O que é comungar – um texto do Secretariado da Liturgia

Por Secretariado Diocesano da Liturgia

Quando se fala de «Comunhão» e «comungar», habitualmente pensa-se na receção do Sacramento, no comer e beber correspondendo ao convite que Jesus fez e continua a fazer na Ceia da Instituição: «Tomai, todos, e comei»; «Tomai, todos, e bebei». Ao recordar-nos que «Comunhão» é um dos nomes deste Sacramento, a par de outros (começando por «Eucaristia», «Ceia do Senhor» e «Fração do Pão»), o Catecismo da Igreja Católica convida-nos a alargar o horizonte: a celebração integral – e não apenas um momento culminante da mesma – é toda ela «Comunhão» (CatIgCat 1329-1332). Sendo assim, ao falar em «Comunhão espiritual» temos de ampliar também o conceito e a prática. A belíssima oração de Santo Afonso de Ligório talvez precise de alargar horizontes…

Na teologia e na piedade, somos tributários de uma infeliz desintegração que, a partir da Idade Média, comprometeu a abordagem, compreensão e vivência do mistério eucarístico: por um lado, a afirmação convicta da presença real e permanente de Cristo no Santíssimo Sacramento; por outro a consciência de que, na celebração da Missa, se torna realmente presente o único, perfeito e definitivo Sacrifício da Redenção; e, por fim, a Comunhão ou receção das Sagradas Espécies. O Concílio de Trento ilustra bem esta abordagem fragmentada. Efetivamente, dedica à Eucaristia 3 documentos distintos e «estanques»: o primeiro, sobre o Sacramento (Sess. XIII de 11-10-1545); o segundo, com a doutrina relativa a Comunhão sob as duas espécies e das crianças (Sess. XXI de 16-07-1562); o terceiro sobre o Sacrifício da Missa (sess. XXII de 15-09-1562).

O II Concílio do Vaticano e a reforma litúrgica que se lhe seguiu quis promover numa visão unitária estas diversas dimensões, proporcionando uma vivência integrada do mistério eucarístico. Resta «passar» para a vida (compreensão, piedade…) este horizonte mais abrangente de «Comunhão»

Na catequese da infância ensinava-se, outrora, que «comungar é receber Jesus na hóstia consagrada». A apresentação estava tão correta como incompleta. Reportando-nos à história da teologia ocidental, nessa abordagem a participação sacramental na Eucaristia focava-se exclusivamente no Sacramento (perspetiva de presença real), ignorando que comungar é, simultânea e indissociavelmente, «participar» no Sacrifício de Cristo com tudo o que isso supõe e implica.

Por isso é que, para nós, fiéis do Rito Romano, se tornou indiferente receber o Sacramento com as espécies consagradas na celebração em que se participa (esta concreta atualização do memorial do Sacrifício da Redenção) ou recebê-la a partir do Sacrário. O Concílio recomendou vivamente «aquela mais perfeita participação na missa em que os fiéis, depois da comunhão do sacerdote, recebem, do mesmo sacrifício, o corpo do Senhor» (SC 55; CatIgCat 1388). Mas quem pensa, ao comungar, que está a participar no Sacrifício de Cristo que acaba de se tornar sacramentalmente presente no altar («todas as vezes que celebramos o memorial deste sacrifício realiza-se a obra da nossa redenção»: Oração sobre as Oblatas de Quinta-Feira Santa)? Quem pensa, ao comungar, que está a receber não apenas Cristo, mas também os frutos do seu Sacrifício redentor que «hoje aconteceu» de forma sacramental e incruenta (mas realíssima!) no altar da sua Igreja para que, precisamente possa «comungar» nessa oblação e associar-se generosamente a ela? Se se trata «apenas» de receber Jesus na hóstia consagrada, tanto vale a desta Missa como a que se conserva no Sacrário, consagrada noutra Missa qualquer…

Por outro lado (ou consequentemente), a Comunhão era e é vista numa perspetiva quase exclusivamente individual (para não dizer privada). Por isso os fiéis têm dificuldade em perceber o motivo pelo qual devem permanecer de pé depois de terem recebido as Sagradas Espécies. As normas litúrgicas dizem que se deve estar de pé durante a Comunhão. Não comungaram já? Não! Temos de explicar que ainda estão a comungar! Que 20, ou 200, ou milhares de receções do Sacramento na mesma celebração não perfazem 20, 200 ou milhares de «comunhões» mas uma só «Comunhão»; que se forem muitas, são divisão e não «comunhão». Sente-se quem precisar de o fazer, por razões de saúde; que quase todos permaneçam de pé durante a Comunhão em que, pela participação de muitos no mesmo Pão, todos se tornam um só Corpo em Cristo.