A celebração do batismo de crianças

O Ordo Baptismi Parvulorum – em português «Celebração do Baptismo das Crianças» [citamos com a sigla: BC ]– repre­senta uma novidade absoluta na história do Rito Romano.

Por Secretariado Diocesano da Liturgia

Com efeito, embora a prática mais corrente na Igreja Católica fosse a de batizar «quanto antes» as crianças, nunca essa praxe pastoral se traduzira na elaboração de um ritual apro­priado às circunstâncias e condicionalismos parti­culares de tais sujeitos. E o ritual consagrado pela reforma tridentina mais não era do que a abreviação e concentração numa única celebração dos ritos do Batismo de adultos elaborados nos tempos em que vigorava a insti­tui­ção catecumenal. Quer na linguagem das orações, inter­pela­ções e exorcismos, quer no diálogo que frequen­temente se «fingia» entabular com as crianças, era evi­dente a falta de correspondência com a realidade. Atenta a esta falta de verdade e inadaptação pastoral, a Constituição Conciliar Sacrosanctum Concilium está na origem desta novidade de um «Ordo» do Batismo adaptado à real situação das crianças e em que se dá uma maior atenção ao lugar e aos deveres dos pais e dos padrinhos (SC 67-68).

Publicado em 1ª edição típica em 15 de maio de 1969, este volume do Ritual Romano conheceu a sua primeira edição portuguesa em 1970. Atualmente está em uso a «segunda edição típica» em português, publicada em 1993. É, há 40 anos, um instrumento precioso da pastoral litúrgica. Porém, com toda a honestidade temos de reconhecer que a sua interpretação celebrativa foi filtrada quer pela inércia da prática anterior, quer por exemplos de celebra­ções em situações peculiares elevados indevidamente ao estatuto de mode­los de referência, quer por uma mentalidade racionalista e funcionalista que reduz a fé à dou­tri­na e não valo­riza devidamente todos os elementos da celebração litúrgica. Apesar de muito usado, o Ritual do Batismo das Crian­ças é insuficientemente conhecido. Julgamos, por isso, opor­tuno regressar às propostas e perspetivas deste novo e peculiar livro litúrgico que certamente é uma obra imperfeita e limitada, mas que está longe de se ter esgotado na aplicação que entre nós recebeu.

Um primeiro e decisivo elemento de interpretação parte da constatação de que, no atual orde­­namento litúrgico e canónico, este não é o único Ritual do Batismo em vigor na Igreja de Rito Romano. De facto, obedecendo também às determinações conciliares (Cf. SC 64-66), a reforma litúrgica ofe­receu à Igreja um Ritual para a Iniciação Cristã dos Adultos (1ª ed. típica latina, de 1972; tradução portuguesa em 1979). Obviamente, este volume do Ritual inclui a cele­bração do Batismo. E trata-se, precisamente, da sua celebração paradigmática. Tal como a Eucaristia presidida pelo Bispo rodeado do seu presbitério, dos ministros e do povo é o modelo normal a partir do qual se hão-de entender todas as outras celebrações da Missa, assim também a Iniciação cristã dos adultos, com todas as suas etapas e degraus escalonadas no tempo, é o tipo a partir do qual se hão-de enten­­der todos os outros modos de se «fazer um cristão» e de se edificar a Igreja. É bom notar que, apesar de o ICA ter saído a lume depois do BC, contudo foi elaborado pela respetiva sub­comissão antes dele… Tanto num caso como no outro, o habitual e o paradigmático não coincidem.

Não é, pois, por acaso que o BC, na sua mais recente edição, abre com os «Preliminares gerais» sobre a Iniciação cristã e só depois apresenta os preliminares específicos. Subjacente a esse facto está todo um programa teológico e pasto­ral com múltiplos reflexos. Dele depende, nomeadamente, o relevo e o primado dado à cele­bra­ção comu­ni­tária, a revalorização da preparação para o Batismo, o sublinhar da dimensão pascal da cele­bração e a integração do Batismo das crianças num itinerário aberto de iniciação que com­pro­mete as famílias dos neófitos e toda a comunidade local na formação ulterior da perso­nalidade cristã daqueles que são batizados na fé da Igreja.