
No passado dia 27 de março, o mundo assistiu ao impensável: o Papa Francisco, o bispo de branco, caminhando pelas ruas da cidade, agora vazias e sombrias, “meio trémulo e de andar vacilante, acabrunhado de dor e de pena”, parecendo caminhar sob peso da dor de toda a humanidade, colocando-se diante da Cruz, em oração. Nunca o Papa esteve, aparentemente, tão só naquela praça. Na verdade, talvez nunca antes tantos estiveram com ele, diante da Cruz, em oração!
Disse-nos naquela tarde sombria: «Desde há semanas que parece o entardecer, parece cair a noite. Densas trevas cobriram as nossas praças, ruas e cidades; apoderaram-se das nossas vidas, enchendo tudo dum silêncio ensurdecedor e um vazio desolador, que paralisa tudo à sua passagem: pressente-se no ar, nota-se nos gestos, dizem-no os olhares. Revemo-nos temerosos e perdidos. À semelhança dos discípulos do Evangelho, fomos surpreendidos por uma tempestade inesperada e furibunda. Demo-nos conta de estar no mesmo barco, todos frágeis e desorientados mas ao mesmo tempo importantes e necessários: todos chamados a remar juntos, todos carecidos de mútuo encorajamento. E, neste barco, estamos todos.»
Sabemos que vivemos tempos de adversidade, de incertezas e de recolhimento nas nossas casas. Recusamo-nos a ceder ao medo e à angústia, sentimo-nos suportados pela fé e pela esperança, assumimos uma atitude de responsabilidade e de defesa da vida de todos e de cada um, sobretudo dos mais frágeis. São tempos que exigem necessidade de reinventarmo-nos de forma criativa e de ter a coragem de fazer de forma diferente mas com a mesma verdade cada ato de amor e de fé.
Mais do que nunca, tal como muitos dos primeiros cristãos, fazemos a experiência da celebração da nossa fé através das nossas pequenas “igrejas domésticas” (família). Não numa dimensão individualista mas de profunda comunhão com todos aqueles que estão longe. Assim aconteceu, no dia 04 de abril, pelas 21h30: os quatro grupos de jovens da comunidade paroquial de S. Martinho de Bougado – Gera’Esperança, Jovens C’a.Fé, Os Mensageiros e o Grupo Coral de Jovens – em comunhão com o seu Pároco, Padre Luciano Lagoa, celebraram a Eucaristia de Domingo de Ramos da Paixão do Senhor, via online. E desta forma, experimentamos uma comunhão intensa destas várias “igrejas domésticas”, voltando a sentirmo-nos verdadeiramente comunidade, unidos pela fé em Jesus Cristo, ressuscitado e mestre deste barco.
Através da aplicação Zoom, contabilizamos 63 dispositivos conectados, representando cerca de 200 pessoas em profunda comunhão entre si. Em tempos de provação, esta comunidade paroquial está viva e dinâmica, animada pela criatividade dos mais jovens que preferem olhar para este momento como tempo de oportunidade e de esperança.
“Meu Deus porque me abandonaste?”, escutamos no salmo. Parece, mais do que nunca, ser o grito de uma humanidade inteira assustada e sofredora. Antes mesmo de nós, é Jesus misericordioso que coloca este grito de angústia nos seus próprios lábios. Ele que sofre antes de nós e por nós a fim de nos ensinar a confiança e a força da fé. Nunca sentimos tão intensamente a Páscoa nos nossos corações, ao vermos nesta pandemia inúmeros exemplos de “Cristos” crucificados e de “Cireneus” concretos em tantos hospitais lutando heroicamente pela vida de cada um. Rezamos por cada um deles. Em Deus, colocamos a certeza de uma nova humanidade renascida pela vitória da vida sobre a morte.
No final desta experiência, foi visível a emoção e alegria que tomou conta dos corações dos jovens e das suas famílias. Sentimo-nos verdadeiramente privilegiados pela oportunidade que Deus nos concedeu. Sentimos as nossas esperanças renovadas. Vamos ficar bem. O Mestre está connosco neste Barco.
(inf: jovens de S. Martinho de Bougado)