Cinema visto pela Teologia (71): Apologia pro scriptis meis

Uma leitura desta rubrica

Por Alexandre Freire Duarte

Fazendo uma pausa no grande desfasamento que vem sucedendo, desde há meses, entre, por um lado, a saída dos filmes no cinema e, por outro lado, a publicação, na “Voz Portucalense” (VP), da sua leitura teológica (que chegou, em alguns casos, aos dois meses), decidi fazer um interregno. Seja entre os filmes saídos em inícios de Maio de 2023 e os saídos em fins desse mês (perdoem-me os que, tendo saído pelo meio, mereceriam a minha atenção, sobretudo alguns bons filmes do Azerbaijão), seja para responder a quem me tem feito várias perguntas sobre estes textos. Uma apologia pro textis meis, diriam, portanto, os suecos que falam familiarmente latim.

Admito que de cinema, além do gosto por ver filmes (nas salas de cinema), percebo menos do que de Pinguins-das-Galápagos. Mas tento fazer o melhor na primeira parte dos textos – em que os aprecio a nível artístico – e não fazer o meu pior na segunda parte dos mesmos – em que tento deslindar no que eles podem servir de reflexão para os cristãos. E que temas não são cristãos? Onde é que podemos achar algo acerca do qual os cristãos não têm, por vocação, algo a dizer? Onde não devemos meter o coração?

Disse “não fazer o meu pior”, pois diversas pessoas perguntam-me: 1) para que fazes isso? 2) Achas que alguém te vai ler? 3) Não te serve nada para a carreira; 4) e estás sempre a repetir-te com as tuas referências ao “ego”, ao “egoísmo”, ao amor e a manifestar uma contínua visão pessimista e desordenadas da vida e da vida Cristã.

Aprendi, a custo, a tentar defender ao máximo a opinião dos demais. Donde, dou por certo isso tudo que me dizem. Não o discuto, nem contesto. Mas contextualizo e respondo a tais perguntas com a alegria cristã que procuro levar para onde sempre estou.

1) Faço isto pois acredito que o cinema é por onde andam (quer saibam ou não os pais e educadores cristãos) os “peixinhos”. Como pescadores de homens, não os temos que os procurar; sabemos que eles já “lá” estão. Escrever isto, é uma forma de tentar oferecer, com o meu jeito desajeitado, a tais pais e educadores um instrumento teológica para falarem, em família ou na escola, com os jovens. De acharem “mapas de sentido” nos filmes pelos quais os “mapas de sentido” que os jovens possuem de si sejam enriquecidos e se encaixem no maior “mapa de sentido” que é a “História da Salvação”.

2) Sei, pois me disseram por email e pessoalmente, que há oito pessoas que me leem. É quase o mesmo número de seguidores de Jesus que estavam junto d’Ele naquele momento da Sua morte que, envolta na escuridão, ninguém viu claramente. Serão menos (podem ter dito o que disseram por simpatia) ou mais leitores. Não me movo por paletes. Bastava que só alguém lesse de vez a vez os meus textos que isso chegava. 1. Não 99.

3) E deverei absolutizar a carreira quando o que conta é ser quem devo ser na vida cristã que me foi dada por Deus-Amor, a Igreja e os “meus”, e eu vivo com fraqueza nas comunidades em que me insiro? Sou feliz sendo docente em diversos sítios, que muito estimo e honro, mas não é a carreira que me move. Dai-me, Senhor, pés para lavar a ensinar, mesmo com a minha dislexia – a qual, às vezes e apesar da ajuda de um ex-aluno e muito amigo meu, transforma os meus textos no puzzle semanal da VP.

4) A vida espiritual cristã (e a humana, que se quer humanizar, em geral) na sua essência mais fundamental é de uma enorme simplicidade. É, numa resposta de reconhecimento agradecido, passarmos do “ego” ao “eu”, por decisões em que damos o nosso “sim” ao mais certo amor (crístico e cruciforme) – com profundo amor ao Deus-Amor (cujo amor por nós deve maravilhar-nos) como Pai, à Igreja (sempre em reforma) como mãe e aos demais (caminhantes como nós) como irmãos. Isto não é ser pessimista; é ser realista e ver tudo desde esse “sim” (já um pouco glorificado) que não engana as pessoas com discursos, esses sim retorcidos, sobre facilidades inexistentes para quem vive sob o arco-íris da alegria do discipulado cristão no seio da vida e da Igreja de Jesus. Se este é o “mapa de sentido” mais amplo, não espanta que porções dele surjam, uma e outra vez, presentes nos filmes que apresento, sendo que nada digo que não seja sugerido pelos mesmos. Perdoe-me se, por isso, me transformo na “Rádio Melga” (como me chama o meu filho quando lhe repito indicações…).

Os filmes voltarão e perdoem-me estas pipocas que vos impingi nesta pausa.