Na crise e sempre a comunicação deve ser dirigida por quem sabe

Por Rui Saraiva

Por um exercício profissional da comunicação.

Este período absolutamente inédito que estamos a viver pode gerar em nós incertezas, preocupações e legítimas ansiedades em relação ao futuro. E até mesmo um certo nervosismo poderá vir a aparecer devido à incerteza da vida nos próximos meses. E essa prestação mais nervosa, que nos dificulta a respiração e pode prejudicar o raciocínio, é perigosa, sobretudo, quando exercemos funções de responsabilidade com eventual exposição mediática. Para tal, é essencial garantir que a comunicação não seja apenas uma mera função operacional, mas uma função estratégica da gestão.

Um contributo

A este propósito devo referir o contributo de três profissionais da comunicação que tornaram público na semana passada um pequeno documento, simples e direto, sobre a eficácia da comunicação neste período de crise. O documento conjunto é assinado por José Aguiar da empresa ALL Comunicação, Pedro Gil do Gabinete de Imprensa do Opus Dei e Rita Carvalho do Gabinete de Comunicação da Companhia de Jesus.

Estes três especialistas partem das circunstâncias de contágio do novo coronavírus, Covid-19, assinalando algumas práticas a serem aplicadas na “escola, paróquia, lar de idosos, ATL”. Tentam responder a inquietações: “O que devo comunicar, como e a quem?

Verdade e serenidade

Das dicas apresentadas, gostaria de salientar o verbo pensar. Pensar antes de agir. Pensar em quem precisa da informação e pensar em como enviar a informação. Dizem os três assessores de comunicação que é importante tomar a iniciativa da comunicação e salientam o valor da confiança que só se consegue com verdade e serenidade: “Se a informação que der for verdadeira e serena, é em si que vão confiar” – escrevem os comunicadores.

Reconhecer o erro

Para lidar com a crise do Covid-19 nas organizações, os especialistas, José Aguiar, Pedro Gil e Rita Carvalho, assumem que é fundamental dizer só a verdade como autêntico “investimento” de “fiabilidade”. E sublinham especialmente a imperiosa necessidade de reconhecer o erro. Ou seja, ser capaz de em toda e qualquer circunstância não ter “medo de errar e de reconhecer o erro” – escrevem. Nas tarefas a executar os profissionais referem ainda a necessidade da “proximidade” e da sensibilidade “ao sofrimento das pessoas”.

Evitar o silêncio, não culpar e não desresponsabilizar

Das tarefas a evitar numa situação de crise, como esta que vivemos com o Covid-19, os assessores de comunicação apontam a necessidade de não fazer do silêncio uma atitude, não culpar ninguém e, ao mesmo tempo, não promover uma atitude de desresponsabilização. Segundo eles estas atitudes podem fazer crer que estamos apenas a pensar em ganhos de imagem, não existindo interesse em desenvolver uma atitude de comunicação que se centre na saúde e na tranquilidade das pessoas.

Comunicação é função estratégica

O documento dos três especialistas em comunicação termina com uma curiosa nota final que é absolutamente reveladora da importância da assunção da comunicação nas organizações como uma função concreta da gestão. Escrevem eles: “Mais importante do que reagir é antecipar, definindo procedimentos de comunicação, meios a utilizar e porta-vozes. Antes que chegue a crise” – escrevem os especialistas.

O que eles querem dizer, no fundo, é que, bem mais importante do que ter uma reação ou tomar uma atitude comunicativa, é pensar de maneira organizada e fazer disso um trabalho regular quotidiano. Ou seja, fazer da comunicação um verdadeiro exercício profissional com base numa estratégia que defina meios, procedimentos e protagonistas. Assumir a comunicação como uma função estratégica.

Leigos profissionais na direção da comunicação

Tive a bela experiência na minha vida de estudar e de ensinar comunicação na universidade. Ser aluno e professor permitiu-me perceber que só em equipa se atingem objetivos em comunicação. Foi aí que aprendi que uma crise é uma mudança repentina entre duas situações. Fundamental é estar sempre preparado para as novas situações que se apresentam, com instrumentos que permitam fazer uma leitura correta da realidade.

Assim, a gestão racional de uma crise passa, em primeiro lugar, pela prevenção e por um trabalho que se faz a montante. Por isso, a comunicação deve ser dirigida por quem sabe fazer este trabalho de observação e planeamento. Ou seja, a comunicação deve ser dirigida por profissionais que possam identificar áreas de risco, produzir conteúdos, antecipar cenários, formatar soluções e promover planos de trabalho.

E nos últimos tempos a Igreja, ao mais alto nível, tem entregue a leigos profissionais posições de direção na área da comunicação. No Vaticano neste ano de 2020 as principais instituições de comunicação têm leigos na sua liderança: Paolo Ruffini como Prefeito do Dicastério para a Comunicação, Matteo Bruni, na Sala de Imprensa, Andrea Monda como diretor do L’Osservatore Romano ou Andrea Tornielli como Diretor Editorial do Vatican News. E, recentemente, a própria Conferência Episcopal Italiana tem um porta-voz leigo, Vincenzo Corrado, de seu nome.

Seguindo este rumo creio que seremos capazes de sair da situação de crise que estamos a viver com o Covid-19 e prepararemos o futuro com uma maior e melhor base de informação para sermos credíveis.