía-se o apoio financeiro às famílias de presos políticos, a designação de advogados de defesa e outras iniciativas, como foi a realização de colónias de férias para filhos de presos políticos em 1972 e 1973». (Frei Bento Domingues, um dos primeiros membros e fundadores da Comissão)
Dinâmica na luta contra o ‘Estado Novo’
“A Comissão desempenhou um papel de denúncia do regime e da sua repressão. (…)
E se não é possível estabelecer um nexo de causalidade entre os efeitos deste e de outros movimentos sociais em Portugal e o derrube do regime, pelo menos, será possível reconhecer que (…) correspondeu a uma decisiva frente de luta contra o Estado Novo.”
“O protagonismo católico”
“O protagonismo de sectores católicos nos diversos níveis de organização e ação da Comissão teve especial relevância, de sobremaneira, no que materializou de contributos fundamentais por parte do catolicismo social para a transformação da sociedade portuguesa. Aquela foi também uma das expressões das novas modalidades de politização de sectores do catolicismo durante o Estado Novo, no que correspondeu a uma corrente de ideias, iniciativas e projetos desenvolvidos por católicos que procuravam novas respostas para os graves problemas que o País enfrentava.”
Por um ‘Estado de Direito’
A luta da Comissão fez-se ouvir na, então, Assembleia Nacional pela voz da ‘Ala Liberal’ onde, entre outros católicos como o Dr. José da Silva, advogado de defesa do P. Mário Oliveira, pontificava o Dr. Francisco Sá Carneiro que, por convite de D. António Ferreira Gomes, fazia parte da direção da Obra Diocesana de Promoção Social.
Lembro um dia em que estava visivelmente desiludido e agastado. Contou (antes das reuniões semanais, sempre nos falava das suas atividades parlamentares) que, com uma delegação de deputados, tinha ido falar sobre os ‘presos políticos’ com o Ministro do Interior, Dr. Gonçalves Rapazote, formado em Direito na Universidade de Coimbra. E para criar ambiente, começou por lhe dizer:
– “O Senhor Ministro como homem do Direito…”
Que logo o interrompeu:
– “O senhor deputado está a falar com o ministro; o homem do direito ficou à porta.
Foi o golpe final em quem acreditara na possibilidade de levar o Regime a respeitar os direitos políticos de informação e expressão: de reunião e associação.
Esta desilusão levou-o a renunciar ao mandato de deputado (25/2/1973). E a causa próxima dessa renúncia foi a Assembleia recusar-se a debater o projeto de lei, o último por ele apresentado, sobre a amnistia dos presos políticos. Porque, afirmou, “os chamados crimes políticos são (…) a expressão da intransigência de um poder ilimitado que não admite a livre expressão crítica ou a atuação contrária de quem dele diverge.”
Foi a rutura com a chamada ‘primavera marcelista’ em que quis acreditar. E não foi o único…