
Por Secretariado Diocesano da Liturgia
O Instrumento de Trabalho [= IL] que a Assembleia do Sínodo dos Bispos terá diante de si durante o próximo mês de outubro não ignora o tema «Liturgia». Basta uma constatação quantitativa: a palavra «liturgia»/«litúrgico» aparece 19 vezes no texto, «sacramento»/ «sacramental», 13 vezes, «Batismo»/«batizado(a)»/«batismal», 49 vezes…
Focando-nos em «liturgia» ela aparece-nos, em primeiro lugar, como horizonte, fundamento e referência exemplar da «Igreja sinodal». As suas variadas expressões e ritos, são um tesouro a reconhecer e a acolher numa unidade que não anula a diversidade nem a esmaga na uniformidade. É na celebração litúrgica e, particularmente, na Eucaristia que fazemos a experiência suprema da comunhão, dimensão essencial do ser Igreja na sua peregrinação na história até à plenitude escatológica. Lê-se no n. 20: «uma Igreja sinodal não pode ser entendida senão no horizonte da comunhão, que é sempre também uma missão de proclamar e encarnar o Evangelho em todas as dimensões da existência humana. A comunhão e a missão nutrem-se da participação comum na Eucaristia, que faz da Igreja um corpo «ajustado e unido» (Ef 4,16) em Cristo, capaz de caminhar em conjunto rumo ao Reino». «É por isso – acrescenta-se no n. 30 – que uma Igreja sinodal se nutre incessantemente na fonte do mistério que celebra na liturgia, “a meta para a qual se encaminha a ação da Igreja e a fonte de onde dimana toda a sua força” (SC 10), e em particular na Eucaristia.
Na caminhada sinodal, o IL valoriza de modo especial o método do diálogo no Espírito. Refere-se que esse método permite a passagem do «eu» ao «nós» em que a dimensão pessoal não é sufocada mas integrada harmoniosamente na dimensão comunitária (n. 35). Ora essa é uma das notas distintivas da liturgia e da chamada «epiclese de comunhão». É pelo dinamismo do Espírito que o «eu» dá lugar ao «nós» e por isso a Liturgia é experiência fontal e culminante da comunhão porque nela «a graça da Palavra e da Eucaristia se torna uma realidade sentida, atualizada e transformadora» (34).
O próprio «sínodo» de algum modo se torna Liturgia, e é para ser «celebrado», o que o distingue radicalmente de qualquer «parlamento». O IL recorda a sua estrutura, herdada da prática sinodal da Igreja antiga: a) a invocação do Espírito e a Profissão de Fé (chamemos-lhe «Ritos iniciais»); constitui-se assim a «assembleia» que goza da presença de Cristo e da iluminação do Espírito; b) tempo da escuta para ouvir a Palavra e os irmãos, discernindo em docilidade ao Espírito (diríamos que é a «Liturgia da Palavra», para usar uma designação litúrgica); c) «Ação de graças por meio do Filho no único Espírito» (cf. n. 48). Só com esse método e dinamismo «litúrgico», o Sínodo poderá ser movimento da comunhão para a comunhão, sempre em crescendo, em intensidade e extensão.
Mas a Liturgia também será «tema» para o diálogo sinodal, conforme o IL o perspetiva. Com o respeito e acolhimento das diferenças, que são riqueza das Igrejas, sem pôr em causa a comunhão essencial no Mistério celebrado na Liturgia, emergiu, sobretudo, o tema da inculturação: «Várias dioceses, conferências episcopais, assembleias continentais manifestaram o desejo de poder rearticular a vida comunitária e sobretudo a liturgia de acordo com as culturas locais, num processo de inculturação permanente» (B1.5.3).
O IL recorda que, a este respeito, há já magistério elaborado: Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos, Instrução Varietates legitimae, 25 de janeiro de 1994. E este documento remete, por sua vez, para a Constituição conciliar sobre a Sagrada Liturgia Sacrosanctum Concilium. Mas, como se diz na Introdução à segunda parte de IL (Fichas de trabalho), isso não significa nenhum bloqueio ao debate. «O facto de continuarem a surgir questões sobre pontos deste género não pode ser descartado apressadamente, mas deve ser objeto de discernimento, e a Assembleia sinodal é um fórum privilegiado para o fazer. Em particular, há que investigar os obstáculos, reais ou aparentes, que impediram os passos indicados e o que é necessário fazer para os eliminar». E, como é óbvio, os passos a dar nesta matéria, terão de assegurar «um equilíbrio adequado entre a unidade da Igreja, expressa também na unidade do rito, e as legítimas variedades, que uma correta inculturação tem em devida conta» (IL B.2.1.a).
Voltaremos a este tema.