Corpo de Deus, alma da Igreja, força na sociedade

A Solenidade do Corpo de Deus celebra-se nesta quinta-feira 16 de junho. Na diocese do Porto haverá Missa presidida pelo bispo do Porto, D. Manuel Linda na Igreja da Santíssima Trindade pelas 11 horas.

Pelas 16 horas haverá Vésperas Solenes seguida de Procissão Eucarística que terminará no Terreiro da Sé.

A este propósito publicamos o editorial VP desta semana.

Por M. Correia Fernandes 

Em todo o mundo católico a solenidade designada popularmente como  “Corpo de Deus”,  que em alguns países mantém a designação latina de “Corpus Christi”, ou mesmo simplesmente “Corpus”, procura traduzir de forma simplificada o sentido pleno da sua designação litúrgica: “Solenidade do Santíssimo Corpo e Sangue de Cristo”. Esta solenidade, celebrada na quinta feira após o domingo da Santíssima Trindade, recorda o momento fulcral da despedida de Jesus na última ceia com os apóstolos, deixando-lhas a sua presença de forma sacramental através das palavras “isto é o meu corpo”, e “isto é o meu sangue”, definido assim a dimensão corporal como dimensão identitária e salvífica da pessoa de Jesus.

Assim o entendeu a teologia e a tradição da Igreja. O hino “Pange Lingua” de S. Tomás de Aquino é particularmente eloquente neste entendimento e nesta compreensão: “Pela palavra o Verbo se fez carne”, “que a Fé venha suprir a fraqueza dos sentidos”.

O grande sentido eclesial e salvífico que este acontecimento significou foi entendido pela tradição da Igreja de forma sublime, uma das mais profundas compreensões do mistério pela consciência das comunidades cristãs, significando assim o verdadeiro sentido teológico da tradição: como o entendeu e celebrou o povo de Deus não pode deixar de ser entendido como manifestação da profunda revelação divina.

Assim o faz notar uma passagem do livro Jesus de Nazaré, de J. Ratzinger, ao afirmar, a propósito do sentido do pão ao longo do texto evangélico, que “a teologia da encarnação e a teologia da cruz, expressa na proclamação “isto é o meu corpo” e “isto é o meu sangue”, são inseparáveis uma da outra: “A encarnação do Verbo, de que fala o Prólogo [do evangelho de S. João], visa precisamente a oferta do corpo na cruz, à qual temos acesso no sacramento”, evidenciando igualmente o “o grande movimento da encarnação e do caminho pascal para o sacramento, onde encarnação e Páscoa sempre coexistem e insere o sacramento, a sagrada Eucaristia, no grande contexto da descida de Deus até nós e por nós”.

Assim pretende o Cabido Portucalense manter esta tradição universal, ao afirmar: A Igreja leva neste dia o “Divino Sacramento” através dos domínios da existência humana, percorrendo os caminhos do mundo, assinalando que o mistério de Cristo é a causa de salvação para toda a identidade humana.

É especialmente significativo que a procissão do Corpo de Deus se realize na cidade do Porto desde 1417, com algumas intermitências circunstanciais, como em 1974 e nos dois últimos anos de 2020 e 2021, pelas circunstâncias que vamos ainda sofrendo. Mas para as quais a procissão será certamente causa de alívio e de busca de sentido.

Estamos em tempo de laicidade proclamada. No passado a procissão tornou-se um momento de colaboração entre a Igreja e as autoridades, particularmente através dos municípios. Também agora será uma oportunidade para o exercício da laicidade, pela forma em que ela deve ser entendida: que as entidades laicas oficiais saibam acolher os movimentos culturais e espirituais dos cidadãos, que semeiam na sociedade os valores mais profundos da humanidade e da fé, que vence as inimizades, supera as lutas desgastantes e destruidoras e edifica o espírito fraterno, semente de todo o bem social e humano. No dizer do Presidente do Cabido Portucalense, “porque a dimensão religiosa tem expressões não apenas individuais e privadas, mas também comunitárias e públicas, e porque os membros da Igreja Católica são também cidadãos da República, com plenitude de direitos, há um vasto campo em que o encontro o diálogo e colaboração, entre o Estado e a Igreja não só é possível como é desejável. A história e a sociologia do porto, “Cidade da Virgem”, confirmam isso mesmo”.

Celebremos por isso com especial sentido de fé e de crescimento da comunidade humana este acontecimento litúrgico transformado em acontecimento da nossa convivência comum, tanto na cidade do Porto como em tantas outras comunidades ao longo de toda a Diocese e do país.