A centralidade do altar: Igreja do Coração de Jesus em Ermesinde

Por Secretariado Diocesano da Liturgia

A Igreja do Sagrado Coração de Jesus, cujo jubileu dos 50 anos de consagração se celebra no próximo dia 9 de junho, foi edificada num período de mudança. Recordemos que o II Concílio do Vaticano aprovou a constituição sobre a Sagrada Liturgia em 4 de dezembro de 1963 e que esse documento representa o ponto de chegada do movimento litúrgico. Este ganhara um novo impulso após a segunda guerra mundial, com os Congressos Litúrgicos internacionais – dos quais o de Assis, em 1956, foi a ocasião em que Pio XII declarou o movimento litúrgico como uma «passagem do Espírito Santo pela Igreja do nosso tempo». O mesmo pontífice iluminou o caminho da renovação litúrgica com o seu magistério doutrinal (Mediator Dei, 1947) e iniciou um importante processo de reformas litúrgicas.

A bênção da primeira pedra do Instituto do Bom Pastor «Haurietis aquas» com a sua «capela» em, Ermesinde, teve lugar a 14 de julho de 1957. Presidiu o Bispo do Porto D. António Ferreira Gomes. O autor do projeto foi o Arquiteto Aucíndio Ferreira dos Santos – um antigo combatente da primeira grande guerra, com atividade marcante sobretudo na cidade do Porto –, coadjuvado pelos então jovens Arquitetos Fernando Abrunhosa de Brito e Manuel de Magalhães. A construção prolongou-se até 1966. Foram anos de grande efervescência com uma renovada eclesiologia a redescobrir a assembleia eucarística como «comunidade de mesa», congregada em redor do altar.

A Igreja é um edifício de planta central. Ao centro, numa afirmação de verticalidade e transcendência, ergue-se uma cúpula hexagonal derramando a sua luz zenital sobre o altar, de generosas dimensões, a focalizar todo o espaço. Quatro dos lados do hexágono abrem-se para quatro coros ou naves onde se congrega toda a comunidade celebrante, idealmente reunida em redor do Mesa sagrada para a Ceia do Senhor. Os outros dois lados são ocupados: um pela presidência com a cadeira do presidente da celebração, assentos para os ministros e credência de apoio à celebração; outro pela mesa da Palavra e, atualmente, pelo Sacrário que para aí foi deslocado quando, em obediência às normas litúrgicas pós-conciliares, foi retirado do altar (o Sacrário foi ocupar o espaço onde inicialmente esteve uma imagem da Santíssima Virgem e, após a consagração de 1972, estava a imagem do Sagrado Coração de Jesus; consequentemente, esta foi deslocada para o fundo do «coro/nave das irmãs», alinhado com a nave da entrada). Na parede sobre a cadeira presidencial, contempla-se uma poderosa e terna imagem do Crucifixo, o oferente do sacrifício único, perfeito e definitivo, cujo memorial se renova sacramentalmente no altar da celebração eucarística.

Significativamente, a planta com quatro naves (coros) com o altar ao centro faz parte do «património» espiritual e litúrgico das Irmãs do Bom Pastor, como se pode ver na igreja-mãe da Congregação, em Angers (França). Corresponde também aos desenhos que a Irmã Maria fez de seu punho quando decidiu e prometeu consagrar ao Coração de Jesus a Igreja da Casa de Vale Formoso (Paranhos, Porto), projeto que foi realizado e logo demolido. É uma linguagem arquitetónica que destaca a centralidade da Eucaristia enquanto celebração e promove a edificação da comunidade a partir da Mesa/Altar.

Na época em que a atual igreja foi construída, o altar era também o lugar da reserva eucarística (sacrário) e, portanto, o centro do culto eucarístico fora da Missa, culto de adoração a que as Irmãs se dedicam todos os dias para satisfazer o voto de reparação ligado à consagração desta Igreja ao Coração de Jesus. Em obediência às normas litúrgicas, o sacrário foi deslocado para outro lugar, igualmente central. Mas as mesmas normas litúrgicas continuam a recomendar que a exposição do Santíssimo Sacramento fora da Missa se faça no altar da celebração, de modo a sublinhar a unidade intrínseca que existe entre esta e o culto de adoração à presença eucarística fora da Missa, que prolonga e prepara o louvor, a ação de graças, a propiciação e a súplica que têm na Eucaristia celebrada o seu ápice e a sua fonte.