
Por M. Correia Fernandes
Dávamos no número anterior a notícia do falecimento de Bernardino de Bessa Nunes Chamusca, ocorrido em 30 de maio de 2023. Dávamos conta da sua profissão de advogado, mas salientávamos outros aspectos relevantes da sua vida: ter sido durante muitos anos colaborador da Voz Portucalense, Diretor da Obra Diocesana de Promoção Social e colaborador na fundação da paróquia da Senhora do Porto, na vigararia Porto Poente. O seu percurso eclesial e profissional tem origem na freguesia de Nespereira, no concelho de Lousada, onde foi sepultado nesse dia 31 de maio. Nascido em 24 de março de 1947, contava 76 anos. Frequentou os seminários do Porto, tendo concluído a formação de Filosofia e o curso de Teologia. Fez depois estudos de literatura na Faculdade de Letras do Porto, mas acabou por se licenciar em Direito, assumindo a profissão de advogado.
O seu gosto pela escrita e pela intervenção cultural e a sua atenção à vida eclesial levou-o a colaborar na Voz Portucalense, como semanário diocesano, mas também noutros órgãos da imprensa portuense, como O Comércio do Porto, O Primeiro de Janeiro, e também no Mensageiro de Santo António, publicado pelos Frades Menores Conventuais e no Espaço Solidário, órgão da Obra Diocesana de Promoção Social. Foi igualmente assistente de realização da Radiotelevisão Portuguesa, no tempo da passagem para a televisão a cores, e chegou a orientar um programa na Rádio Renascença, chamado Maranata, uma leitura cristã dos acontecimentos daquele tempo.
Morando na freguesia de Ramalde a quando do desenvolvimento urbano do Bairro do Viso, colaborou com o pároco fundador da paróquia da Senhora do Porto, Padre António Inácio Gomes, paróquia que ajudou a fundar entre 1970 e 1975, e depois na construção da igreja de S. Paulo do Viso (que é a única na cidade do Porto dedicada a S. Paulo).
Assumiu depois a tarefa de elaborar o percurso histórico desta paróquia, elaborando o volume
“Paróquia da Senhora do Porto – 25 anos”, publicado em 1990, e depois também a memória de outra paróquia, nessa altura fundada, escrevendo “Paróquia da Senhora da Ajuda – 25 anos”, publicada no ano seguinte.
Outro trabalho de grande fôlego e dedicação foi a elaboração do percurso da “Obra Diocesana: 40 anos de Promoção Social“, editado em 2007.
Duas obras de atenção e investigação
Na monografia da igreja da Senhora do Porto, para além dos dados da sua construção (projeto, custos, caminhos da sua edificação ao longo se vários anos, a partir da capela ali existente e que foi demolida para utilização do espaço), e o trabalho do seu arquiteto Mário Marais Soares, teve o cuidado de evidenciar as duas obras de arte que dão sentido ao templo: o sacrário e a imagem de Cristo crucificado, da autoria do escultor Zulmiro de Carvalho e do pintor Júlio Resende, para além do painel polícromo que constitui o frontal do altar, salientando “a colaboração exemplar” entre os dois artistas. Lembro-me de ouvir a Vasco Morais Soares, filho do arquiteto que projetou a igreja, e que depois projetou a de S.*aulp do Viso e a igreja de Ramlade, também já falecido, que “aquele sacrário é uma obra de grande valor simbólico e artístico”.
Mantendo sempre obras de autor, a igreja possui atualmente duas obras também originais: uma Via Sacra, inspirada no desenho do Crucifixo, com leituras diversas para cada estação, e um novo presépio, ambas da autoria da escultora Ana Carvalho, que executou também, no atelier do escultor José Rodrigues, uma escultura de S. Paulo e outra de uma Senhora do Rosário, presentes na igreja de S. Paulo do Viso. Regista um texto do Jornal de Notícias em que se evidencia “a dignidade artística da Igreja Paroquial de Nossa Senhora do Porto”. Regista igualmente a cerimónia da sagração da igreja, em 18 de junho de 1989, presidida pelo Arcebispo Bispo do Porto, D. Júlio Tavares Rebimbas, bem como a celebração inaugural pelo mesmo Bispo da igreja de S. Paulo do Viso, em 17 de março de 1985 (três anos antes da Dedicação da igreja paroquial).
