
Com a publicação da Carta Apostólica “Patris Corde” (com coração de pai), o Papa Francisco propôs, ao lembrar os 150 anos da declaração como Padroeiro da Igreja católica feita por Pio IX, um ano dedicado a José, figura do Evangelho que dá raiz genealógica à pessoa humana de Jesus, inserindo-o na descendência de David.
Por M. Correia Fernandes
É curioso como os dois evangelistas Mateus e Lucas lhe conferem esta centralidade genealógica. Mateus afirma logo no capítulo primeiro que “Jacob gerou José, esposo de Maria, da qual nasceu Jesus, que se chama o Cristo”, iniciando de forma descendente a genealogia em Adão.
Lucas, porém, só inscreve a genealogia no cap. terceiro, após o “evangelho de infância” e no quadro do Batismo de Cristo: “Jesus, ao começar tinha cerca de trinta anos, sendo, como se supunha, filho de José”, seguindo-se a genealogia em forma ascendente, até Adão e até Deus.
Neste quadro Francisco acentua a sua dimensão de figura providencial ao escrever “A grandeza de São José consiste no facto de ter sido o esposo de Maria e o pai de Jesus, cirando São João Crisóstomo, ao afirmar «colocou-se inteiramente ao serviço do plano salvífico», e Paulo VI ao afirmar que fez da sua vida um serviço, um sacrifício, ao mistério da encarnação e à conjunta missão redentora, e “em ter usado da autoridade legal que detinha sobre a Sagrada Família para lhe fazer dom total de si mesmo, da sua vida, do seu trabalho; em ter convertido a sua vocação humana ao amor doméstico na oblação sobre-humana de si mesmo, do seu coração e de todas as capacidades no amor colocado ao serviço do Messias nascido na sua casa».
É para realizar uma maior compreensão desta ação de José que a Editora Paulus acaba de publicar três volumes:
1.O primeiro, com o título “São José, acompanhai os meus passos! – Pedido de proteção ao Guardião das nossas famílias” é constituído por textos breves de figuras da Igreja sobre a missão de José, bem como um conjunto de preces que podem orientar a oração das pessoas e a oração das comunidades cristãs em torno do exemplo e proteção de S. José. Este pequeno volume de 117 páginas é ilustrado com imagens interpretativas da vida de José, algumas de autores clássicos, como Rafael (O casamento da Virgem, 1504) e Gerard Seghers, O Sonho de São José, c. 1630), e outros de artistas populares que traduzem a interpretação da piedade cristã sobre a sua figura, presença e episódios bíblicos como a fuga para o Egito. O volume sugere também numerosos orações inspiradas na piedade popular.
2.O segundo volume intitula-se “Ide a José – O mistério de S. José na vida da Igreja”, é constituído por um conjunto de sete textos organizados e por Pe. David Palatino e que “foram escritos por alunos do Pontifício Colégio Português em Roma”, buscando uma reflexão teológica como contributo para a reflexão das comunidades em Portugal. No seu estudo analisa o testemunho de José nos escritos do Novo Testamento.
Despois desta reflexão introdutória, um primeiro estudo (de Pedro Daniel Marques) analisa a construção da figura de S. José na tradição cristã através das suas fontes, propondo e percorrendo as raízes bíblicas, patrísticas, arqueológicas e mesmo apócrifas.
Um segundo estudo (de Pedro Santos) analisa a presença de S. José na Liturgia Romana, as festas que lhe são dedicadas, na missa e ofício, e a justificação teológica, litúrgica e devocional das mesmas.
Um terceiro estudo (de Ricardo Emanuel Mamede Cardoso) analisa o percurso de S. José na história da devoção e da espiritualidade, desde os primeiros séculos até aos Papas mais recentes, bem como uma interpretação dos símbolos ligados ao santo, como o anel nupcial, a vara que floriu e o vestuário que lhe é associado.
O quarto estudo (de António Estêvão Fernandes) analisa aspetos da iconografia de S. José na História da Salvação, os acontecimentos ligados ao nascimento e infância de Jesus, salientando a “nova relevância de S. José”. Este texto encontra-se ilustrado com um conjunto de obras pictóricas, apresentadas a preto e branco, que transmitem interpretações de diversas épocas da figura e missão de S. José, desde Giotto a El Greco e Murillo. Dá-nos conta da abundância e espiritualidade transmitida por etas obras.
O quinto estudo (de Bruno Ferreira) debruça-se sobre “A expressão musical da Igreja Católica sobre São José, sugerida numa pintura de Caravaggio, “descanso na fuga para o Egito” (1597) em que uma figura angélica interpreta uma pauta musical apresentada pelo próprio S. José. Apresenta depois um conjunto de composições, desde o canto gregoriano à polifonia moderna, com várias missas em sua honra (como uma do conhecido Flor Peeters para canto e órgão), concluindo com uma referência à música devocional portuguesa.
O sexto estudo (de José Miguel Cardoso) é dedicado à elaboração teológica sobre a figura de S. José, num percurso ao longo dos tempos e terminando com uma reflexão sobre “José diante da Pós-modernidade”, concluindo que “os mistérios de Jesus e Maria compreendem-se melhor a partir de José”.
Todos os textos são acompanhados de orientações bibliográficas adequadas. Os autores são sacerdotes de várias dioceses (entre as quais e do Porto, com Bruno Ferreira) que fazem a sua formação no Colégio português de Roma, em diversas áreas da investigação teológica.
Deve saudar-se esta iniciativa, que confere a S. José a uma centralidade na pastoral da Igreja que claramente fica mais fundamentada e enriquecida com este contributo.
3.O terceiro volume apresentado pela Paulus, com o título “Todos os caminhos vão dar a tua Casa”, reúne testemunhos de cinquenta e cinco personalidades nacionais sobre a devoção a Maria. O livro tem a presentação de Marcelo Rebelo de Sousa e os testemunhos são coligidos pelo Pe. João Luís Silva, assistente do Secretariado do Movimento da Mensagem de Fátima da Arquidiocese de Évora. A inspiração destes textos tem origem nesta sua afirmação: “A segurança está nos braços da Mãe! Escutei variadíssimas vezes nas centenas de testemunhos.”
Marcelo Rebelo de Sousa estabelece ligação de Maria com a realidade de Fátima, a presença dos diversos Papas, a preparação da Jornada Mundial da Juventude, dando “público relevo a essa realidade iniludível do Portugal 2021”.
Este conjunto de publicações associa assim a relevância de Maria à relevância de José, através do testemunho de figuras conhecidas de mundos diversos (Escola, comunicação social, música, teatro, escrita e arte) em testemunhos diversos mas marcados pelo mesmo sentido da espiritualidade e da dimensão humanizante e universalizante da fé religiosa.