Mulheres do Porto: As carquejeiras

Por Joaquim Armindo

Desde o século XIX existiam, no Porto, as “Carquejeiras”. As carquejeiras do Porto eram mulheres que para “comer o pão de cada dia”, para si e seus filhos, subiam a calçada ingreme entre os Guindais e as Fontainhas, levando às costas, nesta via dolorosa, de 220 metros, molhos de carqueja pesando cerca de 50 Kg e depois as distribuíam pelos fogões das padarias e casas particulares, servindo como acendalhas, para coser pão ou aquecer as casas dos senhores do Porto, mais endinheirados. A carqueja chegava em barcos e nos Guindais era desembarcada e colocada às costas das carquejeiras – mulheres e tantas vezes crianças -, que lá iam pela Calçada da Corticeira – agora chamada Calçada da Carquejeira, como homenagem a estas mulheres -, até ao destino fosse a Boavista, fosse o Carvalhido ou tantos lugares. Durou este trabalho um século, tendo terminado em 1960. Agora uma associação, constituída para tal, inaugurou uma estátua evocativa da Carquejeira, nas Fontainhas. Pagavam a elas quantas viagens fossem capazes de fazer e pela distância, indo de 1$50 a 15$00.

A Carquejeira não tinha segurança social, nem postos de atendimento de saúde, e o que conheciam desde meninas, era acartar a carga, o mais vezes possível, fazer o jantar e nem davam conta que o homem as engravidava. Subindo a escarpa, quase não se viam os olhos, mas elas lá iam, perante o rizo da rapaziada, que não muitas vezes as apalpava, elas fugiam, era uma calçada com muitas curvas. Apesar do seu dia a dia duro e desumano, também iam às igrejas da cidade pedir pelos seus, e que tivessem muito trabalho. Era descalças que faziam o seu trabalho, não lhes restava mais que confiar e ter fé em Deus, que lhes desse muita saúde para calcorrear o maior número de vezes, para ganhar mais dinheiro, que era tão pouco que mal dava para a comida; os medicamentos eram as ervas que arranjavam e estudar nem sabiam o que era.

É bom que saibamos que existiam mulheres destas, autênticas santas e virgens. Santas porque se davam como sacrifício para que as suas famílias tivessem pão e sopa, os seus filhos crescessem, e virgens porque se davam completamente à causa das suas famílias, sem pretenderem nada para elas. O sacrifício que tantos de nós não conhecemos. Pois, aqui fica!