O direito à existência, à integridade física e aos recursos

Por Joaquim Armindo

Na sua mensagem para o Dia Mundial dos Pobres (19 de novembro), o bispo de Roma e papa Francisco depois de contar a história de Tobite e Tobias (livro de Tobias), serve-se duma importante afirmação de São João XIII, que diz: “O ser humano tem direito à existência, à integridade física, aos recursos correspondentes a um digno padrão de vida: tais são especialmente a nutrição, o vestuário, a moradia, o repouso, a assistência sanitária, os serviços sociais indispensáveis. Segue-se daí, que a pessoa tem também o direito de ser amparada em caso de doença, de invalidez, de viuvez, de velhice, de desemprego forçado, e em qualquer outro caso de privação dos meios de sustento por circunstâncias independentes da sua vontade” (Paz na Terra – n.º 11).

Uma primeira consideração é sobre o uso por Francisco de um livro pouco comum, e que possui lindíssimas histórias para nosso tempo, embora saibamos que Tobite não é um livro considerado por algumas tradições religiosas, porque será apócrifo, não consta da bíblia hebraica, na Comunhão Anglicana é deuterocanónico (ver artigos de fé do anglicanismo), mas foi considerado canónico pela segunda vez pelo Concílio de Trento, pela Igreja Católica Romana. Constitui um livro, escrito pelo ano 200 a.C., de acordo, diga-se pelas mais recentes descobertas, nomeadamente as de Qumrã, muito rico nos seus ensinamentos para o hoje da nossa vida, e ainda bem que o papa Francisco demonstra quanto é preciosa a sua leitura e meditação. Deixo aqui só mais um pequeno naco desse livro: “Não fiques, nem por uma só noite, com o salário de um operário que trabalhe para ti; entrega-lho imediatamente. Se servires a Deus, Ele te recompensará. Presta atenção, filho, a todas as tuas obras e mostra-te prudente em todas as tuas ações. Aquilo que não queres para ti, não o faças aos outros. Não bebas vinho até à embriaguez, e que esta nunca te acompanhe no caminho. Reparte o teu pão com os famintos e as tuas vestes com os nus. Tudo o que te sobejar, dá-o de esmola, e não fiques com os olhos postos no que tiveres dado.”

Mas deixemos este pequeno apontamento do livro de Tobite ou Tobias, que considerei necessário, e fixemo-nos na mensagem papal, intitulada “Nunca afastes de algum pobre o teu olhar” (Tobias 4,7). E por isso escreve Francisco um desafio aos cristãos e cristãs, que façam como Tobias: “Ou seja [os mais pobres], convidar para partilhar o almoço dominical, depois de ter partilhado a Mesa Eucarística. A Eucaristia celebrada tornar-se-ia realmente critério de comunhão. Aliás, se ao redor do altar do Senhor temos consciência de sermos todos irmãos e irmãs, quanto mais visível se tornaria esta fraternidade, compartilhando a refeição festiva com quem carece do necessário!”. Porque “Se sou pobre, posso reconhecer de verdade quem é o irmão que precisa de mim. Somos chamados a ir ao encontro de todo o pobre e de todo o tipo de pobreza, sacudindo de nós mesmos a indiferença e a naturalidade com que defendemos um bem-estar ilusório.”

Vamos entender a profundidade da mensagem do bispo de Roma?