
Por M. Correia Fernandes
Cumprem-se em 19 de março de 2021 cinco anos sobre a publicação da Exortação Apostólica “Amoris Laetitia” (A alegria do amor) do Papa Francisco. Na circunstância desta efeméride, o Papa propôs em 27 de dezembro de 2020, Festa da Sagrada Família, um ano dedicado à família, reavivando as linhas de pensamento propostas nessa Exortação. É uma iniciativa que podemos aproximar de outra proposta do Papa: um ano dedicado a S. José, na linha da Carta Apostólica “Patris Corde” (Com coração de Pai).
A exortação “Amoris Laetitia” é um extenso documento, cuja leitura pode proporcionar muitas reflexões, tanto de fundamentação teológica e história como de formas de atuação prática nos contextos do pensamento atual, segundo dados psicológicos e sociológicos, e da inserção dos ideais salvíficos nos contextos da vida social de hoje. Recomenda-se, pois, a sua (re)leitura.
Com efeito, o documento papal parte da leitura dos textos e do espírito bíblico e evangélico, com uma análise atualizada das propostas da Escritura, e particularmente das diretivas paulinas sobre o tema, que analisa e explicita segundo análise exegética, fundada no alcance das palavras e atualizada nos conceitos. Edifica uma análise da realidade sociológica e dos desafios que se colocam às famílias, à sua situação atual na leitura daquela data, ressaltando os perigos do individualismo e das condições sociais do trabalho, as sensibilidades propostas por modas ocasionais, não esquecendo as “questões doutrinais, bioéticas e morais”, a influência do provisório e do efémero, a tendência para a queda demográfica que se acentua nas sociedades ocidentais, os filhos nascidos fora do matrimónio, sem esquecer os casos de problemas de deficiência física ou psicológica que constituem dificuldades para o equilíbrio familiar. Há ainda referência às questões fundamentais da educação, salientando a ação mútua do homem e da mulher na construção e no equilíbrio familiar, acrescentando uma reflexão sobre as chamadas ideologias de género. Aqui se aborda “o desafio da educação” e do esforço de e ajuda na recuperação das famílias feridas.
Neste contexto Francisco propõe uma reflexão sobre o sentido da vocação na família, segundo a proposta de Jesus, conforme o modelo de “aliança de amor e fidelidade vivida pela Sagrada Família de Nazaré”, desenvolvendo um estudo exegético e interpretativo sobre a mensagem do cap. 13 da Carta aos Coríntios, na explicitação das dinâmicas do Amor. Valoriza o amor apaixonado, a importância das emoções, a dimensão erótica do amor e a alegria da geração, da presença e educação dos filhos, e o sentido da fecundidade, da ternura, da compaixão, da presença mútua e da empatia no relacionamento e na cultura do encontro.
Em perspectivas pastorais, propõe “Anunciar hoje o Evangelho da família”, valorizar e cuidar a preparação para o matrimónio, iluminar as crises, as angústias e as perplexidades; dedica um capítulo às questões da educação, apelando a um “realismo paciente”, a uma conveniente educação da sexualidade e ao sentido da transmissão da fé. O último capítulo é consagrado à espiritualidade conjugal e familiar, como forma de “amor exclusivo e libertador”, numa “espiritualidade da solicitude, da consolação e do estímulo”. Conclui com uma prece à Sagrada Família.
Talvez hoje novos parâmetros se pudessem impor, mas a amplitude temática desta mensagem e a sua segura fundamentação científica e teológica mantêm clara atualidade e pertinência nos dias que correm.
Por isso esta decisão de proclamar e promover um ano dedicado à família deve servir como mais uma proposta de dinamismo eclesial e pastoral para a nossa diocese e para a Igreja em Portugal.
Acresce que esta proposta é acompanhada pelo teor da Carta Apostólica “Patris Corde” (Com coração de Pai), datada de 8 de dezembro de 2020, e dedicada por ocasião do 150.º da Declaração de S. José como Padroeiro Universal da Igreja. Esta Declaração fora proferida pelo Papa Pio XI, no mesmo dia de 1870. Assim se associa a figura tutelar do esposo de Maria à proposta deste ano dedicado à Família. São José é apresentado como “Pai na ternura”, “Pai na obediência”, “Pai no acolhimento”, “Pai com coragem criativa”, “Pai trabalhador” e “Pai na sombra”, mas exemplar na naturalidade, dedicação e eficácia da sua presença e da sua ação. Esta mensagem completa assim o sentido da proclamação do Ano dedicado à Família.
A sua efetivação torna-se um novo estímulo para a dinâmica pastoral do Secretariado Diocesano da Família, a quem saudamos pelo seu empenhamento exemplar na valorização das famílias da nossa diocese.