Editorial: O lento crescer da moral

Lawrence Kohlberg foi o mais conhecido estudioso do desenvolvimento moral no século XX. Segundo os seus estudos, os seres humanos crescem moralmente até se orientarem pelo critério da norma universal, deixando de lado o próprio interesse, o critério da força, a apropriação do alheio, a mentira e assim por diante. Mas parece que ele próprio se desiludiu com a sua teoria e pôs um fim trágico à sua vida pois, na realidade, os seres humanos não crescem até ao nível de perfeição moral que tinha antevisto, ou muito raramente isso acontece.

Vem isto a propósito de alguns acontecimentos recentes. O presidente de um país democrático e respectivas instituições praticam pela força a eliminação física de um adversário, militares atingem um avião civil cujos ocupantes morrem em número elevado, dois jovens são mortos em Portugal em circunstâncias que mostram um respeito mínimo pela vida do outro. Por isso, podemos perguntar se a escolarização leva ao crescimento moral, se o desenvolvimento tecnológico leva a mais e melhor democracia, se a laicidade leva a mais imparcialidade.

Há sinais de um crescimento do teor moral da nossa cultura. Podemos ver que as nossas sociedades são mais seguras, pois a probabilidade de não ser morto violentamente é mais elevada do que no passado. Há uma maior sensibilidade para o respeito pela dignidade de todos e para levar à justiça crimes mesmo contra os pobres. Há um escrutínio das acções dos governantes que, cada vez mais, são eleitos democraticamente. Conseguiu-se uma maior tolerância para formas de vida pacíficas que no passado eram sancionadas de forma arbitrária.

Mas, temos de admitir que estes sinais positivos estão de longe de ser satisfatórios quanto a uma efectiva interiorização da norma moral, dessa tal auto-regulação de todos os indivíduos, para lá da força externa e da luta de todos contra todos para ver que manda mais e quem se apropria de mais bens.

É doloroso ter de reconhecer que mesmo as Igrejas, que são sinais da promessa divina de “um coração novo” e de um “mandamento novo” estão longe de ser exemplos históricos de uma moral de nível elevado. Mas a fé a que Jesus nos iniciou não dispensa ninguém do esforço pessoal contínuo por crescer moralmente e de o testemunhar com valentia, num mundo convulso como é o nosso, cheio de grandezas e misérias. Os crentes têm uma grande responsabilidade de estar na linha da frente do testemunho moral. Por isso, lhes compete denunciar continuamente formas de acção baseadas no realismo político que ordena execuções de adversários como forma de prevalecer e de ganhar popularidade, que pratica a morte de inocentes como forma de vingança, que tolera passivamente formas de opressão dos pobres e de exploração desenfreada de recursos que são de todos e que pertencem solidariamente a toda a humanidade.

O desenvolvimento moral é uma variável independente de factores como a escolarização e o bem-estar resultante da tecnologia. Os grandes modelos de vida e as grandes propostas morais que nos chegaram do passado existiram sem desenvolvimento científico e tecnológico. Por isso, é necessário mostrar à nossa cultura positivista que a educação moral não é uma resultado automático do desenvolvimento das condições materiais de vida.