Tribuna do Leitor: sobre o texto “Cristãos na vida pública: opções e vivências”

Sobre o texto “Cristãos na vida pública: opções e vivências”, publicado no número de 23 de março, recebemos a seguinte missiva, que transcrevemos integralmente:

 

Prezado Senhor Padre Manuel Correia Fernandes, Ilustre Diretor da VP:

Cordiais e respeitosos cumprimentos.

Não lhe escrevo para lhe dizer o que penso da sua orientação da VP.

Elogios tópicos não interessam nem fazem o meu género; os méritos objetivos de uma longa dedicação de diretor conlevam certamente da obrigação de um múnus desempenhado que terá certamente as suas próprias consolações pessoais; por fim, e – muito sinceramente –, creio também que V.ª Rev.ª não estaria interessado em ouvir-me e facilmente o interpretaria como uma impertinência. Pelo menos, julgo, de facto, que não é matéria para aqui, para um simples email.

São demasiado frequentes os engulhos que o semanário institucional da diocese permite a um qualquer católico, com fé pessoal na Igreja, exigência crítica e inserido na dinâmica eclesial. Para abreviar, recordo a leviandade mal explicada de há uns anos, com o anúncio do Prof. Rui Nunes para a Academia Pontifícia da Vida… Mas os factos opinativos estranhos são relativamente frequentes…

Dispensando-me de os correr, recolho um último da VP de 23 de Março corrente:

Faz o Senhor Diretor referências, e bem, a toda uma panóplia de «intelectuais emblemáticos» da cultura portuguesa, e à pergunta «E a política?» remete para o espaço “7 Margens” para apresentar o exemplo/testemunho de José Manuel Pureza, deputado do bloco de esquerda, que lhe merece as considerações de 50% do espaço do texto. Ora, Senhor Diretor, não basta citar o Papa Francisco e ser citado pelo 7 Margens para receber o estatuto de destaque e exemplaridade em matéria de empenhamento cristão na política! V.ª Rev.ª sabe muito bem que esse senhor ex-deputado se empenhou encarniçadamente na Assembleia da República na aprovação de uma lei do aborto mais permissiva, de uma lei da eutanásia, e de uma lei dita de “procriação medicamente assistida” que permite manipulação e destruição de embriões. Isto é: tudo o contrário do que o magistério da Igreja ensina desde sempre e é doutrina pacífica! Ora quantos se empenharam, até mesmo no Parlamento, para, com competência técnica e sem abdicar de princípios essenciais, evitar os precipícios destas leis, sentem-se ao ler este tipo de prosas gozados e apunhalados pelas costas! Não é aqui lugar para apelar para o argumento dos pluralismos. Esquerda ou Direita, nada importa, tudo são opções tão naturais como o nosso corpo, que tem membros à direita e  à esquerda. Mas quando alguma família política, à direita ou à esquerda, exorbita do direito natural e do direito revelado, é estranho que um jornal católico jogue em ambiguidades…

Com consideração, renova os seus cumprimentos,

Pedro Vilas Boas Tavares

 

ND – Com todo o respeito pela opinião do nosso assinante, por quem nos move a admiração pelo trabalho, investigação, convicções e serviço eclesial, permito-me lembrar que o meu escrito não significa aprovação do teor das leis da Assembleia da República, nem o debate sobre a relação entre convicção e ação política. E lembro o que escrevi nesse mesmo texto: “Também é tradicional estabelecer a ligação entre o ser católico ou cristão e os partidos de direita: muitos deles foram fundados por personalidades oriundas dos movimentos de Igreja, designadamente da Ação Católica. O sentido político essencial é a promoção e a procura da justiça social e dos equilíbrios no relacionamento humano. Podem variar as formas de a encontrar e de por ela trabalhar.” 

A minha reflexão apenas faz notar o carácter afirmativo pessoal do escrito do ex-deputado, a sua formação e consonância (não refiro a prática) com as declarações do Papa Francisco sobre a pertinências da ação política. O julgamento ético ou moral, a congruência ou incongruência entre opinião e ação deverão  ser objeto de quem os formula e fundamenta.