Domingo XXVII do Tempo Comum

Foto: Rui Saraiva

3 de Outubro de 2021

 

Indicação das leituras

Leitura do Livro do Génesis                                                                               Gen 2, 18-24

«Não é bom que o homem esteja só: vou dar-lhe uma auxiliar semelhante a ele»

 

Salmo Responsorial                                Salmo 127 (128)

O Senhor nos abençoe em toda a nossa vida.

 

Leitura da Epístola aos Hebreus                                                                         Hebr 2,9-11

«Aquele que santifica e os que são santificados procedem todos de um só. Por isso, não Se envergonha de lhes chamar irmãos.».

 

Aclamação ao Evangelho           1 Jo 4,12

Se nos amamos uns aos outros, Deus permanece em nós,

e o seu amor em nós é perfeito.

 

Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Marcos                                    Mc 10,2-16

«Pode um homem repudiar a sua mulher?».

«Não separe o homem o que Deus uniu».

«Quem não acolher o reino de Deus como uma criança, não entrará nele».

 

Viver a Palavra

Um grupo de fariseus aproxima-se de Jesus e dirigem-se a Ele com a intenção de O colocar à prova. No Evangelho são muitos os que se abeiram de Jesus e são tão variadas as motivações que os colocam a caminho. Dois mil anos depois, também nós integramos a multidão imensa de homens e mulheres que percorrem os trilhos da história e sentem a necessidade de se encaminharem para Jesus. Mas quais são as motivações que invadem o nosso coração? Não basta ir ao encontro de Jesus para O encontrar! É necessário criar a docilidade e a disponibilidade para fazer do encontro com Ele um lugar decisivo de transformação e de conversão. O Evangelho do Amor e da Alegria é uma proposta que reclama uma adesão livre para inscrever a nossa vida no horizonte de liberdade e de graça que o Ressuscitado na força do Espírito nos oferece.

Os fariseus trazem a Jesus uma questão muito concreta e para a qual conheciam bem a resposta. Qualquer fariseu, conhecedor da Lei de Moisés, sabia que era lícito «um homem repudiar a sua mulher», passando-lhe um certificado de divórcio. Contudo, esta permissão, segundo Jesus, é apenas sinal da dureza de coração e insere-se na longa e paciente pedagogia de Deus. A doença que Jesus mais teme é esta dureza de coração e, por isso, afirma algo de absolutamente desconcertante: nem toda a lei é divina, nem sempre é um reflexo da vontade de Deus e, por vezes, é mesmo o reflexo da dureza do nosso coração e da intransigência dos nossos esquemas e preconceitos.

O ponto de partida da reflexão cristã não é uma moral ou uma doutrina, mas o encontro único, íntimo e decisivo com Jesus Cristo. A iniciativa é sempre de Deus e do Seu amor superabundante. A fé não nasce do «pode ou não pode», do «lícito ou ilícito», mas do amor misericordioso de Deus que nos faz redescobrir a nossa verdadeira identidade e missão. Aqui não reside nenhum laxismo ou relativismo mas a certeza de que o ponto de partida é a iniciativa amorosa de Deus que reclama a nossa adesão livre e este encontro transformador rasga horizontes novos que nos impelem a percorrer com ousadia e coragem a estrada inaudita da conversão.

Jesus recorda que a nossa vida se inscreve no sonho primordial e original de Deus que nos criou à Sua imagem e semelhança na complementaridade e alteridade que cria harmonia e gera comunhão. Por isso, o problema não é a licitude ou ilicitude do repúdio, mas o convite a manter vivo o sonho primordial e original. Jesus reafirma o projecto do Criador e recorda a missão de cuidar do mundo fazendo dele um lugar de unidade.

Jesus vai ainda mais longe e declara a igualdade entre homem e mulher no compromisso de uma construção conjunta na busca da realização e felicidade, na fidelidade ao projecto criador: «quem repudiar a sua mulher e casar com outra, comete adultério contra a primeira. E se a mulher repudiar o seu marido e casar com outro, comete adultério». O caminho é exigente mas é possível. É uma proposta de realização e felicidade que não consente exclusão ou discriminação, mas reclama acolhimento e integração.

