Por João Alves Dias
No dia 25 de agosto deste ano, o JN informava: “António Teixeira Fernandes, professor catedrático jubilado da Universidade do Porto, morreu ontem, aos 83 anos. Docente fundou, em 1985, o departamento e o curso de Sociologia na Faculdade de Letras da Universidade do Porto, estando ligado à criação da revista ‘Sociologia’, em 1991”
A Voz Portucalense, em 7 de setembro, dedicou-lhe duas longas colunas na secção ‘Sacerdotes falecidos’ e, no dia 14, publicou o testemunho do Teixeira Coelho, seu condiscípulo e conterrâneo de que respiguei: “Teixeira Fernandes foi também um estudioso atento à sua terra natal. Deixa-nos o importante estudo “Memória e Identidade em Comunidade Autárquica – Arouca na encruzilhada do passado e do futuro”.
Eu presto-lhe homenagem, lembrando o nosso último encontro. Aconteceu no dia 3 de junho, na Casa Sacerdotal onde vivia e eu, por solicitação do Monsenhor Soares Jorge, fui dar o meu testemunho de vida.
Antes de iniciar, veio saudar-me. Ao dizer-lhe que começaria pela minha colaboração nos “Alvores da Obra Diocesana”, perguntou-me se poderia fazer o enquadramento sociológico e histórico desses primórdios. Com um sorriso, agradeci a sua oferta.
Então, na linha do que escreveu no livro ‘Para a História da Diocese do Porto – Dom Florentino de Andrade e Silva’, começou por dizer:
Nas décadas de cinquenta e sessenta, a Câmara Municipal do Porto vinha praticando, no sector da habitação social, uma política de não integração urbana, apesar de ser louvável a sua intenção de erradicar o grande cancro da cidade que eram as ‘ilhas’ formadas durante o período de industrialização do Porto ao longo do século XIX.
E explicou: Com a criação dos bairros camarários a Câmara esqueceu que estava a construir novos ‘ghettos’ porque a deslocação das pessoas não era acompanhada de um desenvolvimento comunitário que promovesse uma nova modalidade de habitar.
E com alguma emoção na voz, porque ia falar duma atividade da Igreja em que esteve pessoalmente empenhado, esclareceu: Para obviar a tais males, D. Florentino criou, em 1963, o Secretariado Diocesano de Acção Social que tinha por objetivo orientar e ajudar as famílias modestas, especialmente nos bairros populosos, a resolver os seus problemas. Não seria mais uma obra de assistência nem a sua função seria “dar esmolas”, antes visava uma ação educativa, orientadora, estimulante, coordenadora, supletiva”.
E completou a sua intervenção dizendo:
Após um período de organização, o Secretariado decidiu avançar para o terreno. D. Florentino criou, em fevereiro de 1964, a ‘Obra dos Bairros’ e chamou o João para seu responsável.
Foram mais ou menos estas as suas palavras. Mas não falou foi sobre o seu contributo na criação do Secretariado e, indiretamente, da Obra Diocesana de Promoção Social e do apoio que me prestou o início do meu trabalho. Não disse que, como secretário particular de D. Florentino, era o seu ‘alter-ego’ na direção do Secretariado.
Terminei o meu testemunho com estas palavras: durante doze anos, servi a Igreja sob a orientação pastoral de dois bispos, seis anos com cada um: D. Florentino, de 1963 a 1969, e D. António, de 1969 a 1975: duas personalidades e dois carismas bem diferentes, mas com o mesmo espírito de serviço e amor à Igreja.
No final, o P. Teixeira Fernandes veio agradecer-me. E foi a última vez que nos vimos.
Ele era assim: amigo, reservado, discreto, metódico, inteligente. Uma personalidade multifacetada.
Como escreveu no prefácio do seu livro sobre Arouca, “Não se pode amputar aos grupos e às sociedades a sua capacidade de recordação, sob pena de se destruir a sua memória e com ela a consciência da sua identidade”.