
A Comissão Independente para o Estudo de Abusos Sexuais contra Crianças na Igreja em Portugal validou 338 testemunhos, em seis meses, e 17 casos foram enviados para o Ministério Público.
“Na quase totalidade dos testemunhos recebidos aparece uma dupla expectativa das vítimas: O pedido de perdão pelo passado, assumido pela Igreja, junto das vítimas, a par do inequívoco compromisso por um futuro diferente perante todos os seus fiéis”, referiu na quinta-feira dia 30 de junho Pedro Strecht, em conferência de imprensa, num balanço do trabalho realizado desde janeiro.
O coordenador da comissão disse aos jornalistas, na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, que entre os testemunhos validados – 29 foram excluídos – 56,9% são de homens.
Segundo o seu coordenador, a Comissão Independente já enviou para a Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) “justamente para que sobre estes testemunhos, e o consequente número de vítimas não reste apenas a resignação”, isto diz respeito à “necessidade inequívoca” da materialização da sua mensagem e do seu significado, “através de uma forma simples, digna, publica, mas para que não se esgote em palavras que poderiam perder o verdadeiro e profundo sentido”.
Este responsável explicou que “foram resolvidos com sucesso pontos importantes” sobre o acesso aos arquivos da Igreja Católica em Portugal por uma equipa de historiadores e arquivistas.
Pedro Strecht destacou que através do “empenho da CEP”, que enviou uma delegação à Santa Sé, foi possível, a 9 de junho, receber um documento assinado pelo secretário de Estado do Vaticano, o cardeal Pietro Parolin: “Corresponde a cada ordinário autorizar o grupo de investigação histórica da Comissão Independente consultar toda a documentação conservada nos arquivos eclesiásticos, mesmo secretos, sempre sob supervisão de bispo diocesano ou superior maior”.
O coordenador assinalou os encontros realizados com a CEP e a Conferência dos Institutos Religiosos de Portugal – CIRP, indicando que “todas as dioceses, institutos religiosos e sociedades de vida consagrada” receberam “as notas metodológicas relativas ao trabalho arquivístico, bem como a ficha de inquérito preliminar a realizar na fase 1 de levantamento de dados”.
O pedopsiquiatra lamentou que a mensagem e os contactos da Comissão Independente ainda não chegam a zonas mais periféricas dos grandes centros de Portugal, que têm “menor densidade populacional e indicadores diversos de maior isolamento”, locais onde reside grande parte de população mais envelhecida “e/ou com menores habilitações literárias”.
Pedro Strecht começou por destacar que a relação da Comissão Independente para o Estudo de Abusos Sexuais contra Crianças na Igreja em Portugal com a Conferência Episcopal, “que solicitou este estudo”, tem-se pautado como “uma boa prática de confiança mútua, cada vez mais em franca articulação”.
“Na qual se deseja, de parte a parte, prosseguir no sentido preciso de conhecer o que sobre este tema aconteceu no passado para melhor se poder atuar no futuro”, acrescentou o pedopsiquiatra.
Numa intervenção lida pelo coordenador da comissão, o juiz conselheiro jubilado do Supremo Tribunal de Justiça Álvaro Laborinho Lúcio informou que já remeteram para o Ministério Público “relativamente à eventual instauração do respetivo procedimento criminal 17 testemunhos”, mais um, aos 16 que já tinham enviado.
O antigo ministro da Justiça indicou também que têm sido estabelecidos contactos com a Polícia Judiciária para “apurar da existência de investigação” e para obterem “informação detalhada de casos ali registados de abusos sexuais contra crianças no seio da Igreja Católica”, durante o período do estudo da comissão.
O psiquiatra Daniel Sampaio referiu-se ao “abuso sexual no geral, não especificamente na Igreja Católica”, salientando que, se foi a Igreja Católica que deu este passo, de “escutar os abusos no seu seio, é preciso que a sociedade também o faça”.
Na conferência de imprensa que decorreu na manhã de quinta-feira dia 30 de junho, o padre José Manuel Pereira de Almeida (Patriarcado de Lisboa), vice-reitor da Universidade Católica Portuguesa, e os apresentadores de televisão Carolina Patrocínio e Manuel Luís Goucha leram breves testemunhos de abuso sexual, partilhados por três vítimas.
(inf: Agência Ecclesia)