Ângelo Alves, homenagem a uma figura da Igreja Portucalense

A Faculdade de Teologia (Núcleo do Porto) vai recordar a personalidade e a obra de Ângelo                                      Alves, através do Colóquio “Ângelo Alves: Obra e Pensamento”, a realizar na segunda feira, 2 de março, nas instalações da Universidade Católica no Porto (Foz do Douro). O encontro decorre das 9h às 18h, na sala EC 105 do edifício da Universidade.

Por M. Correia Fernandes 

Segundo a apresentação do Colóquio, “O Prof. Ângelo Alves (1930-2017) teve um papel relevante e pioneiro no diálogo da Teologia com o pensamento português e na institucionalização dessa linha de estudo no Centro de Estudos do Pensamento Português, da Universidade Católica Portuguesa, no Porto. É por isso que um grupo de continuadores e admiradores, da Faculdade de Teologia e de outras instituições científicas que se associam,  promove uma evocação da obra e do seu pensamento, como forma de gratidão e de balanço sobre um trabalho científico cuja atualidade se mantém viva. Na mesma altura,  será evocada a memória de Dalila Pereira da Costa, no aniversário do seu falecimento.

Este seminário é promovido em parceria com o Instituto de Filosofia Luso-Brasileira, a Faculdade de Letras da Universidade do Porto e o Instituto de Filosofia da Universidade do Porto.
O programa, inicia-se com palavras de apresentação da Presidente do Centro Regional do Porto da Universidade Católica, Isabel Braga da Cruz, e do Diretor da Faculdade de Teologia (Porto), Abel Canavarro. São propostas as seguintes comunicações: às 10h, com coordenação de Jorge Cunha, “Ângelo Alves e o Centro de Estudos do Pensamento Português”, por Arnaldo de Pinho; “O Ponto de partida da Ontologia de Ângelo Alves”, por José Acácio Castro; “Sentido da Proposta Ontológica de Ângelo Alves” por António Braz Teixeira. Às11h45, com coordenação de José Acácio Castro, “O Sistema Filosófico de Leonardo Coimbra à luz do pensamento e obra de Ângelo Alves: Do “Idealismo Criacionista” Ao “Ideorealismo” Aristotélico-Tomista», por Afonso Rocha; Ângelo Alves e o Argumento Ontológico”, por Manuela Brito Martins; “Ângelo Alves e o problema do Ateísmo”, por Samuel Dimas. Às 14h30, com coordenação de José Pedro Angélico: “Ângelo Alves, Hermeneuta de Leonardo Coimbra” por Manuel Cândido Pimentel; “O Idealismo Gnóstico do Pensamento Português na leitura de Ângelo Alves” por Paulo Samuel; “Diálogo com Ângelo Alves, a propósito da obra «A corrente idealístico-gnóstica do Pensamento Português Contemporâneo»”, por Renato Epifânio. Às 16h15, com coordenação de Maria Celeste Natário: “Saudade, Deus e os parentes de Dom Quixote: Ângelo Alves e a metafísica da Saudade de Pascoaes”, por José Pedro Angélico; “Contemplação e acção: «As maravilhas de Deus na vida e apostolado de Sílvia Cardoso», de Ângelo Alves”, por José Almeida; “Ontologia e Teologia no pensamento de Ângelo Alves” por Jorge Teixeira da Cunha.

Às 17h45, faz-se a apresentação de “Dalila Pereira da Costa: Obra e Pensamento”.​​​​​​

Uma lembrança de Ângelo Alves

A notícia desta homenagem refere apenas o nome Ângelo Alves. Importa porém recordar que ele foi sacerdote da Diocese do Porto, professor do seu Seminário Maior, professor do Instituto de Teologia que deu origem à Faculdade de Teologia, professor desta Faculdade de Teologia, membro da Cabido da Catedral, a quem foi também atribuído o título de Monsenhor. Foi ainda reitor da igreja da Lapa, presidente da Comissão Diocesana de Liturgia e Música Sacra e vigário judicial da Diocese.

