Da campanha à eleição presidencial

Foto: Bruno Colaço/Correio da Manhã

Por M. Correia Fernandes

1.Chegados que somos ao resultado das eleições presidenciais, importa parar um pouco para refletir. O primeiro dado é o excesso de candidatos, e a cara de cera da permanência no boletim de voto de um candidato que não o era. Mas passemos isso adiante. O segundo dado é a elevada abstenção (60,5, idêntica à percentagem obtida pelo vencedor). Mesmo sabendo que neste número de encontra muita gente inexistente, porque os cadernos eleitorais não foram atualizados, apenas votaram no candidato vencedor 2,5 milhões, ou seja menos de um quarto da população portuguesa. Tudo isto aconteceu em tempo de pandemia, em dia de confinamento, e parece que o andamento do processo foi normal, o que é de saudar.

Já aqui manifestamos a opinião de que não se justificava uma tão grande movimentação de meios, de debates, de tempos de antenas, de discussões acaloradas e repetitivas, e mesmo de declarações ofensivas para a eleição de um Presidente sem poderes executivos. Será caso isolado em toda a Europa, em que o único Presidente com poderes executivos é o da França. Todos os outros são escolhidos por colégios eleitorais, salvo as monarquias constitucionais (Espanha e países nórdicos: Holanda, Bélgica, Luxemburgo, Holanda, Suécia, Dinamarca).

A segunda reflexão a fazer, observada a temática das intervenções, foi que se falou de tudo e se diluiu a presença da missão e poderes do Presidente e mais se afirmaram as quezílias e  lutas partidárias, a discussão das formas de governação, dos programas para o Governo, das reivindicações salariais. Raramente ouvíamos falar do exercício da missão presidencial, mas  sempre vinham a lume ações do governo, as questões da economia, da saúde, da educação, do ambiente. Raramente se falou dos poderes em que o Presidente pode agir por sua iniciativa: o de chefe supremo das forças Armadas e o de poder dissolver a Assembleia da República.

Este tipo de atuações mostra visivelmente que a intencionalidade da presença de tão elevado número de candidatos não tinha por fim a eleição Presidencial mas a possibilidade de trazer pra a praça pública o debate político, a procura da influência e visibilidade de algumas forças (ou fraquezas) na opinião pública. Veio ao de cima igualmente o não entendimento entre as forças políticas e os seus candidatos: a preponderância da figura de Marcelo Rebelo de Sousa sobrepôs-se, embora não declaradamente, ao campo político, procurando os demais candidatos desvalorizar a sua figura para contraporem a sua.

As sondagens, mais ou menos sérias, foram aparecendo. Aliás, o que importa nas sondagens não é que sejam sérias e rigorosas, mas que o pareçam. Em política, como na informação mediática, o que parece pretende-se que seja. No entanto, importa saudar a última sondagem da Universidade Católica, publicada na semana anterior, que ordenou os candidatos, com pequenas diferenças, tal como figuraram no resultado final. (ver quadro)

2. Resultados previsíveis e previstos. Era uma questão de ligeiras diferenças: todos sabíamos que o vencedor seria Marcelo Rebelo de Sousa e com maioria absoluta. A referência a uma segunda volta que o discurso lírico de alguns candidatos procurou explorar era apenas um ente de razão (ou de sem-razão). A percentagem obtida por Marcelo Rebelo de Sousa (60,7%) foi a segunda maior de todas as eleições presidenciais desde 1976, apenas superada pela de Mário Soares em 1991 (70,35%).

No discurso após os resultados, para além do dito batido de que será o Presidente de todos os portugueses, Marcelo acentuou aspetos essenciais para a ação governativa nos próximos tempos, com apelos ao governo e à oposição. Evidenciando que o mais urgente é vencer a pandemia, recomendou ao governo uma atuação “forte, sustentada e credível” e à oposição uma alternativa fundamentada, sem “desesperos e aventuras”. E sempre as boas intenções de recuperar a economia, fazer boa gestão dos fundos europeus, recriar o equilíbrio social. Importa o esforço da estabilidade política, apesar da dialética política entre direita e esquerda. Essencialmente importa o equilíbrio das relações. A superação da crise não se faz com a agudização dos conflitos, mas com o esforço de cooperação pelos critérios do bem comum. Podíamos afirmar que a mensagem do desenvolvimento e da construção social e humana não pode ser “chega”, mas fazer “mais e melhor”. Haverá alguns partidos para isso, e nosso apelo é esse: Trabalhe-se mais e melhor, construa-se com equilíbrio humano e ambiental; respeitem-se os direitos e estimulem-se os deveres; superem-se os interesses mesquinhos e erga-se o desígnio da (re)construção nacional!