
São antigas as análises da realidade a partir das teorias da conspiração. Os primeiros cristãos já foram vítimas delas: um dos motivos das terríveis perseguições que tantos mártires fizeram reside na acusação, difundida no Império Romano, de que aqueles constituíam uma sociedade secreta que visava substituir a velha ordem sociopolítica da pax romana por uma outra, com critérios «estranhos».
Ao longo da história nunca a humanidade se conseguiu libertar dessas ideias de complot. Só que, agora, são potenciadas e difundidas pelas redes sociais em termos nunca vistos. E causam danos.
Recentemente, duas se destacaram. Em 2017, surgiu a teoria QAnon segundo a qual, um conjunto de pedófilos ter-se-ia infiltrado no âmago da Administração americana para derrubar Trump e instaurar uma rede mundial de tráfico de crianças para fins sexuais. Daí o ataque ao Congresso: na mente dos seus autores estaria a ideia de vida ou de morte da moralidade, pois se Trump deixasse a Casa Branca venceria o satanismo.
A outra sentimo-la mais por perto: conceber as vacinas contra a Covid-19 a partir de fantasiosas imaginações em termos conspirativos. Segundo ela, as vacinas corresponderiam a um projeto de Bill Gates de implantar um microchip em cada pessoa e, assim, controla-la informaticamente.
Estas obsessões patológicas veem a história não como a resultante da liberdade humana, tutelada por Deus, mas como uma série ou sequência de conjuras malignas. E fazem carreira em malévolos e frágeis. Mesmo dentro da Igreja…
Este é um triste fenómeno em aumento, já que as redes sociais lhe fornecem um especial oxigénio: ocultamento do sujeito que faz as afirmações iniciais, fácil difusão, linguagem com revestimentos «científicos», plausibilidade, correspondência ao imaginário doentio das épocas de dificuldades.
Um cristão, porém, não pode seguir por aí. Antes de mais, porque acredita que é o Senhor quem conduz a história e não um qualquer satânico. Depois, porque aplica a inteligência à realidade e confronta essa análise com a Palavra de Deus de modo a obter critérios de atuação. E ainda porque faz da verdade e da liberdade os grandes carris por onde se move.
Ajudemos o mundo a libertar-se. Porque, como dizia alguém, no seu típico bom humor, só há dois géneros de pessoas: os religiosos e os supersticiosos. E, neste caso, ou-ou.
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