O Cinema visto pela Teologia (38): o filme “Thirteen Lives”

Uma leitura do filme “Thirteen Lives*

Por Alexandre Freire Duarte

Quem não se lembra do drama que ocorreu na Tailândia, em 2018, com o grupo de jovens presos numa gruta? Eu não. Nada de nada. O nascimento do meu filho estava para breve e desde que ele nasceu parece que tenho sido eu a viver numa “gruta”, tantas têm sido as que fiz com ele na brincadeira (algo que me poupou, creio eu, à claustrofobia derivada de vivenciar este filme).

“Thirteen Lives” (que só pude ver no pequeno ecrã) podia ser tudo o que não é, mas o seu realizador logra evitar o sentimentalismo e os banais artifícios melodramáticos, expondo uma série de tramas entrecruzadas (às vezes de uma forma desorientadora) com arte, respeito, tensão, realismo e atenção aos detalhes mais relevantes (descurando, e bem, os acessórios). Mais do que as crianças ou os mergulhadores que as retiraram da gruta, o resgate em si mesmo, levado a cabo por uma grande comunidade humana, é o grande herói deste eficaz drama de suspense.

Isto é conseguido: pelo simplificar dos perfis das personagens desempenhadas por um grupo soberbo de atores; pelos sons naturais e mecânicos envolventes; pela música calma que evita excitações e entretenimentos artificiais; enfim, pela composição inspiradora do poderoso cenário ambiente exterior e interior. Um cenário majestoso que nos envolve, sem ferir; que nos segura, sem amarrar.

Vendo este filme como teólogo, tudo o que se passa com as crianças me fez lembrar a situação existencial em que nos encontramos como espécie humana: completamente perdidos enquanto entregues ao nosso pecado e radicalmente necessitados de ajuda. Jesus, que está sempre a vir até nós (sobretudo pela Igreja), é esta Ajuda. Apesar do que nos dizem os coevos vendedores de ilusões e fraudes, não há outra. Ele não espera que nos redimamos a nós mesmos, e até sofre quando, com as nossas condutas moralísticas supersticiosas e fúteis (como a dos jovens a esgravatarem uma saída pela rocha), nos queremos substituir a Ele nessa missão.

Mas se isso, do Seu lado e para enorme felicidade e alegria nossa, foi feito de uma vez por todas, do nosso, ainda está inacabado. De facto, precisamos de assumir e viver esse Seu resgate e, depois e já em agradecimento sacrificial e gratuito, atestarmos essa ação amorosa do Senhor. Como? Empenhando-nos no perseverante seguimento espiritual ao Mesmo e, de modo cooperativo e colaborativo, pondo: a Igreja sonhada por Cristo diante da cobiçada por nós; o amor avante do calculismo; o bem dos demais à frente do nosso; a vida deles antes da nossa.

Sim: a vida é frágil, bela, brutal e tantas vezes divisora. Porém, se cada um de nós entretecer, com humildade corajosa, os seus dons com os dos demais (não numa planilha de Excel, mas numa de saberes crísticos maduros e testados na cruz do serviço amoroso), poderemos estar certos que o sombrio labirinto de caves, em que os nossos egoísmos nos colocaram, não nos será fatal. Seremos, antes, capazes de dar as mãos e, seguindo o próprio caminho que Deus seguiu até ao nosso encontro, deixarmos tais cavernas e irmos até ao Seu luminoso e misericordioso Coração.

(* Reino Unido, 2022; dirigido por Ron Howard, com Viggo Mortensen, Colin Farrell e Joel Edgerton)