Uma leitura do filme “A Cidade Perdida” *
Por Alexandre Freire Duarte
Nem todos os filmes têm que ser enormemente divertidos, estimulantes e emocionantes, mas “A Cidade Proibida” atinge patamares muito aceitáveis em todos esses aspetos. Na verdade, trata-se de uma mistura de ação, aventura, romance e comédia que celebra um género clássico do cinema que, tendo tido o seu expoente em filmes como “Em busca da Esmeralda Proibida”, conseguem equilibrar o déjà vu com o ooh la la através de uma boa dose de je ne sais quoi.
Não haja dúvida: estamos perante uma fanfarrice hollywoodesca um pouco perdida nela mesma; mas uma que, não se levando demasiado a sério, não entedia, antes passa algumas mensagens que são bastante interessantes. O cenário (real e/ou digital) é magnífico; as cores ambientes são charmosas e vibrantes; o argumento (com alguns jogos de palavras e de imagens bem pensados) chega, em certas ocasiões, a ser hilariante; e, quase por fim, a química entre as duas personagens principais move-se num crescendo natural e ambíguo (também devido ao facto de claramente romperem estereótipos – uma constante, aliás, nesta obra –).
“Quase por fim”, pois desejei deixar um último pormenor cinematográfico para este parágrafo isolado, de modo a ressalvar um aspeto que estimo mais capital. Em concreto: “A Cidade Proibida” acerta em cheio no facto de que o cinema romântico de qualidade orbita, não a emocionalidade galopante, mas a saudável compreensão da sensibilidade afetiva e da vulnerabilidade do amor.
Teologicamente falando, poder-se-ia querer apontar a esta obra, e desde uma perspetiva negativa, a vulgarização (jamais totalmente explícita) da sexualidade, da linguagem e do ativismo neopagão das New Ages (com, por exemplo, as suas meditações do vácuo). Todavia, a realidade é que também é nesse mundo em que vivemos, e também é nele que a graça Deus (no sentido primeiro de “amor comunicado”, mas também de “humor”) se faz presente a “virar o bico ao prego” e a chamar-nos a ver a fragrância do bem em todas as realidades que dão vida à vida.
No caso deste filme, há algumas realidades que, tocando aspetos vitais da vida cristã, gostaria de salientar. Em primeiro lugar, devemos construir continuamente a nossa identidade pessoal mediante as nossas decisões. Depois, a nossa vida é sempre mais doce e madura após termos passado por dificuldades. Em terceiro lugar, a franqueza comporta sempre um vivermos numa fraqueza diante de quem amamos que é, paradoxalmente, das maiores fortalezas do amor. Em quarto lugar, que ninguém deve julgar a pessoa de ninguém, mas apenas as suas ações e, mesmo assim, apenas apoiando-se no amor que não recusa ir até “ao fim do mundo” para a ajudar. Enfim, a nossa história nunca está terminada apenas porque um capítulo dela chegou ao fim.
Em resumo, ousaria dizer que quase tudo neste filme (pensado para quem atravessou o pior do Covid-19?), pode ser entendido como um sinal a apontar para os diversos filões de esperança das nossas vidas que, mesmo quando não sabemos, são reunidos numa Esperança (Deus) que amoriza o nosso coração para o Seu serviço.
(* EUA, 2022; dirigido por Aaron Nee e Adam Nee, com Sandra Bullock; Channing Tatum; Daniel Radcliffe; Da’Vine Joy Randolph e Brad Pitt)