
Por Secretariado Diocesano da Liturgia
“Toda a celebração da Vigília Pascal se desenrola de noite, de tal modo que não comece antes de ser noite ou termine antes do amanhecer de domingo” (Normas Gerais sobre o Ano Litúrgico, n. 21).
Esta regra é de interpretação estrita. Os abusos e costumes contrários, que por vezes se verificam, como antecipar a hora da celebração da Vigília Pascal para as horas a que habitualmente se celebram no sábado à tarde as missas antecipadas do domingo, não podem admitir-se. As razões aduzidas por alguns para antecipar a Vigília Pascal, como por exemplo, a “insegurança pública, não costumam a invocar-se no caso da noite de Natal ou para outros encontros que se realizam de noite” (Carta circular da Congregação para o Culto Divino sobre a Preparação e celebração das festas pascais, de 16/1/1988).
Se a norma é clara, é, contudo, pertinente recordá-la. Porque este é um dos casos em que a prática nem sempre corresponde à doutrina. Os motivos desta desordem são principalmente dois:
– a inércia derivada da situação anterior à reforma de Pio XII em que a disciplina vigente do jejum eucarístico levara a antecipar a celebração vigiliar para o princípio da manhã, alterando o carácter do sábado santo (“sábado de aleluia”!).
– a multiplicação dos casos em que o mesmo sacerdote tem o encargo pastoral de duas ou mais paróquias e – à custa de um notável sacrifício pessoal e de alguma “traição” à norma – não deseja privar nenhuma comunidade desta que é a mais importante celebração do ano litúrgico.
Infelizmente, esta segunda causa começa a tornar-se comum e não se pode julgar fora de um enquadramento pastoral mais amplo e de uma análise das várias circunstâncias. É caso, porém, para nos interrogarmos se será razoável prosseguir por essa via à custa de um preço tão alto: a saúde dos presbíteros celebrantes e a verdade da celebração. Inclinámo-nos antes para que haja menos vigílias (e simulacros de vigília) para haver mais Vigília: antes sentir a privação do que servir ilusões.
Mas mais do que lembrar a norma litúrgica, gostaríamos de a motivar. Porquê celebrar a Vigília de noite?
– Porque é essa a sua “natureza”. De facto, aqui “vigília” tem o sentido originário de “velada noturna” e não o de “véspera da festa” que posteriormente adquiriu. É essa a suposição dos textos que insistentemente falam da “noite” que enquadra a “mãe de todas as Vigílias”. A noite em que os hebreus esperavam a “passagem” do Senhor que os libertaria da escravidão foi sempre observada em cada ano como um memorial. Ora essa era a figura da futura páscoa, a noite da verdadeira libertação em que Cristo, “despedaçando as cadeias da morte, ressuscitou vitorioso do túmulo” (Precónio).
– Porque a verdade dos sinais assim o exige: de facto, esta celebração valoriza de modo fortíssimo os sinais da luz e, nomeadamente, da passagem da obscuridade à luz como símbolo da passagem da morte à vida e do pecado à graça.
– A integridade do Tríduo exige que se respeite o carácter próprio do Sábado Santo, dia em que a Igreja se abstém totalmente da celebração eucarística vivendo no recolhimento da oração, meditação e jejum o mistério da ausência do Senhor representado pela sua sepultura.
– A Vigília Pascal não é uma celebração como as outras e não a podemos nivelar pelo denominador comum das celebrações pré-festivas da tarde de sábado. Na verdade ela é o cume e a charneira de todo o ano litúrgico e isso deve transparecer também no carácter extraordinário das circunstâncias em que se celebra e da própria estrutura da celebração: Ritos iniciais, Liturgia da Palavra, Liturgia dos Sacramentos Pascais (Batismo – Confirmação e Eucaristia). Não anulemos o sentido e a eficácia não só pedagógica mas também sacramental da “solenidade” (de “solum in anno”).