Mensagem (111): O trono

Quando a barba começou a despontar, a mãe ofereceu-lhe um fio de ouro com uma cruz. E forneceu a justificação: um homem deve trazer sempre ao peito a cruz de Nosso Senhor.

Era habitual, de facto, o uso da cruz. Nem sempre por motivos de fé explícita, pois não era de excluir uma certa ostentação. Aliás, o estilo de vida do seu portador, por vezes, não seria muito cristão. O que arrancou ao povo este dito conhecido: “A cruz nos peitos e o diabo nos feitos”.

A cruz tornou-se um elemento cultural que exprime uma convicção partilhada pelo grande grupo. Identifica uma forma de ver o mundo e a realidade a partir do Crucificado e da história da salvação a que Ele deu o impulso definitivo. Passou a encimar as torres das igrejas e o alto dos montes, tornou-se elemento urbanístico nas praças e rotundas, participou nos dramas de quem se debatia nos hospitais e nos sonhos dos que se elevavam nas escolas, uniu-se às famílias e estas concederam-lhe um lugar de honra na sua casa.

Todas? No passado, quase todas. No presente, muito poucas. A cruz está a ser expulsa. Primeiro, quiseram retirá-la dos lugares públicos com o pretexto de ofender outras visões religiosas e culturais. E mesmo as famílias cristãs acabaram por a banir. Quase sempre, por «esquecimento». O que não é bom sintoma, pois só esquecemos o que não nos interessa.

Perante a cruz não há indiferença: ou se ama ou se odeia. S. Paulo já o tinha pressentido: “A cruz é loucura para os que se perdem; mas, para os que se salvam, para nós, é força de Deus” (1 Cor 1, 18). Força que, ao simbolizar o que Jesus realizou em nosso benefício, congrega em si os valores que mais aspiramos: o bem, o amor, a entrega, a dádiva, a salvação.

A cruz merece um lugar de destaque nas nossas vidas e nas nossas casas. Um lugar de honra. Nos cruzeiros públicos, chama a atenção o seu rico pedestal. É uma linguagem: exprime o «trono», o destaque que se concede à cruz. Nas processionais, quase sempre são os resplendores à volta do corpo do Crucificado que «falam» desse trono de luz.

Não pode haver um trono para a cruz, nas nossas casas? Ela é o mais poderoso instrumento para congregar na unidade da fé e na harmonia dos corações a pluralidade dos que constituem a família. É antítese do egoísmo, indiferença, divisão, atitudes mais diabólicas que cristãs. Por isso diz o povo: “Foge o diabo da cruz como o morcego da luz”.

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