Por M. Correia Fernandes
Ocorreu em 25 de julho a festa de S. Tiago, que em muitos lugares será celebrada no domingo seguinte.
São Tiago é uma das figuras de apóstolos mais referenciadas nas paróquias da Diocese do Porto. Com efeito, podemos encontrar 24 paróquias da Diocese cujo padroeiro é S. Tiago,que disponibilizamos a seguir, salvo alguma falha.
No Grande Porto, duas: Custóias e Milheirós da Maia; em Lousada, uma (Cernardelo);
em Paços de Ferreira, duas (Carvalhosa e Modelos); em Santo Tirso, duas (Carreira e Rebordões); na Trofa, uma (Bougado); em Vila do Conde, uma (Labruge); em Amarante, uma (Figueiró); em Baião, uma (Valadares); em Penafiel, três (Capela, Fonte Arcada e Valpedre); em Felgueiras, três (Pinheiro, Rande e Sandim); em Vale de Cambra, uma (Codal); em Espinho, uma (Silvalde); em Oliveira de Azeméis, uma (Riba Ul); em Santa Maria da Feira, quatro (Espargo, Lobão, Lourosa e Rio Meão).
Este dado traduz o conhecimento por parte das comunidades cristãs da figura evangélica de S. Tiago, e a devoção que suscita pela sua predominância entre os discípulos e certamente pelo facto de ter sido o primeiro dos apóstolos que recebeu a palma do martírio, logo no início da evangelização, às mãos do governador Herodes Antipas, conforme refere o livro dos Atos dos Apóstolos, no início do cap. 12, o que terá acontecido por volta do ano 44 da nossa era. A partir deste acontecimento, certamente os discípulos, os primeiros cristãos, guardaram o corpo e lhe deram sepultura. É a partir deste dado que se originou a lenda de que o corpo de Tiago veio pelo mar até um “Campus Stelae” no norte da península Hispânica (na Galiza), onde se originou um dos maiores centros de peregrinação de toda a cristandade.
Caminhos de Santiago, busca de sentido
É em torno deste local simbólico para onde confluíram caminhos, tanto a partir do oriente como do sul, que se originaram os conhecidos “caminhos de Santiago” hoje percorridos por numerosos peregrinos de todo o mundo, quer pela fé quer pela descoberta das terras e dos povos. A Casa Diocesana de Vilar dispõe de um albergue de acolhimento, que não se encontra em funcionamento, mas a Casa acolhe os peregrinos com preços especiais. Jjunto à catedral do Porto e por toda a cidade assinalam-se locais de passagem dos caminhos de Santiago.
Por ocasião do Dia de S. Tiago, lembramos que o Cardeal D. António Marto será Legado Pontifício para a Peregrinação Europeia de Jovens (PEJ) 2022, a realizar entre 3 e 7 de agosto, em Santiago de Compostela, neste difícil contexto mundial. Este encontro Europeu da Juventude em Santiago de Compostela tem lugar este ano como preparação para as Jornadas Mundiais da Juventude, a realizar em Lisboa, em 2023.
O Cardeal Marto assinalou: “O Papa Francisco quis surpreender-me com este convite desde que passei a bispo emérito, pedindo-me para ser seu enviado especial à peregrinação europeia dos jovens a Santiago de Compostela”, conforme uma mensagem de vídeo enviada pelo Santuário de Fátima à agência Lusa.
Nestas Jornadas são esperados “jovens representantes de praticamente todos os países da Europa” em Santiago de Compostela.
Realça o cardeal que este acontecimento, como tantos outros, procura transmitir aos jovens a necessidade de procurarem formas de espiritualidade para um mundo muito materialista e de buscarem “sentido da vida no meio da dispersão em que há mil solicitações”.
S. Tiago, o apóstolo de Jesus
É oportuno recordar a presença de Tiago nos evangelhos. Sabemos que Tiago foi um dos primeiros a ser chamado com o seu irmão João, e lembra J. Ratzinger que o próprio Jesus os chamou “Boanerges” , filhos do trovão, pelo seu entusiasmo e pelo seu zelo, pelo qual foram considerados membros o partido dos “zelotas”, o que, afirma, não tem fundamento. O que sim eram, pela tradição e pela lei mosaica, judeus crentes e observantes.
Lembramos que pertenceu ao grupo restrito dos três que estiveram em momentos chave da presença de Cristo: a Transfiguração, a presença na ressurreição da filha de Jairo, narrada em Marcos 21, e a presença na oração no jardim das oliveiras (Mat. 26,37). Também se lembra o pedido da mãe para que fossem colocados no reino um à direita e outro à esquerda, o que mereceu de Jesus a observação. “Não sabeis o que estais a pedir” (Mat.20,22).
Lembra Ratzinger que a missão confiada aos discípulos tinha duas dimensões: expulsar os demónios e curar, vendo nesta passagem um referência ao apelo de superação da atmosfera anónima de violência que envenena a condição humana e um apelo a que promovam a humanidade na sua dignidade: “curar é uma dimensão essencial da missão apostólica” (Jesus de Nazaré).
Os outros “caminhos de Santiago”
Muitos são esses “caminhos” que se foram elaborando e realizando ao longo dos tempos. Talvez o “caminho francês”, que atravessa toda a península a partir do centro de França, percurso que pode ter tido inspiração na Cruzadas e nas peregrinações ao oriente, que na Idade Média motivaram muitas figuras da Igreja e da sociedade.
Dos caminhos portugueses sobressaem o caminho da costa, que, a partir do burgo portuense, terá originado o conjunto das igrejas dedicadas a S. Tiago, como Custóias, Bougado, passando depois por S. Pedro de Rates. Outros porém se foram igualmente afirmando, como os da zona de Penafiel, Felgueiras e Amarante, para além do caminho vindo do sul por terras como Castro Daire, Régua, Vila Pouca de Aguiar e Chaves (um pouco o caminho da Nacional 2). Há também um “caminho central” que de Lisboa passava por Tomar, Albergaria e Grijó.
O essencial é a consideração de que esta figura bíblica da família de Jesus, assassinado em plena idade adulta (possivelmente na casa dos 40), perdido nas vicissitudes do tempo e da imaginação criadora estimulada pela fé, plena do sentido humanista da peregrinação, da caminhada, da viagem no espaço e no tempo. Nas descobertas imprevistas das ânsias do espírito, conduziu à construção de ermidas e reconstrução de catedrais, nas múltiplas formas dos estilos arquitectónicos dos tempos e das eras, na busca de sentidos para a criatividade humana, Sanctus Jacobus, transformado em Sant’Iago, depois em Santiago, se pois simplesmente em Tiago, constitui uma inspiração de edificação humana e pessoal, de consciência das suas limitações e das dinâmicas da sua edificação futura. Que os devotos lhe descubram o entusiasmo e o zelo de “Boanerges”.