Sair e cuidar

Por Joaquim Armindo

As tensões sempre existirão nas igrejas, sejam de que tradição forem. Diria mesmo que as tensões nas igrejas são alimento do Espírito Santo. Há que existir harmonia, bem-querer, uns com os outros e todos com todos. Desde os primeiros cristãos e cristãs que diversas opiniões surgiram – algumas levadas ao cisma – mas tal não significa que o Jesus, o filho do carpinteiro de Nazaré não estivesse com todas essas tensões e até lhes desse alimento. Os pensamentos evoluem, todos estão em desenvolvimento, para o meu entender, só a misericórdia de Deus e o seu Amor são permanentes e servem as pessoas e todos os seres vivos e inertes. O Espírito do Senhor sai do caminhar que todos e todas fazemos, Ele não é apanágio de alguns, mesmo que ordenados para servir a Igreja, Ele brota com intensidade das contradições e dos momentos felizes e menos felizes. Hoje o Espírito do Senhor sopra em Portugal por intermédio de vários fatores: ou seja, a preparação do Sínodo, ou seja, a Jornada Mundial da Juventude ou, mesmo, e, até especialmente, do relatório sobre sevicias que membros da igreja praticaram, em nome dos poderes, que dizem de Deus, sobre as crianças abusadas e isso é continuar a crucificar Jesus.

Com estas tensões todas os cristãos e as cristãs da Igreja Católica Romana avançam para um Sínodo, que sendo “dos Bispos”, foram, porém, escutadas muitas das organizações da igreja. Com mais ou menos corte dos textos produzidos a partir das comunidades cristãs passou-se a uma fase chamada “Continental”, que no caso europeu decorreu neste mês de fevereiro, em Praga. Dois dos verbos que saíram desta reunião foram “sair” e “cuidar”, indo ao encontro de todas as “feridas existenciais” dos homens e das mulheres e de toda a Criação. Este “sair” e procurar não é só relativamente a uma dicotomia “igreja e mundo”, mas mais em sair dos “poderes” que se foram construindo em redor da igreja e que fazem parte, infelizmente, indelével do próprio ser da Igreja.

“Sair” e “cuidar”, da própria igreja, também, das marginalizações que a estrutura hierárquica tem criado, e saber que “marginalizados” e “marginalizantes”, cuidam-se mutuamente, e que aqueles dos que possuem o poder de marginalizar, saibam que a sua libertação em Jesus, depende, sobretudo, dos marginalizados. As decisões corajosas dependem muito desta consciência de que se existem “marginalizados” é porque alguém os marginalizou.

Não está em causa a Igreja, porque se estivesse em causa, com tantos pecadores lá dentro, dizia-me um amigo, já não existiria. O que se torna necessário é sem tibiezas não marginalizar mais ninguém, confiando que o Espirito do Senhor atua e, principalmente, através dos marginalizados. É necessário “sair” e “cuidar”, tendo consciência da necessária destruição dos “poderes” enraizados, por força da marginalização de muitos e muitas.