Por João Alves Dias
Era uma tarde de primavera. O sol iluminava as águas do Douro que um cruzeiro agitava na sua passagem. Na praia, alguns banhistas mais afoitos, depois de um mergulho, vinham, a tiritar, aquecer-se na areia. Nos amieiros e salgueiros chilreavam passarinhos…
Também eu quis aproveitar esta dádiva da natureza e fui até um café junto à célebre ‘Casa Branca’ onde, em 1847, foi assinada a ‘Convenção de Gramido’ que pôs fim á ‘Guerra da Patuleia’.
As mesas da esplanada virada ao rio estavam cheias. E o que faziam os seus ocupantes, jovens na sua grande maioria? Deliciavam-se com a paisagem? Escutavam os trinados dos melros? Conversavam? Trocavam olhares de carícia? – Não. Quase todos estavam vergados sobre o seu telemóvel: jogavam; liam notícias; enviavam mensagens; dedilhavam fotografias; riam-se com os vídeos. Todos subjugados por um aparelho muito útil mas que se tornou no déspota dos tempos modernos.
E pensei: é gente jovem… Mas, à noite, num restaurante na Praça Dr. Francisco Sá Carneiro confirmei que também os menos novos se deixaram subjugar: numa mesa um casal entretinha-se com os telemóveis. Noutra, a senhora demorava-se numa longa conversa telefónica, enquanto o acompanhante, com o olhar em espera, trincava umas azeitonitas…
Foi então que me veio à mente uma entrevista em que o dono de um restaurante confessava: “Os restaurantes que têm Wi-Fi viraram autênticos velórios” (SOL 1/5/2022).
Estava eu com estes pensamentos quando li em 7Margens (7/Maio): “O telemóvel é uma invenção fantástica, incrível, fabulosa. Já mal imaginamos como eram as nossas vidas antes de haver telemóveis. Mas, com o evoluir dos aparelhinhos, aquilo passou a ser de uso muito mais vasto do que simplesmente para falar com alguém (para telefonar ou receber um telefonema, lembram-se?…) Há até quem brinque dizendo que os modernos telemóveis servem, inclusive para… telefonar”.
E acrescentava uma nota que me deixou a pensar: ”A ironia disto é que um aparelho que foi feito para a gente falar serve agora, e cada vez mais, para a gente calar. Estamos à mesa com alguém, a conversa não sai ou não nos apetece que saia, ficarmos a olhar uns para os outros em silêncio é pouco agradável, e… puxamos do telemóvel. Pronto, já ficamos confortavelmente calados. Todos e cada um com o seu aparelhinho nas mãos e nos olhos, bem caladinhos até que… chegou a comida! Vamos lá, duas de conversa rápida e já voltamos ali. Já voltamos, não a falar, mas a calar ao telemóvel. Ele, afinal, não nos põe à conversa. Ele, afinal, põe-nos calados”.
Não há diálogo com os presentes porque não estamos ali…”Estar nas redes sociais não é ser sociável”, avisa o Papa Francisco.
Infelizmente, não é só nos restaurantes. Também nas famílias, As refeições deixaram de ser um momento de convívio familiar; a mesa passou a ser um lugar onde se come o mais rápido possível porque o telemóvel não pode esperar…A não ser que, no entretanto, se dê uma ou outra espreitadela… E há sempre a possibilidade duma furtiva ida à casa de banho, com o telemóvel no bolso…
Não é sem razão que o Papa Francisco aconselhou as famílias a “desligar os telemóveis durante as refeições”. Esta recomendação fez-me parafrasear o ‘slogan’ rodoviário “Ao volante o telemóvel pode esperar” e dizer: “À mesa o telemóvel pode esperar”…