O Cinema visto pela Teologia (21): o filme “Turning Red”

Uma leitura do filme “Turning Red – Estranhamente Vermelho” *

Por Alexandre Freire Duarte

Uma das vantagens de ser pai de um menino com três anos, é ele chamar-me a atenção para o que, muitas vezes, me passaria ao lado. Em concreto: uns cartazes com um grande bicharoco vermelho. Mas ainda bem que ele não me permitiu ignorar tais placares, pois acabei por ir ver, a casa de uma pessoa amiga e com ele, os 15 minutos iniciais do filme, a que tais cartazes faziam referência (depois o meu filhote foi brincar com os gatos daquela, que, coitados, só não ficaram vermelhos porque não calhou).

De tempo a tempo, são produzidos filmes para os mais jovens que possuem uma mensagem muito mais estimulante do que muitas obras de cinema pensadas para um público com mais juventude conservada. Com “Estranhamente vermelho” estamos, justamente, ante um desses filmes. Sim: é poderoso a nível visual, mas não tão belo quanto isso; é dotado de uma história divertida e cativante, mas não arrebatadora; tem papéis bem definidos a nível psicológico, mas caricaturados; etc. Mas tudo isto também é o que permite que o eco do essencial encontre espaço no nosso respirar córdico.

Teologicamente falando, é de salientar que a mensagem pode, em alguns momentos, ser problemática. Ao contrário da mundividência das personagens do filme, a lógica cristã não passa pelo “deixa-te andar pelo mundo”, mas pelo, amando e servindo, transformar esse mundo ferido de modo a, com ele, se ter mais e mais Vida em Jesus. Por outro lado, o slogan “o meu panda, a minha escolha” soa demasiado a palavras de ordem associadas à ideologia abortiva.

Dito isto, não se pode senão valorizar a atenta e cuidadosa referência à compaixão, à curiosidade, à colaboração e ao “não perder as estribeiras”, para se encontrar um equilíbrio, por vezes difícil, entre: a verdade e os segredos; os amigos e a família; as maravilhas e os sustos de todas as transformações intensas (como as da puberdade, mas não só); a determinação e a ternura; os sonhos e a realidade; e, enfim, a real identidade própria (que não pode ser construída numa mera reação a quem quer que seja) e a que (pensamos que) querem(os) de nós.

Outra mensagem relevante, é a que diz que é totalmente errado desejarmos tomar decisões quando as emoções andam a explodir por todos os lados. Nessas condições, o “ego” da estrita autonomia cheia de bravata tolda a razão e, assim e possivelmente revoltando-se contra quem está mais perto de nós (os nossos pais, esposos, colegas de trabalho, filhos, educadores. etc.), não vemos, neles, aquela ajuda que nos é essencial para reconhecermos que toda a decisão comporta novos deveres. Deveres, dos quais não devemos sair, mas nos quais devemos submergir.

Enfim, também foi belo ver, como pai que sou, como o filme humaniza as exigências que todos nós devemos colocar aos nossos filhos. Não como prisões desejadas por antagonistas, mas como apoios espirituais francos e honestos (e queridos por amor no meio do apoio inter-geracional e comunitário) para a vida e a vida em Cristo Jesus.

(* EUA, 2022; Dirigido por Domee Shi, com a voz de Rosalie Chiang, Sandra Oh, Ava Morse, Hyein Park)