Acolhendo as crianças que os discípulos teimavam em afastar, Jesus recorda que o acolhimento é marca fundamental daqueles que O querem seguir. A Igreja do século XXI, a Igreja sinodal da escuta e da comunhão, só poderá realizar a sua missão como mãe acolhedora que, antes de qualquer distinção ou imposição, abre os braços da sua misericórdia e recorda que com um coração de criança acolhemos o Reino novo que Jesus veio inaugurar porque somos capazes de abrir o coração à vida nova que Deus faz despontar diante de nós.

 

Homiliário patrístico

Dos Sermões de São Leão Magno, papa (Séc. V)

Diz o Senhor: Se a vossa justiça não superar a dos escribas e fariseus, não entrareis no reino dos Céus. Mas esta justiça só será superior à deles, se a misericórdia triunfar sobre o juízo. E que há de mais justo e digno para a criatura, feita à imagem e semelhança de Deus, do que imitar o seu Criador, que estabeleceu o perdão dos pecados como princípio de renovação e santificação dos crentes, a fim de que, evitando a severidade do castigo e suprimindo todo o suplício, o pecador recupere a inocência e o fim do pecado seja a origem da virtude.

Assim a justiça cristã pode ser superior à dos escribas e fariseus, não abolindo a Lei mas rejeitando a sua interpretação carnal. Quem ama a Deus contenta-se com agradar Àquele que ama, porque não se pode esperar maior recompensa do que o mesmo amor; e o amor vem de Deus, porque o próprio Deus é amor. A alma pura e santa sente-se tão feliz por estar cheia deste amor que não deseja qualquer outra felicidade. É de facto uma grande verdade o que diz o Senhor: Onde está o teu tesouro, aí está o teu coração. Que é o tesouro do homem senão a acumulação dos frutos do seu trabalho? Cada um recolhe o que tiver semeado: conforme o trabalho assim será o proveito; e onde se concentra a alegria do êxito aí se prende a solicitude do coração. Mas como há muitas espécies de riqueza e diversas causas de alegria, o tesouro de cada um é a satisfação do próprio desejo; e se este se limita aos bens terrenos, tal satisfação não pode trazer a felicidade, mas a infelicidade. Pelo contrário, aqueles que aspiram às coisas do Céu e não às da terra, nem estão presos aos bens que passam mas aos bens eternos, alcançarão uma riqueza incorruptível.

 

Indicações litúrgico-pastorais

  1. A Liturgia da Palavra convida a reflectir sobre o matrimónio e a família como projecto do Criador elevado por Jesus à dignidade de sacramento. Neste contexto poderá ser importante apresentar a beleza e a alegria do amor que se vive nas famílias e a tarefa exigente de viver a vocação matrimonial como serviço à Igreja e ao mundo. Tendo em conta as situações de fragilidade da vida matrimonial e familiar, será importante uma palavra de acolhimento à luz das indicações oferecidas pela Amoris Laetitia que convidam a acompanhar, discernir e acompanhar as situações de fragilidade.

 

  1. Para os leitores: na primeira leitura deve haver especial atenção nas duas frases em discurso directo e na proclamação dos verbos que as introduzem. O leitor deve estar atento à respiração e às pausas nas frases e orações curtas, para uma leitura articulada e fluente do texto. Na segunda leitura, as frases longas com diferentes orações exigem não só o respeito pela pontuação, como uma preparação acurada das pausas e respirações de acordo com o conteúdo e mensagem do texto.

 

Sugestões de cânticos:

Entrada: Levanto os meus olhos para os montes – J. Santos (NRMS 70); Salmo Responsorial: O Senhor nos abençoe em toda a nossa vida (Sl 127) – M. Luís (SRML, p. 248-249); Aclamação ao Evangelho: Aleluia | Se nos amamos uns aos outros –  J. Berthier (CN 45); Ofertório: Por tuas mãos foram criados – F. Santos (CN 811); Comunhão: Formamos um só Corpo – C. Silva (CN 501); Pós-Comunhão: Dai graças ao Senhor – F. Santos (CN 811); Final: O Senhor vos conserve sempre unidos – F. Silva (NRMS 26| IC, p. 774).