
20 de Fevereiro de 2022
Indicação das leituras
Leitura do Primeiro Livro de Samuel 1 Sam 26,2.7-9.12-13.22-23
«Ele entregou-te hoje nas minhas mãos, e eu não quis atentar contra o ungido do Senhor».
Salmo Responsorial Salmo 102 (103)
O Senhor é clemente e cheio de compaixão
Leitura da Primeira Epístola do apóstolo São Paulo aos Coríntios 1 Cor 15, 45-49
«Assim como trazemos em nós a imagem do homem terreno, procuremos também trazer em nós a imagem do homem celeste».
Aclamação ao Evangelho Jo 13, 34
Aleluia.
Dou-vos um mandamento novo, diz o Senhor:
amai-vos uns aos outros, como Eu vos amei.
Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas Lc 6, 27-38
«Amai os vossos inimigos, fazei bem aos que vos odeiam, abençoai os que vos amaldiçoam, orai por aqueles que vos injuriam».
«Sede misericordiosos, como o vosso Pai é misericordioso».
«Dai e dar-se-vos-á: deitar-vos-ão no regaço uma boa medida, calcada, sacudida, a transbordar».
Viver a Palavra
No discurso da planície, Jesus continua a convidar os discípulos a olhar para o alto, apontando a medida alta da santidade. Depois de proclamar as Bem-aventuranças, Jesus continua a surpreender os seus ouvintes com a novidade das Suas palavras. É fácil imaginar o espanto dos ouvintes de Jesus, pois cada um de nós, que já conhecemos e escutámos estas palavras repetidas vezes, continuamos a sentir a radicalidade que elas comportam, pois, uma forma de agir como Jesus propõe rompe com os normais critérios de justiça onde aquele que ofende, agride ou insulta ao invés de ser admoestado e punido, parece encontrar espaço para prosseguir a sua obra.
Porém, Jesus desafia-nos a superar a lógica humana de vingança diante do mal que nos infligem. É verdade, que humanamente diante do mal e das ofensas que nos dirigem, somos tentados a reagir instintivamente, procurando infligir não um mal proporcional, mas tantas vezes um mal ainda maior para que o nosso desejo de justiça fique satisfeito. Deste modo, o Povo de Israel tinha estabelecido a Lei de Talião que pressupunha um critério de justiça humana que previa que ao mal causado a alguém se infligisse uma pena proporcional. Contudo, Jesus quer conduzir-nos ainda mais longe.
Jesus aponta-nos o caminho que devemos percorrer na relação com os outros e não apenas na relação com aqueles que nos são próximos e que nos provocam situações de bem-estar e contentamento. Jesus, conhecendo bem a nossa realidade humana, sabe que as relações muitas vezes se perturbam por tantas contrariedades e surgem os conflitos e as contendas. Sendo assim, como deve ser a nossa relação com quem nos faz mal, com quem nos ofende ou nos pede emprestado?
As palavras de Jesus não são de modo nenhum um atentado contra a justiça, mas o convite a viver as relações humanas numa nova lógica de perdão, misericórdia e compaixão. Na verdade, o Evangelho deste Domingo encontra-se ligado à primeira leitura do primeiro livro de Samuel na temática da relação com inimigo. David, perseguido por Saul, no deserto de Zif, tem a possibilidade de atentar contra a vida de Saul, mas poupa-o porque é o ungido do Senhor. Desafiado por Abisaí a cravar a lança em Saul, David recorda que o respeito pelo ungido do Senhor deve transcender a lógica da inimizade.
Jesus eleva este desafio de superar a inimizade pelo amor à plenitude e convida-nos a viver a misericórdia como lugar de transformação das relações: «sede misericordiosos, como o vosso Pai é misericordioso». Aprender a amar e a perdoar só é possível colocando o nosso olhar no Deus do amor e da misericórdia, afinando o nosso coração de olhos fixos no coração de Deus. Assim como vemos tantas vezes afinar uma guitarra ouvindo o som de uma outra afinada, também nós, somos convidados a afinar o nosso coração pela mais bela melodia que brota do coração de Deus.
