Nesta quarta-feira dia 15 de abril D. Manuel Linda, bispo do Porto, celebra 64 anos de vida. Uma data na qual também completa 2 anos da sua entrada solene na diocese do Porto. Recordamos aqui a sua homilia nesse dia 15 de abril de 2018:
“A intimidade com o Ressuscitado projecta-nos para o serviço dos irmãos”
É bela esta passagem do Evangelho: Aquele que congregou os Doze à sua volta, qual verdadeira família, e sofreu a sua fuga e abandono, parece que não consegue viver sem eles. Por isso, procura-os e recria a antiga convivialidade, como se nada tivesse acontecido. Para bem deles mesmos, já que, longe de Jesus, se debatem com o remorso, a incredulidade e o medo, somente superados pela oferta do encontro tu-a-tu. Como que a dizer, a eles e a nós, que a misericórdia de Deus não falha, mesmo quando entra a nossa traição mais vergonhosa. E que é Ele quem nos procura para dar um sentido empolgante à tentativa de recomeçarmos uma nova caminhada.
Lida em chave catequética, esta passagem evangélica diz-nos também que a «qualidade de vida», inaugurada pelo Ressuscitado, passa por aquelas dimensões que constituem o cerne do discipulado ou do ser Igreja: a evangelização, de que Jesus é Mestre, a ponto de conseguir a proeza de lhes abrir “o entendimento para compreenderem as Escrituras”; a liturgia, já que tudo se passa no contexto da cena dos “discípulos de Emaús que contaram […] como tinham reconhecido Jesus ao partir do pão”; e a caridade, pois o “Mestre e Senhor”, que já tinha dado o exemplo do lava-pés, agora chega ao ponto de se identificar com os esfomeados e implorar “alguma coisa para comer”. É este anúncio, celebração e compromisso que constitui o cerne do Evangelho, aquele que, nós, aqui no Porto, juramos constituir a nossa “alegria” e “a nossa missão”.
É, também, desta intimidade, verdadeiro paradigma teológico e núcleo embrionário da Igreja, que nasce a obra apostólica, pois os discípulos compreenderam bem “que havia de ser pregado em seu nome o arrependimento e o perdão dos pecados a todas as nações, começando por Jerusalém”. E que isso os implicava, a ponto de serem constituídos “as testemunhas de todas estas coisas”. Para que? A primeira leitura fornece-nos a resposta.
Em todos os tempos e circunstâncias, o homem arrasta consigo a terrível inclinação a contradizer o plano divino. Se “o Deus de Abraão, de Isaac e de Jacob, o Deus de nossos pais, glorificou o seu Servo Jesus”, as autoridades judaicas e os habitantes de Jerusalém exigiram o seu aniquilamento. Mesmo que Pilatos tivesse intuído esta inversão dos valores e estivesse “resolvido a soltá-l’O”. E nós estávamos lá, representados neles. Por isso, também nós negamos o Santo e Justo e pedimos “a libertação de um assassino”.
A obra da salvação tem de ser recuperada e actuada continuamente porque também é incessante esta tentação de preferir o mal ao bem e de optar pelo mundo das atitudes destruidoras, representadas na história pessoal de Barrabás, gerando a morte do Justo. É a apavorante sina da humanidade: rejeitar a verdade da existência, representada n’Aquele que São Pedro define como “o Príncipe da Vida”, e eleger a mentira da insensibilidade perante a morte. Que o digam as vítimas das violências e das guerras. Mas que os digam também os descartados e marginalizados pela civilização da abundância e do desfrute.
Todos reconhecemos os enormes contributos que os múltiplos sectores da sociedade podem dar para esta necessária e urgente sensatez humana, para se obstar à inversão dos pólos: a transmissão dos valores na família, o inestimável contributo da cultura, a força ordenadora da lei justa, o papel organizador da actividade político-administrativa, a prevenção ou repressão atribuídas às Forças Armadas e às Forças de Segurança, etc. Não obstante, esta obra de salvação está confiada primordialmente à Igreja, como guardiã da memória d’Aquele que “por nós homens e para nossa salvação desceu dos Céus”. A comunidade crente actualiza essa salvação agindo, simultaneamente, em dois âmbitos: internamente, na santificação, isto é, no tornar os corações mais sensíveis, mais semelhantes ao de Cristo; externamente, contribuindo para a humanização das organizações e das estruturas, no respeito pela autonomia das realidades terrenas.