Seja-me permitida uma referência de cunho pessoal e revivalista.

Ângelo Alves foi prefeito e professor do Seminário Maior na minha geração e seguintes. Ficou-nos sempre a ideia de um homem formal, algo distante e com sentido disciplinador, mas longe de ser rígido. Lembro as suas aulas de Filosofia, em que seguia o tratado de Metafísica de Paolo Dezza (1901-1999) (1), então apenas um sacerdote jesuíta, professor da Universidade Gregoriana e que depois foi Superior Geral dos Jesuítas e Cardeal (1991). Era a filosofia escolástica em estilo puro, na tradição aristotélica e tomista como era usual. Levantava e discutia os problemas com frequente olhar perdido e meditativo.

Era natural de Paços de Ferreira e por isso se deixou seduzir pela figura de Sílvia Cardoso (1882-1950), que ainda chegou a conhecer e cuja personalidade e obra estudou e divulgou. Pode dizer-se que muito do entusiasmo que ela foi gerando na Igreja portuguesa teve aqui um dos seus pontos de apoio, na sua ação como vice-postulador da sua Causa de Canonização. Teve ainda em vida o gosto de conhecer a sua declaração como venerável, em 2013.

Outro foco da sua atenção foi a obra de Leonardo Coimbra, ao qual dedicou uma primeira obra, publicada em 1962, “O sistema filosófico de Leonardo Coimbra” (1962), publicado pela Livraria Tavares Martins, que constituiu a sua tese de doutoramento; depois dedicou-lhe a obra “Leonardo Coimbra 1883-1936”, a “biografia mais completa do filósofo do Criacionismo”, no dizer do editor. É ainda autor de “Leonardo Coimbra. Filósofo da Liberdade e do Amor infinito” (2003); “Prolegómenos a uma Ontologia Pluridimensional: Dialéctica, Ascensional, plenificante” (2005); “Leonardo Coimbra, Filósofo, Orador e Político” (2007). É autor ainda de vários artigos para a revista “Humanistica e Teologia”.

Uma das facetas mais notáveis de Ângelo Alves era a sua curiosidade intelectual que, mesmo depois da sua jubilação, dedicava ao pensamento social e aos fenómenos do conhecimento mediaticamente difundido. Vários artigos seus foram publicados na Voz Portucalense. Entrava na redação da Rua de Santa Catarina e dizia: Tenho estado a pensar nas linhas de pensamento que encontramos em escritos atuais e que manifestam uma espécie de ateísmo a que querem dar ares de científico e que valia a pena analisar. Vários artigos assim foram publicados, e em diálogo surgiu a ideia de valer a pena publicá-los em volume. A direção de Fundação entendeu que sim, e desta forma nasceu o volume O Ateísmo Científico Emergente, Evolução Natural ou Criação Divina?”, surgido em 2008, em edição da Fundação Voz Portucalense, com um prefácio de Manuel Clemente, então Bispo do Porto. Neste trabalho, procura dar resposta a questões levantadas pelo então badalado livro “A Desilusão de Deus”, da Richard Dawkins seguindo argumentos elaborados na esteira dos trabalhos do anglicano Alister Mcgrath, “O Deus de Dawkins”.

Esta homenagem pessoal que aqui lhe prestamos é também uma homenagem da Voz Portucalense, que pensamos traduzir igualmente a da Diocese do Porto, à qual sempre dedicou o melhor do saber, do pensamento e dedicação sacerdotal. A sua morte inesperada merece uma referência saudosa. Mas a sua presença edificadora deve continuar a ser motivo de inspiração: para a ação pedagógica e pastoral, para o pensamento cristão e amor ao mais fundo da cultura da pessoa.

A Metaphysica generalis ad usum auditorum (matafísica geral para uso dos estudantes) foi publicada pela Universidade Gregoriana em 1948. Lembro que o falecimento de Paolo Dezza foi noticiado na edição de VP de 18 de janeiro de 2000, com título “Um filósofo-cardeal”. No número anterior se lembrava o centenário das morte de Eça de Queiroz.