O Cinema visto pela Teologia (36): “Mundo Jurássico: Domínio”

Uma leitura do filme “Mundo Jurássico: Domínio*

Por Alexandre Freire Duarte

Nunca gostei de nenhum dos filmes que passaram a fazer parte da já longa série, em duas partes, associada ao originalmente spielbergiano “Parque Jurássico”. Aceito que, devido a isso, me chamem um “dinossauro” ou até um fóssil, mas não seria capaz de escrever estas palavras se não o admitisse logo à partida.

Não sei como dizer isto de uma forma mais amena: esta obra é um triste fim para algo que já vira todo o seu sumo espremido. Parece mesmo que só foi feita para espremer mais alguns milhões de dólares a quem se dirigiu aos cinemas para verem Domínio. O que, quando o filme aponta para a ganância de empresas capitalistas, é ou um golpe de génio, ou um tremendo escarnecer de quem o vê.

As ideias parecem reaquecidas; teve-se que ir buscar personagens antigas da série para arranjar ocasiões catárticas, sensíveis e de conflito interno em figuras que, de outro modo, são incoerentes; o frenesim é tal, que não há tempo para nos deleitarmos com as pequenas pérolas, se calhar involuntárias, que surgem. Assim, e apesar de grandioso, tudo é pífio: a música, os diálogos e o quase ausente suspense numa história atrapalhada, implausível e forçada por falta de lógica temática. Ante tudo isto, nem o fantástico grupo de atores consegue fazer resultar seja o que for, sendo que, às vezes, estes parecem no mínimo perdidos, aborrecidos e frustrados.

Mas a nível teológico, creio poder dizer que “o cenário muda”, colocando-nos face ao dilema: existe o ser humano para cuidar da natureza, ou é a natureza que tem que “tratar” da humanidade para sobreviver? A frouxa, pois ignorante, censura à meditação bíblica de Gn. 1,26ss, ajudada pelo mantra “todos os seres têm o mesmo valor”, está presente. Porém, o que se vê em Domínio são, justamente, os seres humanos a cuidarem de uma Criação que só se realiza genuinamente enquanto tal, se, por nós, caminhar para a frente, para cima e para fora dela mesma.

E se esse cuidar for logrado, é porque daremos prioridade: às pessoas sobre os lucros; à integridade sobre a falsidade; à perseverança sobre a letargia; à ciência moralizada sobre a ciência da ganância; ao manter as promessas sobre o buscar a discórdia; ao entregar-nos aos demais sobre a mania do sentir-se bem. Ou seja: tudo existe para surgir o ser humano, mas este existe para guiar amorosamente tudo para uma, decerto diferenciada, partilha da vida com Deus-Amor, numa coexistência, em Cristo, de tudo e de todos. Isto não é ecologia, nem, muito menos, ecologismo. É teologia e vida cristã. Que belo que é, deveras, o coração do Trespassado.

Sim: cada um de nós precisa de fazer a sua parte para limitarmos os danos, e nos ajustarmos, a este planeta ferido, mas sem fitos prometeicos. Antes, sim, sabendo que tudo está nas humildes e pobres mãos de um Deus que, mesmo quando queremos dominá-Lo com a nossa vaidade e (ou) a nossa autoestima, não cessa de criar, com o Seu pródigo tutelar, cada criatura e em especial a nós. Isto é, à humanidade chamada a comungar com Ele na criatividade criativa, na fruição da beleza e do prazer sadios e, mormente, no realizar o amor que revira tudo para bem.

(* EUA, 2022; dirigido por Colin Trevorrow, com Sam Neill, Laura Dern, Jeff Goldblum, Chris Pratt)