O Cinema visto pela Teologia (14): um leitura do filme “Posto de combate”

Por Alexandre Freire Duarte

(“Posto de combate”, EUA, 2020; dirigido por Rod Lurie, Scott Eastwood, Caleb Landry Jones e Orlando Bloom)

Com a lenta reabertura dos cinemas, alguns filmes de qualidade assinalável recomeçam a ser projetados e a merecerem a nossa atenção. Um destes é “Posto de combate”. Baseado em factos verídicos, trata-se de um filme de guerra sem cosméticos nem glorificações. Pesado; sim. Chocante; sim. Com soldados a falarem e agirem como soldados; sim. Simplesmente a guerra tal como ela é.

Esta é uma obra intensa, apelativa e até inspiradora, que mostra a lentidão aborrecida da vida e a rapidez aterrorizante da morte, suscitando emoções impressivas e desassossegadoras. A fotografia é aliciante. Os atores aceitaram diluir as suas personalidades individuais para representarem a comum banalidade da existência. A direção entreteça, com coerência e mesmo no meio da exposição do caos, pequenos eventos aparentemente soltos. A história é um clássico: o tentar (sobre)viver em circunstâncias dificílimas ante a insensibilidade cega e despótica de decisores impessoais movidos por motivações inexplicavelmente insensatas.

Teologicamente falando, “Posto de combate” mostra que há valores e “valores”; crenças e “crenças”; sacrifícios e “sacrifícios”. Pena que nos nossos dias, cheios de falsas narrativas que ainda nos levarão a ter que acreditar que 2 mais 2 são 5, estejam a querer inculcar-nos sentimentos de culpa pelo que deveria ser motivo de apreço. Apreço por tais valores, crenças e sacrifícios que levam, tal como é patente neste filme, a que, ultimamente, se estime o viver a morrer ao amor-próprio, não para tirar a vida aos demais, mas para a protegerem. Algo que, justamente e por detrás do que já foi dito no parágrafo anterior, aponta para a relevância de sermos bem cientes da rapidez da vida e da lentidão da morte.

Nesta obra, o amor, a fraternidade e a compaixão não são despicientes. São a “cola” de todas as relações humanas patentes entre os soldados que nos são dados a conhecer com algum detalhe. Mas não só. Aqueles três valores, elevados a hábitos pela prática convivencial, também são o “propulsor” de todos os atos de notável coragem auto-sacrificial que tiveram que ser realizados em consequência de falhas estruturais. Falhas que transformaram os dias de tais soldados num “vale de dor” que, por falta de tempo para se processar tal dor, nem pôde ser vivido como um “vale de lágrimas”.

A nossa vida, recorda-nos este filme, é incerta; a morte pode chegar sem nenhum aviso; e o amor – única realidade que mune essa vida de sentido – não é somente candura, antes algo tremendamente exigente e desafiante. Tudo o que mascare estes factos é pernicioso, pois faz-nos ignorar que estamos num constante “combate” espiritual contra aquilo que, em nós, nos impede a nossa autenticidade e nos leva a revoltar contra os demais e, pior ainda, contra Deus. Não nos deixemos enganar quanto a isto. Só assim olharão para nós, cristãos, e, porventura contra as suas expectativas e nem que apenas no silêncio das suas consciências, dirão, não só, “vede como se amam”, mas, sobretudo, “vede como nos amam”.