Na verdade, amar o inimigo tem uma valência não tanto afectiva mas efectiva e concreta. Trata-se precisamente de realizar gestos concretos e actos de amor que respondam de modo novo a gestos de ódio e difamação, rompendo com a espiral de mal e violência. Mas isto exige uma disciplina do coração e uma ascese da vontade. Por isso, é impossível amar os inimigos sem rezar por eles, pois na oração vejo o inimigo à luz do mistério de Deus, olho para ele e reconheço nele a imagem e semelhança de Deus. Já não olho para o outro como um inimigo ou adversário mas como um irmão e, por isso, sou desafiado a percorrer o caminho que propõe S. Paulo: acolher na minha humanidade a imagem do homem celeste que Jesus imprime na nossa existência. Deste modo, poderemos proclamar com a nossa vida o que cantamos no salmo: «O Senhor é clemente e cheio de compaixão».
Homiliário patrístico
Dos Sermões de São Cesário de Arles, bispo (Séc. VI)
Bem-aventurados os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia. Dulcíssima é esta palavra «misericórdia», irmãos caríssimos; mas se é tão doce o nome, quanto mais não o será a própria realidade? Todos os homens querem misericórdia, mas infelizmente nem todos procedem de modo a merecê-la; todos a desejam receber, mas poucos a querem praticar.
Ó homem, com que coragem ousas pedir o que recusas dar aos outros? Quem deseja alcançar misericórdia no Céu, deve praticá-la neste mundo. Por conseguinte, irmãos caríssimos, já que todos desejamos misericórdia, façamos dela a nossa advogada neste mundo para que no outro ela nos liberte.
Que espécie de gente somos nós? Quando Deus dá, queremos receber; mas quando pede, não queremos dar. Quando um pobre tem fome, é Cristo que passa necessidade, como Ele próprio disse: Tive fome e não Me destes de comer. Não desprezes, portanto, a miséria dos pobres, se queres esperar confiadamente o perdão dos pecados. Agora, irmãos, Cristo passa fome; é Ele que Se digna passar fome e sede na pessoa de todos os pobres; e restitui no Céu o que recebe cá na terra.
Pergunto-vos, irmãos: Que quereis ou que buscais quando vindes à Igreja? Certamente quereis e buscais misericórdia. Dai, portanto, a misericórdia terrena e recebereis a misericórdia celeste. O pobre pede-te a ti e tu pedes a Deus; ele pede um pouco de pão, tu pedes a vida eterna. Dá ao pobre, para mereceres receber de Cristo. Ouve as suas palavras: Dai e recebereis.
Indicações litúrgico-pastorais
- No dia 20 de Fevereiro celebra-se a memória litúrgica dos Pastorinhos de Fátima: S. Francisco e S. Jacinta Marto. Sabemos como a devoção a Nossa Senhora de Fátima e a veneração dos santos pastorinhos que viram Nossa Senhora está muito enraizada na fé dos portugueses e, por isso, este Domingo pode ser uma oportunidade para um tempo de oração e formação inspirada na mensagem das aparições de Fátima e no testemunho dos pastorinhos. Na catequese, a descoberta e a aprofundamento da vida dos santos, de modo particular destas duas crianças que têm a idade de muitos dos nossos catequizandos, é muito importante, porque faz incarnar no tempo e na história a mensagem evangélica e testemunha a vocação à santidade a que todos somos chamados pelo baptismo e que se deve viver e concretizar em qualquer idade e condição de vida.
- Para os leitores: na primeira leitura deve ter-se em atenção os nomes próprios que apresentam maior dificuldade na pronunciação: «Zif», «Abisaí» e «Abner». Para uma eficaz proclamação, deve ser tido em conta o tom narrativo da leitura e a respectiva articulação entre o discurso directo e o restante texto. A mensagem da segunda leitura está construída pelo contraponto entre «O primeiro homem, Adão» e «o último Adão». A proclamação desta leitura deve ter em atenção esta construção literária e exige uma leitura cuidada para que este contraste nos conduza à conclusão da leitura que sintetiza a mensagem do texto: «e assim como trouxemos em nós a imagem do homem terreno, traremos também em nós a imagem do homem celeste».
Sugestões de cânticos
Entrada: Eu confio, Senhor, na vossa bondade – F. Silva (CN 286); Salmo Responsorial: O Senhor é clemente e compassivo Sl 102 (103) – M. Luís (SRML, p. 293-294); Aclamação ao Evangelho: Aleluia | Dou-vos um mandamento novo, diz o Senhor – M. Faria (CN 52); Ofertório: Onde há caridade verdadeira – F. Silva (NRMS 122); Comunhão: Cantarei ao Senhor pelos bens que me deu – A. Cartageno (CEC II, p. 47-48 | LAU, 210); Pós-Comunhão: Dai graças ao Senhor – F. Santos (CN 335); Final: Exulta de alegria – M. Carneiro (CN 471).