“Vai ficar tudo bem” e “Vamos voltar ao normal”. Queria que ficasse tudo bem, mas não queria que voltássemos ao normal. Não queria que voltássemos ao normal da vacuidade aliado à indiferença. Não queria que voltássemos ao normal das “pandemias” económicas. Não queria que voltássemos ao normal da rejeição ambiental, mesmo daquela que é realizada para ofuscar os olhos. Não queria que voltássemos ao normal da anormalidade social. Não queria que voltássemos ao normal de rejeitarmos as culturas dos povos. Não queria que voltássemos ao normal de liquidar a “ecologia espiritual”. Não queria que voltássemos ao normal da eleição de deuses-dinheiro. Não queria que voltássemos ao normal de que tantos ganham tanto dinheiro e outros morrem de fome. Não queria que voltássemos ao normal de esgrimir helicópteros de guerra, de povos contra povos. Não queria que voltássemos ao normal dos interesses mesquinhos. Não queria que voltássemos ao normal de uma sociedade exploradora dos sentimentos e afetividade das pessoas. A esse normal eu não quero voltar, mas a um normal onde cada homem e cada mulher sejam sujeitos da sua dignidade, como filhas e filhos de Deus. E mesmo que não queiram ser filhas e filhos de Deus, respeito-os, só que o são mesmo.
Eu queria que tudo ficasse bem! Onde não existissem “tronos”, nem sociais, nem políticos, nem culturais e nem religiosos, mas onde todas e todos pudéssemos ser e estar. E se, porventura, existisse a necessidade de “tronos”, eles fossem traduzidos pelo “bom samaritano” e pelo “cireneu”. Onde vivêssemos uma ecologia integral, o desenvolvimento das mulheres e dos homens, e onde a sustentabilidade fosse a reconciliação de cada um consigo, de cada um com o outro, de cada um com a Criação. Onde mil pensamentos florissem para descobrir como vamos de misericórdia e amor com os outros. Onde as religiões fossem as dinamizadoras da Paz e da Justiça, onde o diálogo quotidiano ecuménico tivesse por trave mestra “uma teologia em prol da paz, que, sem excluir a questão da verdade, mas sobretudo através da sua inclusão e da procura de uma resposta, encontre o caminho que conduz à paz e que, acima de tudo, detete e ajude a resolver os conflitos e focos de agitação” (Hans Küng, 1990).
Ficaríamos todos bem, na Esperança. E a nós cristãs e cristãos, cabe ser os portadores dessa Esperança, numa humanidade outra.
Hans, K. (1990). Projecto para Uma Ética Mundial. (I. Piaget, Ed.) (1st ed.). Lisboa.
Joaquim Armindo