A “ Obra Diocesana de promoção Social”
Mas um trabalho e maior investigação engloba a elaboração do volume Obra Diocesana, 40 anos de Promoção Social, desenvolvida ao longo de 269 páginas, com um Prefácio de Manuel Clemente, Bispo do Porto, que assinala “o oportuno trabalho, de cuidadosa recolha e apresentação histórica e sistemática” desta obra.
A obra parte de um enquadramento urbanístico de “O Porto onde nasceu a Obra Diocesana”, com as suas “ilhas” e bairros camarários, a constituição na Diocese da Associação de Cultura e Serviço Social e do Secretariado Diocesano de Acção Social (1956, por D. António Ferreira Gomes), a instituição da Obra Diocesana pelo Administrador Apostólico de então, D. Florentino de Andrade e Silva (1964), os problemas dos bairros, muitos documentos e iniciativas, dificuldades e perspetivas dos primeiros anos, a colaboração com a Câmara Municipal do Porto, a progressiva expansão da Obra nos diversos bairros, a atribuição da Medalha de Ouro de Valor e Altruísmo pela Câmara Municipal, as reações da Imprensa da cidade. Vieram depois os “Anos de Crise: 1995-1997”, com os trabalhadores em greve, as dificuldades financeiras e os caminhos de superação.
No ano de 1998, já com a direção de Bernardino Chamusca, é assinado o protocolo de colaboração e apoio da Câmara Municipal do Porto, na presidência de Rui Rio.
De facto, foi em maio de 1998 que o Bispo do Porto, D. Armindo Lopes Coelho nomeou nova Direção da Obra, presidida por Bernardino Chamusca, sendo assistente Frei Bernardo Domingues. Um novo mandato foi também presidido por Bernardino Chamusca, nomeado em 2 de janeiro de 2002, sendo assistente o P. Lino da Silva Maia, passando a sede a utilizar o palacete dos Viscondes da Pesqueira, na rua D. Manuel II. Um projeto de acordo para o bairro de Santa Luzia (freguesia de Paranhos) fracassou. Na continuidade da Obra e no protocolo de apoio pela Câmara Municipal teve papel relevante a ação Bernardino Chamusca.
A partir de 2004, foi nomeado um novo Conselho de Administração, presidido por Américo Ribeiro, com a missão de assistente o P. António Manuel Barbosa Ferreira.
No final do segundo mandato, Bernardino Chamusca, em mensagem aos colaboradores, escrevia: “Sinto que é um privilégio ter o meu nome ligado e esta grande Obra da Igreja do Porto, ao serviço voluntário da qual dei o melhor que sabia dar. Sei que a Obra está neste momento lançada para o futuro e espero… que realize cada vez melhor o seu serviço de solidariedade” (p. 123).
O volume enquadra depois uma segunda parte, que descreve os diversos Centros Sociais da Obra, as suas valências, as reações da imprensa aos seus serviços e um registo dos colaboradores (várias centenas) e a biografia sumária dos Bispos que a acompanharam: D. Florentino de Andrade e Silva, D. António Ferreira Gomes, D. Júlio Tavares Rebimbas, D. Armindo Lopes Coelho (estes já falecidos), até ao tempo de D. Manuel Clemente.
Em acrescento, há uma referência aos Viscondes de S. João da Pesqueira (em cuja doação de encontrava sediada a Obra) e aos seus espaços, objetos artísticos (atualmente em exposição no Paço Episcopal), incluindo a fundação do Colégio Português em Roma, por ele promovida, cuja erecção canónica se verificou em 20 de outubro de 1900. Uma foto dos fundadores com a presença do Bispo D. António Barroso encontra-se atualmente no Paço Episcopal do Porto.
Conclui com uma cronologia de Acontecimentos até à nomeação de D. Manuel Clemente como Bispo do Porto.
A Obra Diocesana continua com a sua ação e iniciativas pelo bem da sociedade, mesmo que nem sempre compreendidas.
Trata-se pois de um trabalho de cuidada investigação, a que a Diocese e a História da Cidade na sua dimensão Social ficam devedoras.