Bispo do Porto deu início ao ciclo de Conferências da Quaresma no Santuário do Coração de Maria

No primeiro domingo da Quaresma iniciou-se a 13.ª edição das Conferências da Quaresma no Santuário Coração de Maria, sito em Carvalhos, Pedroso, Vila Nova de Gaia.

Na primeira conferência de 2020 cerca de 400 pessoas acolheram o Bispo da Diocese do Porto, D. Manuel Linda, para ouvir a sua comunicação intitulada “Eu sou a Videira: vós, os ramos”.

A conferência, como habitualmente, iniciou com uma música tocada e cantada pelo grupo constituído pela Fernanda (voz), o Paulo (guitarra) e o Pedro (teclas). Seguiu-se uma breve apresentação do Bispo por José Cruz que agradeceu em nome da comunidade a sua presença no início da caminhada quaresmal.

A letra da canção inicial entoava: “Para dar muito fruto permanecei no meu amor / Sou videira, meu Pai é agricultor, vós sois os ramos…”.

D. Manuel Linda serviu-se desta alegoria da videira e dos ramos para iniciar a sua palestra, começando por explicar o que no seu entender é ser cristão no mundo contemporâneo. Referiu que não é pela bondade, pela diferença nas escolhas sociais (casar, trabalhar, confraternizar) que o cristão se distingue dos demais. Há pessoas com elevados comportamentos éticos, altruístas e bondosos que não são cristãos. Ser cristão é reconhecer explicitamente Jesus Cristo como Salvador. Os cristãos estão ligados a Jesus Cristo como os ramos estão ligados ao tronco da videira. A Pessoa de Jesus Cristo é a seiva que alimenta toda a conduta do cristão e é isso que especialmente o identifica perante os demais.

Segundo o Bispo do Porto, o cristão ao confessar Cristo como Salvador e como Ressuscitado fica predisposto a um “suplemento de alma” na procura da realização do Bem. Deste modo, no princípio da existência do cristão está a fé em Jesus Cristo e só depois vem o comportamento. Dito de outra forma, o específico do cristianismo é o conhecimento da Pessoa e da mensagem de Jesus Cristo. Desse conhecimento brota a necessidade de partilhar a vida em comunidade, em Igreja, pelo que o cristão deve assumir um “dinamismo crente”, ou seja, uma participação ativa na comunidade, recebendo os sacramentos e participando nas atividades da Igreja, de ordem evangélica, socio-caritativa e pastoral.

Feita esta definição da identidade do cristão, D. Manuel Linda elencou alguns desafios que se colocam aos cristãos neste início do terceiro milénio. Em primeiro lugar falou sobre o desafio da “diáspora”, ou seja, equacionar o que fazer perante uma Igreja que na Europa vê tantos fiéis saírem. Salientou em especial a dificuldade de transmitir a fé às novas gerações. Advertiu que será de repudiar o desânimo perante estas situações, mas devem ser encaradas como oportunidades. Frisou que nunca tivemos tanta gente comprometida no mundo laical e a Igreja contrariamente às previsões dos positivistas e racionalistas do século XIX não desapareceu, mas “está viva e recomenda-se”. De facto, a Igreja está a regressar a uma fé mais próxima do Evangelho, chegando ao fim um cristianismo tradicional. Deste modo, o cristianismo do futuro será constituído por pessoas mais místicas, pessoas de oração, com mais radicalidade evangélica. Será uma Igreja que não se fecha, uma “comunidade de contraste”, em que os cristãos serão identificados pela forma de ser e estar.

O segundo desafio indicado por D. Manuel Linda foi o da “ministerialidade”. Ou seja, todos são chamados a ter um lugar e um trabalho dentro da Igreja. Um fiel desocupado estará em perigo de resvalar para fora da Igreja. Esta forma organizacional não retira, mas complementa, as funções da hierarquia da Igreja.

Um terceiro desafio dá-se ao nível do exercício da autoridade eclesial. A hierarquia piramidal não é o que a constitui. É preciso uma corresponsabilidade. A Igreja deve escutar a opinião dos que se lhe dirigem, pois sem opinião pública perde a sua vida.

O quarto e último desafio elencado pelo palestrante foi o da “transformação cultural da História”. O cristianismo tem algo a mudar no mundo senão está a mais. O cristão não pode aceitar uma “economia que mata”, como afirmou o Papa Francisco. Uma tarefa que se impõe aos cristãos é intervir na equação justiça / liberdade, para aumentar a justiça social e a responsabilidade no exercício das liberdades. Não menos importante é o ideal da fraternidade, em que os cristãos devem tomar a dianteira na sua instituição social. Fundamental é também lutar contra os “absolutos de substituição”, isto é, deixar de adorar como divindade o dinheiro ou o estatuto social. Torna-se também imprescindível intervir na equação pessoa / sociedade, ou seja, lutar contra o individualismo. É preciso que as pessoas assumam que são parte de comunidades. Sem integração social não haverá responsabilidade.

D. Manuel Linda concluiu afirmando que o cristão é a pessoa da fé, esperança e caridade. Assente neste “tripé virtuoso” edificará um mundo melhor e não deixará de ter no olhar uma outra pátria, o Reino de Deus.

Finda a comunicação, seguiu-se uma canção entoando que “somos vinha do Senhor, como dádiva divina…”

O Padre Marçal, reitor do Santuário e dinamizador da iniciativa, encerrou a conferência agradecendo ao Bispo a sua disponibilidade e a todos os que contribuíram para a mesma. Manifestou reconhecimento por num dia tão tempestuoso tanta gente se ter deslocado ao Santuário.

(inf: José Manuel Cruz)