Por Secretariado Diocesano da Liturgia
Continuamos a apresentar algumas das reflexões do Prof. Borges de Pinho, na conferência de abertura do Encontro Nacional da Pastoral Litúrgica subordinado ao tema: “Ministérios na Igreja sinodal”. Pode ouvir-se uma gravação da lição na página do SNL:
A corresponsabilidade na vida da Igreja e o apostolado cristão enraízam-se nos sacramentos da Iniciação cristã. Não carecem de mandato específico da hierarquia para se legitimar nem se interpretam numa lógica de suplência. Antes brotam do dinamismo do seguimento de Jesus que constitui a identidade crente. O sacerdócio comum que cada cristão é chamado a viver não é uma realidade formalmente ministerial, mas ele funda legítimos ministérios batismais na Igreja, ministérios que têm uma consistência e validade teológica e teologal próprias que importa reconhecer e desenvolver.
Radicados nas realidades básicas que constituem a identidade cristã, os ministérios batismais não podem ser pensados nem exercidos numa perspetiva de suplência como algo de extraordinário e excecional que não teria razão de ser se houvesse um número suficiente de ministros ordenados. Essa mentalidade de suplência – a não confundir com a indispensável cooperação – continua bem presente nos documentos oficiais e na prática dominante. Está em causa a distinção teológica entre uma eclesiologia de responsabilidade (vocação cristã pessoal assumida com responsabilidade própria) e uma eclesiologia supletiva (primazia unilateral do ministério ordenado).
Não está em causa a necessária diversificação da estrutura ministerial da Igreja e o equilíbrio nos diversos serviços e expressões ministeriais mas a capacidade de a Igreja responder às necessidades da missão. Importa, por isso, superar a prevalência da lógica clerical que condicionou a receção do Concílio. Nesta perspetiva, as duas decisões de Francisco – acesso das mulheres aos ministérios instituídos e criação do ministério de catequista – representam um avanço significativo no plano simbólico, sendo um convite a ultrapassar bloqueios existentes e mentalidades retrógradas.
Na segunda parte da sua conferência, o Prof. Borges de Pinho refletiu sobre a vivência da sinodalidade como pressuposto da renovação ministerial. É neste contexto de busca de uma renovada articulação das figuras ministeriais e das formas de exercício do ministério que os caminhos da sinodalidade são absolutamente indispensáveis.
Passa por aqui um processo de conversão das mentalidades, das estruturas e das práticas sem a qual os ministérios na Igreja serão sempre vistos como panaceia para suprir a insuficiência ou incapacidade do ministério sacerdotal que, sem essa conversão, continua a ser visto como «o ministério». A vivência da sinodalidade é, assim, pressuposto e condição para a passagem de uma Igreja monoministerial para uma Igreja pluriministerial. Só num processo de crescimento da consciência e da prática sinodal é que os ministérios, tradicionais ou novos, poderão ser polos impulsionadores de comunidades-sujeito do seu próprio dinamismo de vida e contribuir para a renovação da ministerialidade na Igreja e da Igreja.
Para tal é indispensável a renovação do ministério ordenado (bispo, presbítero e diácono), a progressiva superação do binómio clérigos-leigos pela dupla comunidade-ministérios e apostar no desenvolvimento dos ministérios batismais.
Terminamos com uma reflexão nossa. D. António Ferreira Gomes dizia que não é possível permanecer no passado mas há duas formas de entrar no futuro: de frente ou às arrecuas… Podemos entrar no processo de renovação ministerial da Igreja de frente: por convicção e por genuína conversão pessoal e comunitária. Ou poderemos esperar, de forma passiva e inerte pela implosão do modelo monoministerial/clerical gregoriano-tridentino exausto e já em rotura. Mas então já não seremos sujeitos da mudança que se fará não connosco mas apesar de nós. Há, contudo, grande vantagem em entrar de frente no futuro, se possível preparando e dando formação adequada aos que deverão ser protagonistas da renovação.