
Por Secretariado Diocesano da Liturgia
Os “mandamentos da Santa Madre Igreja” ainda existem (a edição portuguesa do Catecismo da Igreja Católica chama-lhes «preceitos»: nn. 2041-2043, 2048). São a pedagogia do amor e do zelo de uma mãe preocupada com o bem dos seus filhos e disposta a preservar-lhes a saúde espiritual, impondo-lhes um mínimo indispensável de disciplina de vida. Entre outros preceitos, a Igreja continua a recordar, aos fiéis que tenham atingido a idade da discrição, a obrigação da confissão, ao menos uma vez por ano, dos pecados graves (CDC, cân. 989). E aos seus filhos já iniciados na Santíssima Eucaristia pede-lhes igualmente que comunguem ao menos uma vez por ano, durante o tempo pascal (CDC. cân. 920).
Evidentemente, o cristão bem formado, não se contenta só com isso, nem tampouco precisa da “muleta” do preceito para viver ao ritmo da Páscoa, celebrando a Reconciliação e participando da mesa do Senhor com mais assiduidade. Mas a Igreja não é uma sociedade de perfeitos. Com o preceito vai ao encontro dos mais pequeninos e débeis na fé e na vida cristã: é por eles que a mãe é mais solícita.
Aos mandamentos da Igreja correspondem as obrigações respetivas de pastores e fiéis. Assim, e para falarmos apenas da prática da penitência, os fiéis têm direito a ser atendidos de confissão e os pastores estão obrigados “a providenciar para que sejam ouvidas as confissões dos fiéis que lhes estão confiados e que de modo razoável peçam para se confessar, a fim de que aos mesmos se ofereça a oportunidade de se confessarem individualmente em dias e horas que lhes sejam convenientes” (CDC, cân. 986). As cautelas e cuidados que a pandemia continua a recomendar, não anulam nem o direito nem o correspondente dever.
A Quaresma é um tempo de graça em que todos os cristãos, interpelados pela Palavra de Deus, são chamados a entrar num caminho de conversão que os leve a celebrar de espírito renovado a Páscoa da Salvação. Este é, por isso, o tempo por excelência da Penitência: a exercitar como virtude e a celebrar como Sacramento. A história da Quaresma confirma isso mesmo, apontando-nos o sentido da grande Tradição da Igreja: desde a celebração de Quarta-Feira de Cinzas até à Quinta-Feira Santa – popularmente dita “de Endoenças” (de “Indulgentiam”) –, a Igreja mantém vivo este apelo à reconciliação. Por isso, este é também um tempo em que o direito dos fiéis à celebração deste Sacramento – e a correspondente obrigação dos pastores – mais urge.
Com um alto sentido da sua responsabilidade pastoral, por toda a parte os párocos organizam durante a Quaresma um serviço extraordinário de “Confissões”, normalmente ao nível das respetivas vigararias. Esta é uma ocasião em que a entreajuda sacerdotal melhor funciona, dando aos fiéis um testemunho edificante de unidade e cooperação. E a Igreja pede a todos os sacerdotes, dotados com as devidas faculdades, religiosos ou seculares, que cooperem com os párocos e capelães neste serviço pastoral de primeiríssima importância: faz-lhes bem… O próprio Papa dá o exemplo, descendo a confessar na basílica de S. Pedro.
Nos principais centros urbanos importa, além disso, assegurar um serviço de atendimento, tanto quanto possível, permanente. Alguma articulação entre as diversas igrejas e capelas tornaria isso bem mais exequível. Em todas deveria estar afixado, em lugar visível, o calendário e horário previsto para a celebração do Sacramento da Penitência, se possível incluindo informações das igrejas vizinhas. E convém pensar nos horários mais convenientes para os fiéis, atendendo às diversas condições de vida e ritmos de trabalho.
É importante também que os cristãos reconheçam a multiplicada generosidade dos seus pastores, que se desdobram num esforço extenuante para os servir no ministério da reconciliação. Uma forma de demonstrar esse reconhecimento consistirá em, durante algum tempo, não os importunarem com solicitações menos urgentes e prioritárias: a Quaresma, por exemplo, não é o tempo mais indicado para tratar de processos de casamento… E ninguém deve estranhar a ausência do pároco em tantas reuniões de “gestão ordinária” dos diversos serviços paroquiais que até podem funcionar sem ele como seria sempre desejável numa igreja menos clerical e mais sinodal. E talvez todos ganhassem em, durante a Quaresma, substituir algumas dessas reuniões por encontros de oração que sempre deveriam ter o seu fulcro na escuta da Palavra em comunidade: “Se o Senhor não edificar a casa…”. O sínodo é, sobretudo, para viver e celebrar.