Os ministros da Igreja em questão

Nos últimos decénios tem havido uma questão com os ministros da Igreja. Na segunda metade do século passado, um grande número abandonou o ministério, as candidaturas à ordenação diminuíram drasticamente.

Por Jorge Teixeira da Cunha 

Muitos congressos tentaram perceber o que se passa com os ministros ordenados, o último dos quais teve lugar na semana passada no Vaticano. Há, pois, um mal-estar na Igreja a respeito dos ministros. A crise dos abusos apenas veio agravar esta situação e colocá-la mais ao rubro. O povo de Deus olha com apreensão, não só para os presbíteros que servem as suas comunidades, mas é justo dizer que olha também para os bispos que presidem às dioceses. Que se passa com os ministros da Igreja? Claro que não é fácil esclarecer esta questão.

De um modo geral, podemos dizer que o ministério da Igreja está num período de mudança de época. Os presbíteros e bispos que conhecemos foram escolhidos, formados e ordenados nos seminários que a Igreja fundou na sequência do Concílio de Trento (1545-1563). Foi uma forma de recrutar e formar ministros que teve um grande impacto na qualidade da sua vida acção durante este longo período. Mas muitas coisas aconteceram, entretanto, e essa forma de proceder exige ser repensada.

A vivência da fé na cultura de hoje leva-nos a pensar a vocação sacerdotal de outro modo. No passado, a Igreja viu-se como alguém que chama e configura os ministros à sua imagem institucional. Hoje, a nosso ver, é necessário pôr a questão de outro modo. Mais do que uma instituição, a Igreja é um sinal e um carisma. Ela mesma existe por vocação. Por isso, não é só a Igreja que desperta vocações, mas são as vocações que despertam a Igreja. Sem vocações não há Igreja, pois a realidade é vocação. Deus cria a realidade por vocação para o seu Filho. Se a Igreja é vocação, não parece ter sentido dizer que escasseiam vocações. Sem vocação, simplesmente não há Igreja.

Dentro destas perspetivas abre-se um grande espaço para pensar de novo a figura do ministério nas comunidades cristãs.

Sendo a vocação tão originária como a fé, coloca-se a questão do caminho para identificar quem deve presidir à comunidade e dar corpo a Jesus Cristo, aquele que é a origem de toda a vocação, de todo o serviço e de toda a presidência. A ter sentido ainda falar de sacerdócio, isso há-de ser neste contexto em que o cristianismo inova a atitude religiosa de uma forma radical. O sacerdócio de que se fala no Novo Testamento não é para entender à luz do fenómeno religioso comum, mas à luz do serviço criador e redentor de Cristo. É questão de ontologia e não de religiosidade.

Como serão os ministros do futuro? Isso estamos todos à procura. Uma coisa parece certa: não serão tanto à imagem da instituição, como fundadores dela. Serão chamados pelo coração e pelo carisma, mais do que pela função e pela profissão. Muitas possibilidades sobre a sua figura concreta, sobre o seu modo de vida, sobre a sua formação.

Nesta complexa situação, não admira que muitos tenham perdido o pé e muitos outros estejam a viver dificuldades evidentes. Continua significativo o número dos que abandonam, pois o que lhe e dado viver é pessoalmente insuportável. As circunstâncias que encontram não correspondem à preparação que tiveram e às expectativas que cultivaram. Outros encontram na rigidez institucional ou na carreira eclesiástica uma triste forma de perseverar.

O Papa Francisco fez uma alocução ao Congresso promovido pela Congregação dos Bispos onde diz que o sacerdócio é, antes de tudo, uma questão pessoal e baptismal. Nada mais acertado. A seguir a isso define uma serie de vizinhanças que o presbítero tem de cultivar: a Deus, ao seu bispo, aos outros presbíteros, ao povo. Bom caminho para esperar o porvir de Deus.