Novos sacerdotes: o que dizem sobre eles e sua missão

Voz Portucalense entrevistou os novos sacerdotes da diocese do Porto que foram ordenados no domingo 10 de julho.

 

Foram estas as perguntas de VP aos novos sacerdotes:

Quando é que o seu amor a Cristo passou a ser chamamento para a vida sacerdotal?

Como foi o seu percurso de vida até chegar ao Seminário?

Para si o que é ser padre hoje?

Alexandre Manuel Teixeira Moreira, 26 anos, natural de Cabeça Santa, Penafiel. Estudou no Seminário Maior do Porto

R: Desde cedo que a realidade da vocação, participação e missão eclesial constituíam a minha vivência cristã. Com o passar dos anos e o maturar do discernimento vocacional, encontrei o despertar e o ecoar de um sentido batismal que me desafiava a abraçar um caminho diferente, uma vivência singular, um amor totalmente oblativo a Deus nos irmãos. O sentido profundo e íntimo ao contemplar a Virgem Maria iluminada por um mar de luzes que, elevadas pelas mãos e sustentadas pelo canto dos crentes, se faziam iluminar e despertar para algo mais interior, para uma dimensão mais contemplativa e introspetiva, foi para mim um sinal de que, naquela noite materna, a luz do chamamento do Senhor brilhava, clareava e se afirmava mais do que outro farol para a minha vocação, para a minha felicidade.

R: Depois de frequentar o ensino primário (2002-2006), seguiu-se o ensino básico (2006-2011) (ambos em Cabeça Santa) e por fim o ensino secundário (2011-2014, na escola básica e secundária de S. Vicente de Pinheiro). A 14/09/2014 entrei para o Seminário do Bom Pastor. De setembro de 2015 a junho de 2021 frequentei o Seminário Maior do Porto onde, durante 6 anos, pude estudar na Faculdade de Teologia da Universidade Católica do Porto.

R: Servir a Igreja no ministério ordenado, nos dias correntes, passará por ser testemunho fiel e oblativo de um amor que se faz tudo para todos, de um amor que brota de um enamoramento primeiro e de um crescimento fecundo que encontra em Cristo Jesus a sua verdadeira e absoluta expressão. A alegria de ser padre manifestar-se-á seguramente por viver a vida com o olhar atento aos sinais dos tempos, sempre numa dinâmica de discernimento pessoal e comunitário e, a partir daí, em ter a ousadia de ser farol e guia, ministro e profeta, pastor e servo de comunhão. Sinodalmente, a vivência presbiteral pautar-se-á mais pela escuta que pela palavra, mais pelo discernimento que pela ação, mais pelo ser e estar que pelo parecer e ter. Na celebração da fé cristã, caberá ao padre, na pessoa de Cristo, ser sacramento e fermento de unidade do povo de Deus. Nesta Igreja a que pertencemos, em que esperamos e à qual amamos, o padre sente-se sempre chamado a ser um fiel discípulo de Cristo que fala coração ao coração. Dar de graça o que de graça se recebe será sempre o ponto primeiro para viver a vocação ministerial ordenada de uma forma plena, sincera, fiel. Na feliz fidelidade a Cristo, o padre será a certeza de que Deus, por Cristo, habita o coração, a vida, cada um de nós.

Gerardo Alberto Angel Comayagua, 33 anos. É de El Salvador. Estudou no Seminário Redemptoris Mater

R: Quando compreendi e experimentei que Deus me amava tal e como sou. Desde a minha adolescência sentia que algo faltava, pois tinha tudo: uma mãe que se matava trabalhando para dar-nos o sustento diário a mim e aos meus irmãos; uma família cristã que me transmitiu a fé levando-me à Igreja para receber os três primeiros sacramentos da vida cristã, valores morais e educação. Só estando dentro do Seminário compreendi que o que faltava, o que não via manifesto era o amor de Deus na minha vida. Aí compreendi que Deus por amor me deu a vida e que por amor também me tinha chamado para a vida sacerdotal, para ser luz para a minha família.

R: Como já mencionei na primeira resposta, cresci com uma família cristã que me transmitiu a fé; família com a qual a minha mãe trabalhava como empregada doméstica. Juntos me educaram e me reencaminharam à Igreja. Na adolescência entrei a uma Comunidade do Caminho Neocatecumenal e nesta surge a minha vocação através de um rapaz da mesma comunidade, com quem nos dávamos muito mal, quase que nos detestávamos. Convidou-me ao centro vocacional sem eu saber o que era aquilo. Este rapaz e eu hoje somos muito bons amigos: eu estou a dias de ser ordenado presbítero; ele está a alguns meses de receber o sacramento matrimonial. Foi assim que começou esta grande aventura como eu costumo dizer; passados três anos vim para o Porto como um dos primeiros oito seminaristas fundadores em 2008.

R: Penso que é procurar viver o ministério sacerdotal a imagem do Bom Pastor, aquele que vai sempre à procura da ovelha perdida.

