
Por Secretariado Diocesano da Liturgia
Se a «formação para a liturgia», com a sua vertente mais teórica, não pode ser descurada, o mais importante é a «formação pela liturgia» ou, como Francisco prefere dizer, «formação litúrgica». Trata-se – diz o Papa – de ser «formado pela participação na celebração litúrgica». «Mesmo o conhecimento de estudo … para que não se torne racionalismo, deve estar em função do realizar-se da ação formadora da Liturgia em cada crente em Cristo» (DD 40). Assume-se assim a convicção de que a Liturgia forma para a liturgia de um modo vital.
«A Liturgia não diz respeito ao “conhecimento” e a sua finalidade não é primariamente pedagógica» (DD 41) – recorda Francisco a quem, porventura, ignore a etimologia da palavra “liturgia”. Na celebração litúrgica, o Espírito Santo que nela opera «conforma-nos» a Cristo, «forma Cristo» nos participantes e é nisso que consiste a plenitude da nossa formação (Ibid.). «Não se trata de um processo mental, abstrato, mas de chegar a ser Ele. É esta a finalidade para a qual foi dado o Espírito cuja ação é sempre e só a de fazer o Corpo de Cristo. É assim com o pão eucarístico, é assim para todos os batizados chamados a tornarem-se cada vez mais aquilo que receberam em dom no Batismo, isto é, a serem membros do Corpo de Cristo» (Ibid.).
«Em continuidade e coerência com o método da encarnação», tudo isto se realiza «por via sacramental» (DD 42). E Francisco faz notar que a liturgia não vive de abstrações mas de realidades concretas da criação e da cultura: «pão, vinho, azeite, água, perfume, fogo, cinzas, pedra, tecido, cores, corpo, palavras, sons, silêncios, gestos, espaço, movimento, ação, ordem, tempo, luz». É toda a criação que é assumida pela liturgia e nela é «posta ao serviço do encontro com o Verbo encarnado, crucificado, morto, ressuscitado, que subiu ao Pai» (Ibid.).
«É assim que se esboça a primeira tarefa do trabalho da formação litúrgica: o homem deve voltar a ser de novo capaz de símbolos» (Guardini, citado por Francisco). A todos – pastores e fiéis – incumbe esta árdua tarefa porque o homem moderno se tornou analfabeta em relação aos símbolos a começar pela própria dimensão simbólica do corpo humano, expressão epifânica da alma espiritual na unidade irredutível do ser humano, sujeito encarnado, constitutivamente aberto ao transcendente.
«O ter perdido a capacidade de compreender o valor simbólico do corpo e de todas as criaturas torna a linguagem simbólica da Liturgia quase inacessível ao homem moderno» (DD 44). Mas esta linguagem, a partir da encarnação do Verbo, é irrenunciável. Por isso, precisamos «de recuperar a capacidade de utilizar e de compreender os símbolos da Liturgia» (DD 44). Trata-se de ser sujeito ativo (expressão simbólica) e passivo (perceção simbólica). Ser «capaz de símbolos» tem estas duas direções: percecioná-los, captá-los, assimilá-los para, simultaneamente os viver, realizar, pôr em ato.
Como recordava SC 11, não nos podemos contentar com assegurar a validade dos sacramentos, eficazes «ex opere operato» e a sua celebração lícita, mas compete-nos promover a participação frutuosa dos fiéis ou, como diz Francisco, «uma plena implicação das pessoas» o que pressupõe que estas se coloquem de modo adequado perante a linguagem da celebração. «A leitura simbólica não é uma questão de conhecimento mental, de aquisição de conceitos, mas é uma experiência vital» (DD 45).
O Papa exemplifica como poderá ser esta «educação simbólica»: «Penso nos pais e, mais ainda, nos avós mas também nos nossos párocos e catequistas. Muitos de nós aprenderam precisamente com eles a força dos gestos da liturgia, como por exemplo o sinal da cruz, o estar de joelhos, as fórmulas da nossa fé. … Facilmente podemos imaginar o gesto de uma mão maior que toma a mão pequena de uma criança e a acompanha lentamente no traçar pela primeira vez do símbolo da nossa salvação. Ao movimento juntam-se as palavras, também elas lentas, quase a querer tomar posse de cada instante daquele gesto, de todo o corpo: “Em nome do Pai … e do Filho … e do Espírito Santo … Amen”. Para depois deixar a mão da criança e vê-la a repetir sozinha, prontos a ajudá-la, aquele gesto acabado de entregar, como uma veste que crescerá com ela, vestindo-a no modo que só o Espírito conhece. A partir daquele momento aquele gesto, a sua força simbólica, pertence-nos ou, talvez seja melhor dizer, nós pertencemos àquele gesto que nos dá forma, somos formados por ele. … O resto é obra do Espírito. Assim fomos iniciados na linguagem simbólica. Desta riqueza não podemos deixar-nos despojar» (DD 47).