“Virgem protetora dos navegadores e dos cativos”

Por João Alves Dias

Era bem moço quando aprendi a «Rianxeira», canção tradicional galega da «Ria de Arousa»: “A Virxe de Guadalupe/ Cando veu para Rianxo…”. Mais tarde, visitei, em Vila Real, uma igreja gótica, dedicada à Senhora de Guadalupe. Em Águas Santas, a sua capela está no coração das terras e gentes da Maia. No verão, em Vila do Bispo, estive na ermida romano-gótica da “Virgem protetora dos navegadores e dos cativos” onde o Infante D. Henrique assistia à missa quando estava na Quinta da Raposeira, entre Lagos e o cabo de S. Vicente. Soube que noutras terras, incluindo os Açores, há várias capelas em sua honra.

A origem desta invocação mariana está no «Real Mosteiro de Nossa Senhora de Guadalupe», a uns 100 km. de  Cáceres, Espanha.

Segundo a tradição, perpetuada nas pinturas do «claustro mudéjar», a imagem da autoria de S. Lucas foi oferecida pelo papa Gregório Magno a São Leandro, arcebispo de Sevilha. Em 714, com a invasão árabe, uns clérigos, em fuga, enterraram-na nas margens do rio Guadalupe. Encontrada, miraculosamente por um pastor, após a «Reconquista Cristã», foi entronizada numa pequena ermida e recebeu o nome de Guadalupe que significa «rio escondido».

A história começa com Afonso XI, rei de Castela, quando, em 1330, rezou nessa capela pedindo a proteção de Virgem para a batalha do Salado onde – com o nosso Afonso IV, «O Bravo» devido a essa batalha – derrotou os Mouros. Em ação de graças, declarou o mosteiro património real. E, em 1389, entregou-o à Ordem de São Jerónimo.

No século XV, recebeu grande impulso dos «Reis Católicos».

À entrada do mosteiro, somos acolhidos pelo busto de “Isabela la Católica” que em 1464, ainda infanta, o visitou, quando aí se deslocou para acordar o casamento com Afonso V, de Portugal, que acabou por recusar. Lá voltou para agradecer: em 1477, a vitória na batalha de Toro – de má memória para nós e onde se notabilizou D. Duarte de Almeida, «O Decepado»; em 1492 a rendição de Granada. Na Semana Santa de 1486, Cristóvão Colombo veio aí pedir-lhe o financiamento da sua “viagem às Índias”. E a rainha, em 1492, daí, mandou-lhe entregar duas caravelas. O navegador, que também se encomendou à Virgem antes da viagem, lá regressou após a descoberta da América, depois de ter dado o nome de Guadalupe a uma das primeiras ilhas que descobriu nas Caraíbas.

Em 1835, os Jerónimos foram expulsos pelo Governo Espanhol e, em 1908, foi confiado aos Franciscanos que o revitalizaram até aos nossos dias.

Em 1910, Pio X consagrou a Virgem de Guadalupe como «Padroeira da América Latina»; com festa litúrgica no dia 12 de dezembro.

O mosteiro, mescla harmoniosa de gótico, mudéjar, renascença, barroco e neoclássico, foi construído entre os séculos XIII e XVIII. Nele, “o «gótico» faz-se espiritual e luz nas suas arcadas, janelas, portadas e pináculos e funde-se com o «mudéjar» na airosa rosácea sobre o frontispício”. Em 1993, foi reconhecido como «Património da Humanidade».