Hugo Joel Pereira Cunha, 39 anos, natural de S. João de Ovar. Estudou no Seminário Maior do Porto

R: Foi um processo gradual. Ainda muito novo, já acompanhava os meus pais e a minha irmã à Eucaristia, sentia curiosidade pelas coisas de Deus e fazia perguntas. O meu amor a Cristo foi crescendo quando comecei a frequentar a catequese. Fui exercendo vários ministérios laicais na minha paróquia e a ideia de ser padre ia amadurecendo. Senti, progressivamente, que a minha vocação passava pela entrega total a Cristo e à sua Igreja, mas a decisão de entrar no Seminário, para fazer esse discernimento, foi tomada apenas quando eu tinha 30 anos.

R: A clarificação da minha vocação foi fruto de uma longa caminhada, com algumas oscilações. Fiz o percurso normal de catequese até receber o Sacramento da Confirmação. Entretanto, com cerca de 12 anos, comecei a acolitar e a participar no grupo coral como organista. Na adolescência, entrei numa fase de questionamento da fé cristã, as dúvidas levaram-me a um distanciamento espiritual da Igreja, mas não deixei de exercer os ministérios acima referidos. No início da idade adulta, foi convidado para ser catequista, possibilitando-me um maior aprofundamento da fé em Jesus Cristo. O exercício destes ministérios, fizeram crescer em mim o desejo de servir a Igreja com total disponibilidade. A questão da vocação ao sacerdócio ministerial começava paulatinamente a colocar-se. Por essa altura, concluí a licenciatura em Ensino Básico e trabalhei como professor. Quando me perguntavam se queria ser padre, dizia que não, mas ficava a pensar nessa possibilidade. Com a ida do Pe. Augusto Silva para a paróquia de São João de Ovar, acompanhando mais de perto o exercício do seu ministério sacerdotal, comecei a considerar o sacerdócio ministerial um modo de vida feliz e atrativo. Sentia-me cada vez mais envolvido pela proposta de me entregar totalmente ao serviço da Igreja, acabando por ingressar no Seminário do Bom Pastor, no dia 14 de setembro de 2014, onde frequentei o ano propedêutico. Entrei, no ano seguinte, para o Seminário Maior do Porto.

R: É ser um pastor com perfil conciliar e conciliador, que caminha com a comunidade, e com cada um, levando a que todos caminhem juntos ao encontro pessoal com Cristo. É ser alguém capaz de propor a verdade do Evangelho nos vários ambientes da sociedade atual, anunciando não só com palavras, mas também com o testemunho de vida.

Massimiliano Maria Arrigo, 34 anos. É de Itália e estudou no Seminário Redemptoris Mater

R: Teve vários momentos e diferentes fases. A primeira vez que senti fortemente o chamamento tinha 22 anos, e foi num encontro de jovens em Roma com o Papa. Naquela altura era um estudante de Engenharia. A partir daquele momento comecei a perguntar-me o que é que queria o Senhor de mim; assim comecei o discernimento vocacional. Fiz uma experiência num Seminário na Itália onde senti confirmada a vocação. Sucessivamente, querendo fugir ao chamamento ao sacerdócio, fiz o Erasmus, tive uma namorada e mesmo assim, continuei a sentir-me chamado pelo Senhor à vida sacerdotal, encontrando só em Deus as respostas aos meus anseios de felicidade. Expressei pela primeira vez publicamente o meu desejo de entrar no seminário no dia 11 de novembro de 2012, para depois entrar no Seminário Diocesano Missionário Redemptoris Mater do Porto no dia 28 de setembro de 2014.

R: Nasci numa família cristã que quis educar-me na fé. Frequentava a minha paróquia, e entrei no Caminho Neocatecumenal com 13 anos, onde quer os meus pais, quer o meu irmão faziam já parte. Nesta realidade fiz um caminho de fé onde foi descobrindo o amor gratuito de Deus por mim, assim como eu sou. Vi que só n’Ele encontro a felicidade e que é Ele que atua na minha história. Visto que queria um bom trabalho e formar uma boa família, entrei na Universidade de Engenharia. Depois, após um tempo de discernimento vocacional de alguns anos, entrei no Seminário em 2014.

R: Ser presença de Cristo no mundo e levar as pessoas a Cristo. Ser ministro da Misericórdia de Deus e anunciar o Evangelho a todos. Significa dar a vida, amar como Jesus amou, ou seja, na cruz.

José Emanuel Rodrigues Félix Milheiro Amorim, 25 anos, natural de Guetim, Espinho. Estudou no Seminário Maior do Porto

R: Não consigo precisar um momento, até porque não existe um momento. Trata-se sim de um caminho que fui fazendo de progressivo crescimento na família e na relação com Deus e a Igreja. Caminho esse que continuo a percorrer todos os dias e onde este amor a Cristo se vai tornando chamamento para o serviço. Assim, o chamamento na minha vida não se trata de um acontecimento passado, mas de um contínuo movimento de interpelação e resposta, é algo real, muito concreto, mas que não se encerra num único acontecimento. No entanto, muitos são os momentos, os encontros, as pessoas, as experiências e circunstâncias que se tornam determinantes no momento de ganhar coragem, arriscar e de dizer ‘Sim’.