Caros diocesanos do Porto, minhas senhoras e meus senhores, esta é a nossa missão. Porventura, mesmo sem o reconhecer, esta é a fermentação evangélica que o nosso mundo anseia. Sim, há muitas linguagens e compete-nos sermos especialistas na sua decifração. E uma das que mais ressoam por aí é o grito da opressão do sem-sentido que tanto fecha a pessoa no seu individualismo narcisista como o conduz ao abandono dos outros. Ser presença de Igreja neste mundo passa, consequentemente, por “comover [os corações] para desconvocar a angústia e aligeirar o medo”, para usar a belíssima expressão de Agustina Bessa Luís.
Para esta acção pastoral de “comover” os corações, conto com todos. Com todos. Conto, sobremaneira, com os jovens. Porque não sei dizer melhor, repito-lhes as palavras do querido Papa Francisco: “O tempo em que vivemos não precisa de jovens-sofá, mas de jovens com sapatos. Melhor: com as sapatilhas calçadas. Este tempo só aceita jogadores titulares em campo, não no banco de suplentes”. Jovens e pessoas de todas as idades.
A nossa equipa diocesana do Porto não terá, portanto, suplentes: nem jovens nem crianças, nem adultos nem idosos, nem ricos nem pobres, nem cultos nem humilhados. Tê-los-á a todos como titulares e em campo. Certamente treinados e capitaneados pelos bispos e padres. Não para gáudio destes, mas para, mais organicamente, obter bons resultados e marcar pontos no actuar da salvação no mundo. Não se retira, portanto, a determinante importância aos pastores, mas eleva-se o timbre de o ser, pois, como escreveu o director de um grande jornal –de facto, a laicidade tem tanto a ensinar-nos!- “o cristianismo é proximidade, o que faz a diferença entre o burocrata e o pastor: um conta o número de ovelhas, o outro procura cuidar delas”. Pensemos nisto, neste dia em que começa, em todo o país, a Semana de Oração pelas Vocações de especial Consagração.
Caros fiéis em Cristo, estamos todos na «barca de Pedro»: ou navegamos ou nos afundamos. Então, o melhor será remarmos em conjunto.
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Senhor Núncio Apostólico, interrogo-me sobre as razões da minha nomeação para tão honroso ministério, como seja este de Bispo do Porto, na tradição, por exemplo, desse eminente e inesquecível D. António Barroso, cujo báculo acompanhou todos os meus antecessores, desde há cem anos e, agora, me sustenta a mim próprio. E não encontro outro motivo que não seja o meu sotaque beirão, mais propriamente da Beira Douro: o Porto já estava habituado a ele desde o senhor D. António Francisco. Pois bem, se o imito na pronúncia, saiba, igualmente, continuá-lo na simplicidade encantadora, na afectividade envolvente e na bondade contagiante. É que, tal como ele, também eu estou convencido que só isso lança pontes da Igreja para o mundo e do mundo para a Igreja. Nesta linha, é com um coração duplamente agradecido que ressalto o gesto das Câmaras Municipais do Porto e de Vila Nova de Gaia de atribuir o nome de D. António Francisco dos Santos à nova ponte, estrutura de aproximação e de encontro: agradeço este tributo à Diocese do Porto que teve este ilustríssimo bispo como seu condutor; e agradeço esta interpelação que me é feita, a mim, pessoalmente, qual seja a necessidade de nunca me esquecer que um bispo é, por natureza e mandato divino, um «pontífice», um construtor de pontes.
Tentá-lo-ei com a ajuda divina que imploro por intermédio da «Rosa mística», a Virgem Santa Maria, venerada como Senhora da Assunção em toda a Diocese e como Senhora da Vandoma nesta nossa cidade episcopal.
“Movidos pelo amor de Deus”, vamos à nossa obra, irmãos.
