Mensagem (129): Livros

Hugo de São Vítor, célebre intelectual e místico do século XII, dizia que Deus entregou três livros à humanidade, a partir dos quais O possa conhecer: a natureza, a Bíblia e Jesus Cristo. E dizia mais: se muitos não podem «ler» o segundo e o terceiro livros, todos são capazes de interpretar o primeiro.

A ideia de que a natureza é um livro aberto que nos fala de Deus é muito anterior. É recorrente no génio de Santo Agostinho que tem passagens tais como: “Dá voltas pela criação inteira. Por toda a parte, ela te gritará: Deus fez-me!”. Ou então, aquela exaltação da beleza: “Nós vemos as coisas porque são. Mas elas são porque Deus as vê”. Ver, aqui, remete para a origem: as obras existem porque Deus as fez. E fê-las belas porque Ele é a suma Beleza.

Esta é a conceção cristã da ecologia. Nela estão pressupostos algumas afirmações implícitas: a natureza é criatura de Deus e não qualquer «deusa»; a mensagem bíblica desmitologizou a terra; esta foi confiada ao homem para a “cultivar” e proteger; a pessoa, radicalmente superior ao mundo, tem obrigações para com ele. Os «direitos» do mundo advêm dos deveres da pessoa.

Porém, uma certa visão excêntrica e pagã está, hoje, a invadir o tema. É o caso da «deep ecology» que vê a pessoa como mais um simples filamento na teia da vida, em pé de igualdade e importância com todo o resto, desde os vírus até aos seres mais aperfeiçoados. Semelhante devaneio é perigosíssimo: aniquila a dignidade humana e mata o próprio sentido de respeito pela natureza. É que, se tudo são filamentos de igual valor, acaba por prevalecer a lei do mais forte. E este usará o mais fraco a seu bel-prazer: o forte usa e abusa do fraco, como se vê na atual crise ecológica.

A mensagem da fé é muito sensível ao respeito pela criação. Por isso, desde há muito, a ética cristã insurge-se contra as agressões à casa comum e o Papa Francisco constitui-se na mais credível voz de defesa de um mundo profanado. Instaurar a crise ecológica é duplo pecado: atenta diretamente contra o plano de quem criou o mundo e acaba por prejudicar os pobres, pois são sempre os mais atingidos quando a natureza se «revolta».

A terra inteira está cheia da glória de Deus” (Is 6, 3). Respeitemo-la «religiosamente». Mas esse respeito começa quando a protegemos. Não quando a «adoramos», pois a adoração só a tributamos a Deus, seu autor.

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