R: Diz o Papa Francisco que os padres “não são como cogumelos”. As vocações não aparecem de forma espontânea, mas têm raízes que não devem ser esquecidas, por isso a importância da minha família, primeira Igreja, onde ouvi falar de Jesus pela primeira vez e aprendi a rezar. Depois, vivendo em Guetim, aí fiz todo o percurso de catequese.

Com cerca de 10 anos, juntamente com mais alguns amigos da catequese, inscrevemo-nos e fizemos experiência de Pré-Seminário nos Passionistas. Com 12 anos comecei a acolitar na minha paróquia, integrei o grupo de jovens que fazia parte do Movimento Juventude Alegria de Maria e colaborei no coro juvenil. Durante todo este tempo não pensei em entrar para o seminário, quanto mais em ser padre.

Apenas mais tarde, quando frequentava o ensino secundário e a preparação para o Crisma é que comecei a questionar-me acerca do meu projeto de vida e de qual seria o projeto de Deus para mim e para a minha vida. Nessa altura, em 2013, sou convidado pelo Pe. Sérgio Leal a participar num acampamento vocacional promovido pelo Movimento Oásis. A experiência e a vivência desse encontro vieram a tornar-se fundamentais na minha decisão de entrar no Seminário. Em 2014, tendo falado com o meu pároco de então, o Pe. João de Deus, fui apresentado ao Seminário do Bom Pastor onde frequentei o ano propedêutico.

R: O ser padre deve ser entendido como um puro dom amoroso de Deus, qual tesouro precioso que não é nosso, mas é dado por Deus para se fazer próximo da humanidade. O padre é aquele que fala com Deus, que mantém uma relação próxima com o Senhor para poder falar de Deus e levá-Lo aos outros. Hoje, o padre deve ser próximo, atento para a todos acolher e escutar, deve ser construtor de unidade, impulsionador de um caminho conjunto numa Igreja que é de todos e para todos.

Tiago Daniel Machado Dias, 25 anos, natural de Santa Eulália da Ordem, Lousada. Estudou no Seminário Maior do Porto

R: O chamamento à vida presbiteral é resultado do fascínio pela pessoa de Jesus de Nazaré, do Deus que se faz de tal maneira próximo que vem habitar connosco. O contacto com o Evangelho em Palavra e em ato despertou em mim o mesmo sentimento dos discípulos de Emaús: o coração a arder. Não consigo precisar na minha história pessoal um momento concreto que possa classificar como fundante, porque desde que me lembro que digo que quero ser padre. É evidente que dizer que se quer ser padre com 5 anos é completamente diferente de dizer o mesmo com 20. Muda sobretudo a perspetiva de uma vontade pessoal para a compreensão de uma vontade que nasce do coração de Deus. A minha caminhada vocacional é feita de pequenas respostas, no dia-a-dia, no confronto com a realidade que se me apresenta entre luzes e sombras, entre medo e coragem. Mas o sustento é sempre o mesmo, o coração de Jesus Bom Pastor.

R: Eu sou aquele seminarista que se costuma chamar «de carreira». Entrei com 15 anos no Seminário do Bom Pastor, em Ermesinde, e depois prossegui a minha formação no Seminário Maior do Porto. Antes disso tinha frequentado o pré-seminário, isto é, encontros mensais de dois dias. Assim, a minha vida antes do Seminário é muito reduzida. Não quer dizer, todavia, que o Seminário me tenha alheado da realidade. Frequentei sempre a escola pública em Lousada e depois, já no seminário, a Secundária de Ermesinde onde encontrei um ambiente desafiador para a minha vocação e para a minha fé. Neste sentido, nunca me senti desligado do mundo que nos pede uma resposta. Cuidei sempre de estar atento ao que se dizia e se esperava da Igreja na comunidade onde resido ou nos locais que frequentava.

R: Ser padre hoje é ser imagem e presença de Jesus Cristo no meio do mundo. Ser instrumento e continuador da sua mensagem e atividade libertadora. O padre para o séc. XXI deve ser um mensageiro da esperança do Ressuscitado que abre horizontes de eternidade, que convoca à comunhão com Ele. No contexto de uma Igreja Sinodal, o papel do presbítero consiste em sublinhar a bela imagem proposta pelo II concílio do Vaticano, a do povo de Deus que caminha em conjunto. A base da relação não pode ser a do poder, mas a do serviço e da entrega aos irmãos na construção da fraternidade, que decorre do batismo, o sacramento que a todos nos une. Paulo VI dizia que a Igreja é perita em Humanidade e o padre deve-o ser necessariamente, procurando acolher bem, dando uma palavra de alento e de encorajamento, enfim, ser cristão, isto é, outro Cristo.