Mãe dos Pobres e Avó Ngola

Quando no ano de 1973, no dia 1 de Novembro, a Irmã Ana Maria Gonçalves Teixeira, pisou terra Angolana, com destino à Missão de Santa Maria Eufrásia, em Camabatela, Quanza Norte, estava longe de pensar o que ali a esperava. Isso também não interessava. No esplendor da sua juventude, no ardor do seu invulgar zelo apostólico, moviam-na apenas a Vontade de Deus e o bem espiritual e humano dos seus irmãos que entusiasticamente queria servir e, como Paulo, fazer-se tudo para todos.

Não podemos neste reduzido espaço registar a experiência apostólica da Ir. Ana Maria. Correndo embora os riscos inerentes a qualquer síntese, vamos registar alguns factos que consideramos marcantes e esclarecedores.

A Irmã Ana Maria desde a sua chegada a Angola experimentou tempos algo conturbados devido ao fim da descolonização e implantação da Independência.

No decorrer da luta pela independência e implantação do novo regime, algumas Irmãs não conseguiram permanecer e regressaram a Portugal. A Irmã Ana Maria Goncalves Teixeira e a Ir. Maria Isabel Sousa decidiram permanecer. Diziam: “Sentimos muito receio em ficar, mas uma força imperiosa e interior nos leva a permanecer…É a hora do testemunho, a Igreja não pode enfraquecer, assim decidimos permanecer arriscando as nossas vidas”.

No dia 24 de Dezembro de 1975 foram forçadas pelos militares a abandonar a Missão, tudo o que lá havia e o povo pelo qual tinham ficado…

Dia 3 de Janeiro 1976 todos os missionários/as da Diocese do Uíge com o seu Bispo D. Francisco da Mata Mourisca assim como os do Quanza Norte, Camabatela, Samba Caju, Ndalatando… partiram rumo a Luanda sob as ordens dos militares. Após um mês no exílio, no dia 12 de fevereiro os missionários/as que o desejassem podiam voltar às suas missões.

A Irmã Ana Maria voltou. Encontrou a missão vazia de tudo. Em meio a vicissitudes de toda a espécie, permaneceu na missão de Camabatela durante oito anos de 1973 a 1981, graças ao seu zelo apostólico e missionário e à sua grande coragem e audácia.

A sua atividade missionária não se cingiu apenas a Camabatela, passou também por Samba Caju e Uíge. A sua presença era necessária sobretudo no campo da saúde.

Em 1985 a Vila de Samba Caju foi fortemente abalada por ataques de luta armada pelo poder entre UNITA e MPLA causando a morte, destruição, fuga do povo… No Ano de 1986, dia 18 de Janeiro, um novo e terrível ataque, fogo intenso, aterrador, deixa as Irmãs e os Padres da Missão totalmente isolados, todo o povo que escapara… abandonaram tudo e fugiram para refúgios mais seguros. Os riscos e as ameaças são constantes “ Não nos responsabilizamos pelas vossas vidas “ diziam os guerrilheiros. Assim, mais uma vez, as Irmãs tiveram de encerrar a Missão.

Em Outubro de 1986 a Irmã Ana Maria é chamada a fundar a primeira comunidade do Bom Pastor na Diocese do Uige. Aqui permanece nove anos onde exerceu um apostolado multifacetado. Ao longo destes anos trabalhou no Hospital com grande caridade e competência.

Em Janeiro de 1994 a Irmã Ana Maria é convidada a reabrir a Comunidade de Samba Cajú. Com as malas recheadas de medicamentos e roupas, ela parte generosamente pela terceira vez!!!

Com grande paixão e o zelo que a caracteriza como Irmã do Bom Pastor, a fim de “salvar as pessoas feridas”, volta a trabalhar no Hospital de Samba Cajú. Ao longo de 24 anos da sua vida aí permaneceu ao lado dos seus queridos doentes! E como se não bastasse, abriu um Posto de Saúde ao lado da comunidade, com capacidade de internamentos e farmácia, onde providenciava os medicamentos essenciais para atender os casos que viessem de longe ou fora das horas de consulta. Como o Bom Pastor, sempre se mantinha atenta às suas ovelhas!…

A sua capacidade de amar, servir e aliviar o sofrimento, não se limitava apenas aos doentes, mas também cuidava com o mesmo carinho as crianças, os jovens, os adultos e os velhinhos, procurando ajudar a todos. Daí lhe vem o doce título de: MÃE DOS POBRES e AVÓ NGOLA.

Atualmente a Irmã Ana Maria reside em Portugal embora o seu coração continue dividido por Angola…

Graças a Deus a situação em Angola é bastante melhor. Em Samba Caju foi construído um grande Hospital Municipal. O Conselho Municipal de Samba Caju, conhecedor da ação benéfica da Ir. Ana Maria durante tantos anos e em tempos difíceis, decidiu propor ao Governo da Província do Quanza Norte que o novo Hospital fosse dedicado em sua honra. O que foi aceite por unanimidade.

As Irmãs Angolanas e o povo manifestaram o desejo de que a Ir. Ana Maria estivesse presente na inauguração. Respondendo a este convite, a Ir. Ana Maria acompanhada de outra Irmã, sua companheira de Missão em Angola, a Ir. Filomena Sousa, deslocaram-se propositadamente a Angola.

No dia 20 de Julho de 2022 com a presença do Governador da Província de Quanza Norte Adriano Mendes de Carvalho e da Administradora Municipal Ana Bela António Dias, Autoridades locais, Médicos e Enfermeiros, o Pároco de Samba Caju, Irmãs do Bom Pastor e muito povo, deu-se a Inauguração do Hospital Municipal de Samba Caju.

Cortaram a fita Sr. Governador e Ir. Ana Maria, enquanto o povo aplaudia fortemente. O Governador teceu elogios e agradeceu à homenageada por todo o bem realizado. Em seguida o Frei Henrique fez uma linda oração e benzeu o Hospital.

Muito mais haveria a dizer, mas termino atando de memória um diálogo muito eloquente:

Diz a Ir. Ana Maria na sua humildade:

– Senhor Governador eu não esperava isto…

Ao que o Senhor Governador respondeu:

– Mas nós esperávamos ansiosamente este momento, Avó Ngola.

(inf: Filomena Sousa)