De Coimbra à Sicília…

Por João Alves Dias

Os «Santos Populares» aproximam-se. O Porto festeja S. João mas reza a Santo António. Para celebrar este santo taumaturgo, convido-vos para uma “Viagem Medieval”, guiados por Gonçalo Cadilhe, nas asas do seu livro “Nos Passos de Santo António”.

Iniciamos em Coimbra, então capital de Portugal que, havia pouco tempo (1179), fora reconhecido como Reino pelo papa Alexandre III na bula «Manifestis Probatum». Mais precisamente, encontramo-nos no mosteiro dos Cónegos Regrantes de Santo Agostinho – Mosteiro de Santa Cruz- o centro intelectual do Reino em cuja capela jaz o nosso primeiro rei, D. Afonso Henriques, falecido em 1185.

Em 1212, deu entrada neste mosteiro o jovem Fernando, de Lisboa. Aqui, viveu e adquiriu uma bagagem humanista e teológica que levou, mais tarde (1230), o papa Gregório IX a declará-lo «Arca do Testamento». Em 1220, já presbítero, impressionado com os restos mortais de cinco franciscanos assassinados em Marraquexe, decidiu fazer-se franciscano para continuar a missão dos «Mártires de Marrocos». Passou a viver no eremitério de Santo Antão dos Olivais, com o nome de Frei António.

Daqui partimos em direção a Lisboa para visitar a casa – hoje Museu de Santo António – onde terá nascido Fernando, talvez em 1192, filho de Martim Afonso. Daí, seguimos para Algeciras. Tomamos o barco que, pelo Estreito de Gibraltar, nos levará a Ceuta. Passando por Tânger, vamos até Marraquexe. Este era o destino do jovem franciscano, mas, chegado a Marrocos, uma doença fê-lo regressar a Portugal. Porém, ao atravessar o estreito, um forte vendaval arrastou o barco até à Sicília.

Uma viagem de 1700 quilómetros, em navegação de cabotagem, terá obrigado o pequeno veleiro a aportar várias vezes na costa africana. Certamente o fez num dos maiores portos, a cidade Annaba. E o antigo «Cónego Regrante», agora humilde «frade menor» terá procurado vestígios da velha Hipona de que foi bispo o seu primeiro mestre e guia espiritual, Santo Agostinho, que aqui terá escrito duas das suas obras mais famosas – «Confissões» e «A Cidade de Deus» – e redigido a conhecida “Regra de Santo Agostinho” que regia o mosteiro de Santa Cruz de Coimbra.

Em Túnis, embarcamos no ferry que atravessará o Mediterrâneo e nos levará a Palermo, já na Sicília. A situação geográfica e a fertilidade dos solos, despertou o interesse de todos os povos da antiguidade desde os fenícios, passando pelos gregos, cartagineses, romanos, bizantinos e islâmicos. Reconquistada pelos cristãos, em 1220, Frederico II – «a maravilha do mundo» – elevou Palermo a capital do Império Sacro Romano – Germânico. Santo António, que aqui chegou em 1221, recuperou da doença contraída em África e encontrou os seus irmãos franciscanos. Mais tarde (1122) voltaria a esta cidade já como notável pregador. Não admira que, ainda hoje, perdure na Sicília uma grande devoção a Santo António. (Continua)