+ Manuel Linda
Nota biográfica:
Manuel da Silva Rodrigues Linda nasceu na Freguesia de Paus, Resende, a 15 de abril de 1956. Frequentou o Seminário Menor de Resende, o Seminário Maior de Lamego e o Instituto de Ciências Humanas e Teológicas do Porto onde terminou o curso superior de Teologia em 1980. Foi ordenado presbítero a 10 de junho de 1981, para a Diocese de Vila Real.
Ao longo dos anos desempenhou várias funções eclesiásticas: pároco, assistente diocesano da Acção Católica, Promotor de Justiça e Defensor do Vínculo no Tribunal Eclesiástico e responsável pela Pastoral Juvenil. Foi também Capelão (alferes e tenente) do RI13 (Regimento de Infantaria de Vila Real), entre 1982 e 1985). Mas, a principal, foi a de reitor do Seminário de Vila Real, cargo que desempenhou ao longo de 19 anos, e de Vigário Episcopal para a Cultura. Foi, ainda, coordenador diocesano da pastoral e membro dos Conselhos Presbiteral, Pastoral e de Consultores.
Paralelamente à sua actividade eclesiástica, licenciou-se em Humanidades pela Faculdade de Filosofia de Braga da Universidade Católica Portuguesa (1987), em Teologia pela Faculdade de Teologia (Porto) da mesma Universidade (1988), obteve a licenciatura canónica (estudos de segundo grau, equivalente ao Mestrado) em Teologia, pela Pontifícia Universidade Lateranense, em Roma (1991), e o doutoramento em Teologia, especialidade de Teologia Moral, pela Universidad Pontifícia Comillas, em Madrid (1998), com a tese “Andragogia política em D. António Ferreira Gomes“.
Ao longo dos anos foi leccionando em diversas Escolas (Escolas Básicas e Secundárias e na Escola de Enfermagem de Vila Real, nesta ao longo de cerca de três décadas) e, na Universidade Católica Portuguesa, nas Faculdades de Teologia e de Direito e na Escola das Artes. Orientou diversas teses de licenciatura e mestrado e participou em diversos júris académicos. Ocasionalmente, colaborou ainda com outras instituições de ensino superior, mormente com o Instituto Superior Miguel Torga/Escola Superior de Altos Estudos (Coimbra), Universidade do Minho e Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro. Para além da docência, na vida académica desempenhou diversas funções, tais como: director da Extensão de Vila Real da Faculdade de Teologia da UCP; membro da Comissão Pedagógica da FT – Porto; Coordenador do Programa Erasmus/Sócrates; membro do Conselho de Direcção da revista Humanística e Teologia; Membro do Conselho Pedagógico, etc. É membro fundador do Centro de Estudos do Pensamento Português (UCP – Porto). Para além de colaboração diversa em vários órgãos de comunicação social, publicou cerca de quatro dezenas de trabalhos científicos, entre artigos de revistas, obras colectivas, dicionários e enciclopédias, etc.
Foi nomeado bispo auxiliar de Braga, a 27 de junho de 2009 pelo Papa Bento XVI, com o título de Case Mediane, tendo sido ordenado a 20 de setembro desse ano.
A 10 de outubro de 2013, o Papa Francisco nomeou-o Ordinário Militar para Portugal ou Bispo das Forças Armadas e das Forças de Segurança, para suceder a D. Januário Torgal Mendes Ferreira. Canonicamente, tomou posse no dia 24 de Janeiro de 2014, em Fátima, perante os sacerdotes que trabalham no Ordinariato. A 8 de Abril de 2014, foi nomeado Capelão Chefe por despacho conjunto dos Ministros da Defesa Nacional e da Administração Interna.
A nível da Conferência Episcopal Portuguesa, foi membro da Comissão Episcopal da Pastoral Social, para a área da Saúde (de 2000 a 2014) e, a 29 de Abril de 2014, foi eleito Presidente da Comissão Episcopal da Missão e Nova Evangelização e membro da Comissão Episcopal da Pastoral Social e da Mobilidade.
A 15 de março de 2018 foi nomeado pelo Papa Francisco como bispo do Porto. Deu entrada solene nesta diocese a 15 de abril do mesmo ano.