
“A União, sendo também de estados, é principalmente de povos”
Álvaro Amaro, eurodeputado
O presente na Europa é, deve ser, o que as circunstâncias de momento exigem: concretizar a Europa social. Há 4 anos, eram os 20 princípios do Pilar Europeu dos Direitos Sociais, desde a proteção no trabalho à erradicação da pobreza, à exclusão social e à desigualdade. A Cimeira do Porto, em 7 e 8 deste mês, celebrou o compromisso entre os Estados Membros de consolidar metas e medidas do plano de ação para realizar aqueles princípios até 2030.
Por Ernesto Campos
Em tempos recentes, a União Europeia suscita algumas perplexidades. Em política externa, quando se trata de conflito com países terceiros difícil tem sido alcançar consenso. Quanto à atribuição de fundos de apoio a alguns Estados Membros, é notória a resistência à unanimidade de votos necessária para o efeito. Em matéria de saúde, na luta contra a pandemia viu-se cada Estado isolar-se nas suas fronteiras e impor restrições e quarentenas a vizinhos e estranhos. Até no negócio das vacinas, a União Europeia ficou a perder comparativamente com outros quanto à aquisição em quantidade suficiente.
No que respeita ao desenvolvimento e realização dos direitos sociais, o pensamento europeu tem sido que cada Estado oriente livremente a sua política interna em função do seu crescimento económico, apenas tomando como referência o modelo social europeu. Resultado: 92 milhões de pobres europeus, 700 mil pessoas sem abrigo. Diminuir a pobreza em 15 milhões, segundo o compromisso do Porto, é pouco. Mas, não será tolerável que uns Estados cumpram a sua parte desta meta e outros não, por muito que se respeite a liberdade política de cada um. A desigualdade entre os povos não é menos injusta do que a desigualdade no interior de cada povo.
Os pais da Europa (Schumann, Spaak, Jean Monet) sonharam uma Europa em paz, unida e próspera. A paz e a prosperidade sim, unida é que ainda não. Neste presente pouco unido a dita União está, todavia, a pensar também no seu futuro. Uma Conferência sobre o Futuro da Europa (no Dia da Europa 9/5) propõe-se encarar inovações óbvias, como por exemplo integração quanto à saúde, porque afinal a pandemia não conhece fronteiras, ou uma política climática europeia que se possa negociar impondo regras mais avançadas, mercê da vantagem tecnológica. Outras perspetivas inovadoras vão no sentido politicamente mais ousado: fala-se de um Ministro dos Negócios Estrangeiros Europeu para potenciar a capacidade de ação no plano global perante competidores políticos como a China e a Rússia; fala-se de um Ministro das Finanças para controlo do peso das dívidas que recaem sobre as gerações futuras.
Dir-se-ia que tais verbalizações configuram um velho e oculto propósito de Estados Unidos da Europa ou de Federação Europeia. No passado foi o vínculo dos interesses económicos europeus para garantir que a guerra fosse impensável e impossível (Shuman, 1950). Depois, avançou-se sem ferir as identidades nacionais em quatro liberdades – circulação de mercadorias, serviços, capitais e pessoas. E moeda única. E direitos sociais manchados, todavia, de injustas misérias. Outros avanços de sentido unitivo e solidário serão bem-vindos: são sempre forma de, garantindo a justiça, assegurar a paz.
Não se esqueça, pois, que os povos que habitam os Estados são pátrias, isto é, pessoas conscientes da sua identidade pessoal e nacional. Era o que De Gaulle já preconizava, “Europa sim, mas Europa das pátrias”.