O “bom ambiente” do Sínodo

Por M. Correia Fernandes

A notícia divulgada pela Agência Ecclesia a propósito da presença portuguesa na comunicação do Sínodo dos Bispos transmitia uma mensagem que nos deve despertar a atenção. O P. Paulo Pedroso, da Arquidiocese de Braga e Leopoldina Simões, assessora de imprensa e membro da Comunicação do Sínodo 2021-2024, transmitiram as suas impressões com palavras animadoras, quer sobre o ambiente vivido nos trabalhos, quer sobre o conteúdo das mensagens sinodais.

As palavras usadas por ambos inserem-se num universo a um tempo humanista e teológico, e por outro lado comunicacional: o respeito com que os participantes lidaram uns com os outros; o companheirismo no relacionamento; os homens e mulheres em diálogo em torno da novidade das mesas redondas para a partilha de opiniões e propostas; o sentimento de confiança e perseverança; a confirmação e consolação espiritual; o caminho feito e o caminho a fazer; a alegria, a paz e a confiança como legado desta participação.

A reflexão que importa salientar é a dimensão óbvia do que deve ser um Sínodo, que não deve ser entendido apenas como dos Bispos, mas de toda a comunidade eclesial e das múltiplas comunidades eclesiais, na sua amplitude e nas suas diferenças. E que a reflexão sobre os problemas teológicos e humanos da vivência cristã da Igreja se deve tornar sempre de paz e confiança, que conduzam à alegria. O próprio tema em torno do qual se quis fazer alinhar o Sínodo é significativo da mentalidade e atitude que o papa procura imprimir na mensagem e na ação da teologia e sociologia eclesial: “Para uma Igreja sinodal: comunhão, participação, missão”.

Importa também lembrar que a assembleia sinodal, presidida pelo Papa, teve 365 votantes, entre eles 54 mulheres, a quem se somam, sem direito a voto, 12 representantes de outras Igrejas e comunidades cristãs (delegados fraternos), oito convidados especiais e colaboradores da Secretaria Geral do Sínodo. A Conferência Episcopal Portuguesa esteve representada pelos seus presidente e vice-presidente, D. José Ornelas e D. Virgílio Antunes. De salientar também que o Sínodo terá, pro proposta do Papa, uma segunde etapa de continuidade em2024.

Lembra-se que entre os problemas mais debatidos surgiu a possibilidade do acesso das mulheres ao ministério diaconal, com opiniões diferentes: por um lado a ausência dessa prática na tradição, e por outro lado a resposta necessária na relação com os “sinais dos tempos”, na busca quer da valorização do papel da mulher quer na procura e renovação de nova vitalidade da Igreja, para a presença e ação no mundo atual.

Alguns porém expressaram o temor de que esta proposta se possa tornar numa “perigosa confusão antropológica”, aceitando o contraste entre a missão inicial da Igreja e o seu alinhamento com o espírito de cada época.

O problema antropológico da igualdade entre homens e mulheres, como nas chamadas “questões de género” não deve ser de confronto, nem de discussão de direitos, nem de cotas percentuais, mas de caminhos de cooperação que englobem a ação de todos, como veio acentuar o Papa Francisco na Jornada da Juventude. A questão não é de confronto, mas de colaboração. Tal como nos inícios da Igreja, em que as mulheres, mesmo em ambiente de desvalorização que então se vivia, desempenharam relevantes papéis na vivência e na divulgação da mensagem, o que está traduzido pela afirmação paulina: “não há homem nem mulher”, ambos partilham a mesma dignidade humana e evangélica. (Gal, 3,28).

Não parece ter sido posto em causa o papel dos Bispos, nem a sua autoridade, e sobretudo a afirmação da sua missão de representar e conduzir o povo de Deus, segundo e o espírito e a palavra evangélica. Significativo é o projeto de retomar daqui a um ano a continuidade dos temas do Sínodo, sendo proposto que sejam os mesmos membros a participar nos debates e decisões.

Outra dimensão do Sínodo é que o seu método, modelo e exemplo de diálogo e partilha, possam proporcionar experiências úteis para a convivência criativa entre as diversas dimensões da sociedade humana, no mundo político, económico e de convivência social.

Este modelo deveria também tornar-se polo de desenvolvimento espiritual e social, como podem traduzir estas palavras do Patriarca da Igreja Ortodoxa, ao destacar a fraternidade que tem sido construída entre os cristãos de todo o mundo nos últimos cem anos, passando das relações tensas e de divisões doutrinárias ou morais para relações fraternas, onde buscam o que os une.

Lembremos as palavras de Francisco, ao lembrar os 50 anos da instituição do Sínodo dos Bispos: «O caminho da sinodalidade é o caminho que Deus espera da Igreja do terceiro milénio», a “dimensão constitutiva da Igreja”. (Discurso por ocasião da Comemoração do Cinquentenário da Instituição do Sínodo dos Bispos, 2015).

O que mais se poderá aproveitar do Sínodo é não esquecer a semântica da palavra: fazer caminho em conjunto, em unidade, em procura…