Música gregoriana na capela de Fradelos

Por João Alves Dias

O canto gregoriano, com raízes pré-cristãs na salmodia das sinagogas judaicas e influências da música mediterrânica, foi reorganizado, no final do século VI, por S. Gregório Magno que lhe deu estatuto de canto oficial da igreja. Daí o nome deste canto que inspirou a música erudita e popular europeias e está na matriz dos cantares tradicionais portugueses por influência dos mosteiros que povoavam as nossas terras.

Em 1995, por inspiração do Cónego Ferreira dos Santos, um grupo de antigos alunos dos seminários do Porto, liderado por Belarmino Soares, então maestro do Coro de S. Tarcísio, decidiu criar o Coro Gregoriano do Porto para homenagear o seu professor P. Luís Rodrigues e preservar um património cultural que se ia perdendo.

A qualidade do seu trabalho fê-lo, rapidamente, ultrapassar as soleiras da igreja da Lapa onde deu os primeiros passos com o motete ‘Rorate’ no primeiro domingo do Advento.

Por solicitação das mais variadas instituições de índole cultural, científica e religiosa – autarquias, universidades, museus, irmandades, paróquias e outras – as suas vozes encheram catedrais e mosteiros, igrejas e capelas, auditórios e salas de espetáculos, desde o rio Minho até ao Baixo Alentejo. E chegaram à ‘Sala do Senado’ na Assembleia da República a pedido do seu presidente, Dr. Jaime Gama.

No ‘Ano Xacobeo’ de 2010, por convite do Deão da Catedral de Santiago de Compostela, Cónego José Maria Diaz, solenizou a ‘Misa do Peregrino’ do dia 11 de dezembro, presidida pelo Cardeal D. Carlos Valejo, bispo emérito de Sevilha.

No dia 9 de maio de 2012, cantou em Roma, na Praça de S. Pedro, durante a ‘Audiência Geral ‘do Papa Bento XVI que, posteriormente, lhe agradeceu e abençoou os seus componentes, em carta enviada pela Nunciatura Apostólica.

Para salvaguardar o seu tesouro e despertar os grupos litúrgicos para a espiritualidade da música gregoriana, gravou quatro discos, de mil CD’s cada, o primeiro dos quais se encontra esgotado.

Porém, a sua vocação primeira foi o serviço à liturgia dominical. Com o Coro de São Tarcísio, começou por cantar a Missa do meio-dia na igreja da Lapa onde permaneceu vários anos. No início deste século, a pedido do P. Moreira, reitor da igreja da Trindade, passou a fazer-se ouvir, no último domingo de cada mês, na Missa das 18 horas, celebrada pelo Cónego Rui Osório. E fê-lo sempre com muito gosto e cuidado, até que a pandemia veio interromper a sua participação.

Os anos passaram… Com o tempo, o espírito vai-se aprimorando mas a voz vai definhando… Com o falecimento de quatro dos seus cantores e os imprevistos da idade, já não pode assegurar um volume de voz adequado à grandeza desse templo. E assim, com uma palavra de gratidão ao seu reitor, Cónego José Fabião, viu-se na necessidade pôr fim a uma colaboração de muitos anos numa igreja onde sempre foi bem acolhido.

Dado que o sentido de serviço se mantém, o coro passará a cantar a missa do 3º domingo de cada mês, na capela de Fradelos, onde, por deferência do Cónego Álvaro Mancilha, já tem vindo a ensaiar.

Esta capela, dedicada a Nossa Senhora da Boa Hora e situada no cruzamento das ruas Guedes de Azevedo e Sá da Bandeira, passa despercebida face à volumetria do Siloauto que a ‘esmaga’. É o único vestígio da toponímia antiga e teve origem na ‘Fonte de Fradelos’ junto do ribeiro homónimo, que, no frontispício, ostentava a imagem de Nossa Senhora da Boa Hora, ainda hoje, a sua padroeira.

De exterior simples, o seu interior faz dela uma joia escondida da azulejaria portuguesa. As paredes da nave e as laterais da capela-mor estão recobertas por painéis da autoria de Jorge Colaço, o mesmo autor dos azulejos do átrio da estação de S. Bento. E retratam a vida de Santa Teresa de Lisieux, com base na “História de uma Alma’ que ela própria escreveu.

Será já no próximo dia 20 – ‘Domingo de Cristo Rei’ – na missa das 11h30, que a espiritualidade do canto gregoriano irá sintonizar com a simbologia dos painéis que têm como fio condutor a ‘rosa de Santa Teresinha’.