O Cinema visto pela Teologia (92): “Hypnotic: Arma Invisível”

Uma leitura do filme “Hypnotic: Arma Invisível*

Por Alexandre Freire Duarte

“Hypnotic é um filme, por vezes muito violento, de ação detectivesca com fiapos de ficção científica que, a seu jeito e abusando de reviravoltas (por vezes escusadas) numa curiosa trama, mantém uma ligação empática remota com quem o vê e não se deixa “hipnotizar” por aquilo que ele é. A saber: um divertimento de baixo-custo e com um humor banal, mas, talvez também por isso, charmoso e jamais maçador (quiçá por nunca se contradizer naquelas reviravoltas, nem no enorme suceder de cenas de ação e intriga).

Os atores são esforçados: Affleck tem aquele peso(-pesado) de todo o seu historial cinematográfico que confere à sua personagem um jeito manhoso e desajeitado que se mistura muito bem com a densidade magnética do seu “herói” obstinado e resoluto. Dito isto, nem ele, nem os demais atores e atrizes em geral, conseguem escapar a uma direção menos fluída do que deveria ser, apesar de bem assistida por uma frequente música hitchcockiana e trocas de abordagem que nos mostram a diferença entre o real e o irreal.

Teologicamente falando, e embora longe dos labirintos da fronteira que estão a ser sequestrados por tantos neste fim de ano, vemos o perigo imenso que, mesmo com os “códigos de deontologia” existentes (às vezes só no papel), ainda podem surgir quando nos entregamos a “soluções mágicas” para a resolução dos nossos problemas. E isto, em vez de os oferecermos Àquele que, embora podendo não os resolver como queríamos, deles cuida como ninguém. Em especial, com um infinito respeito pela nossa dignidade.

Nisto, nós cristãos, devíamos ser Mestres, Doutores e pós-Doutorados: no vivermos replicando a esse Deus que mendiga o nosso amor por Si, para, desse modo, podermos amar os demais e, servindo-os, os afastarmos de mundos sombrios. Mundos em que se confia depressa em quem tem diplomas, mas age, não em função do interesse dos outros, mas do seu. Pior: e que manipulam tanta gente aflita, devido a viverem sem Deus-Amor, através de práticas banais mas envoltas numa aura de mistério (neste filme a “hipnose”).

A mensagem deste filme é fortemente pró-família e, de facto, é na família e desde a família que (sendo ela como um útero espiritual de amor e compreensão) devemos (ensinar a) proteger, alimentar e fazer crescer cristãmente a todos na esperança em Deus. Esta esperança não é, nem pode ser, instintiva, antes precisa de ser acolhida e dilatada numa relação pessoal com o Amor que Ele é. Só assim seremos capazes de enfrentar as grandes questões que, se não as iludirmos em torpores hipnóticos, nos assolam a todos, recordando que o amor não é só um meio para a perfeição, mas a própria perfeição em si.

A jeito de remate, diria que a principal ideia que, como cristãos, podemos tirar deste filme, é que é infinitamente melhor elegermos as nossas decisões assentes em princípios crísticos e cruciformes intemporais, do que desistirmos de decidir e, assim, acabar a viver com outros (usualmente pouco confiáveis, sejam eles indivíduos ou grandes grupos e organizações) a guiarem-nos cinicamente para onde lhes somos mais úteis. Decidir é arriscado, mas façamo-lo, andando com o amor à frente (diante do risco) e em último lugar (nas “procissões”) lembrando que a fé cristã não é um abrigo seguro, mas a elevação ao divino no amor: ao amor do Deus que morreu a (decidir) perdoar-nos.

(* EUA; 2023; dirigido por Robert Rodriguez; com Ben Affleck, Alice Braga, William Fichtner, J.D. Pardo, Hala Finley e Dayo Okeniyi).