Três acontecimentos eclesiais destes dias

Por M. Correia Fernandes

Os últimos dias ficaram marcados entre nós por três acontecimentos eclesiais: a visita do papa Francisco ao Barhein, a nomeação de D. Armando Esteves Domingues para Bispo de Angra e o falecimento do Bispo D. Daniel Henriques, Auxiliar de Lisboa.

A visita do papa ao Barhein não mereceu da parte dos nossos media a atenção que devia merecer, para quem souber ler os acontecimentos com olhos de presente e com rasgos para o futuro.

O Barhein (ou Barém, como alguns transliteraram em português) é uma pequena ilha (a que se associam outras ainda mais pequenas) no Golfo Pérsico, ligada à península arábica e próxima da agora muito falada península do Qatar onde se vai realizar o campeonato do mundo de futebol. Por que razão escolheu o papa esta terra para visita? A sua superfície é de 780 quilómetros quadrados e a sua população de 1,7 milhões…

A mais plausível razão é a aproximação das comunidades cristãs ao mundo islâmico, na busca do entendimento inter-religioso em ordem à edificação da paz. Esta dimensão foi bem vincada nas palavras que proferiu nas várias circunstâncias da visita. Não deixa de ser significativo que a última celebração a que presidiu, após celebração anterior na sua mais antiga igreja, tenha reunido cerca de 30 mil pessoas no estádio, naquele país de muçulmano. “O Papa convida-nos a viver juntos a nossa multiplicidade”, em espírito fraterno e evangélico, como afirmou o Cardeal libanês Béchara Raï, patriarca de Antioquia dos Maronitas, que concelebrou a Missa no Estádio Nacional do Bahrain em Riffa. Segundo declarações a Notícias do Vaticano, afirma: “Penso que o Papa quis fazer estas viagens, e creio que esta é a quinta, a países árabes ou de maioria muçulmana e onde há cristãos, para continuar no caminho iniciado com o  Documento assinado com o xeique de Al-Azhar em Abu Dhabi, e com sua Carta Encíclica Fratelli tutti“. Assim lembrou o significado desta quinta peregrinação de paz e diálogo de Francisco em países de maioria muçulmana, depois dos Emirados Árabes Unidos, Marrocos, Iraque e Cazaquistão.

Importa reter o principal das suas mensagens ali transmitidas. A ideia central foi a do papel das Religiões na construção da Paz no mundo, que acompanha o seu apelo reiterado para o fim da guerra.  Muitas foram as expressões orientadoras que o papa utilizou, como linhas de força das suas mensagens, como estas: as novas gerações devem “semear fraternidade”; importa superar os  “ventos de guerra” que atingem a humanidade, e não apenas na Ucrânia, tendo referenciado o Iémen, o Myanmar na Ásia, a Etiópia, lembrando sobretudo o drama das populações que sofrem.

Ao deslocar-se simbolicamente em cadeira de rodas, o Papa Francisco mostra que as limitações físicas não destroem a força de ânimo nem o projeto salvífico da mensagem de Jesus Cristo para a Humanidade.  Desta forma (e das múltiplas que tem utilizado na sua ação), o papa Francisco constitui uma referência ética espiritual para a humanidade. Ao propor o encontro entre as religiões cristãs e a muçulmana, procura superar o espírito bélico que ao longo da história as separou e conflituou. Ao lembrar que todas as religiões devem ser construtoras da Paz, exprime o sentido profundo da Religião: a busca do Absoluto. Podemos lembrar aquelas figuras que em tempos diferentes da história procuraram já esta aproximação, particularmente na Idade Média, como o próprio Francisco de Assis que rumou à terra da palestina anunciando a paz, ou os filósofos medievais como de Raimundo Lúlio (que defendeu biblicamente a aproximação de judeus, muçulmanos e cristãos), e ao lado de Tomás de Aquino ou Averroes.

O Papa Francisco torna-se assim um profeta do nosso tempo na valorização do espírito religioso e da colaboração das diversas religiões no aperfeiçoamento da condição humana

para o bem comum da humanidade, como propõe: “Sejamos sempre a favor do diálogo, tecedores de comunhão com os irmãos de outros credos e confissões”.

A nomeação de D. Armando, Bispo Auxiliar do Porto para Bispo de Angra é uma perda para a Igreja Portucalense, mas será um enriquecimento para a Diocese de Angra, certamente uma das maiores do país, quer em extensão quer em número de sacerdotes.

Vindo das terras de Castelo Branco, D. Armando tornou-se entre nós uma referência pastoral, reconhecida pelo próprio Bispo do Porto, que dele afirma: “trabalhou zelosa e dedicadamente nesta Diocese do Porto, a ponto de suscitar em todos a máxima consideração e estima”.

O falecimento de D. Daniel Henriques, bispo auxiliar de Lisboa, aos 56 anos de idade,

constitui também um motivo de meditação de todos e de gratidão da Diocese. Pároco, diretor espiritual do seminário, bispo auxiliar “partiu em paz, como em paz viveu toda a sua doença e sobretudo estas últimas semanas de hospitalização”, escreveu o Patriarca.

A vida está para além do corpo e do tempo. Na palavra de Cristo, nasceu da ressurreição.